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Temas que estão a regressar ao debate público. Felizmente. Este artigo de Luís Nazaré e este de João Pinto e Castro, publicados no Jornal de Negócios, abordam alguns problemas centrais nesta área. Há algum tempo que trabalhamos sobre isto (no plural porque se trata de projecto colectivo): economia social e moral. O Elgar Companion to Social Economics, acabado de sair, conta com um artigo escrito por mim, em co-autoria com Luís Francisco Carvalho. Em português intitular-se-ia Onde pára o mercado? Para compreender os discursos e as práticas de mercadorização. No quadro da chamada economia social, é um esforço para perceber como certos desenvolvimentos da teoria económica inspiraram discursos e práticas de promoção da extensão do mercado ou de processos de «mimetismo mercantil» a esferas que não lhe estavam até há pouco subordinadas. Imperialismo económico, performatividade e outros temas. Procura também oferecer uma grelha capaz de escrutinar os efeitos mais corrosivos de uma teoria e de uma prática que começam agora a ser postas em causa um pouco por todo o lado. José Maria Castro Caldas, em co-autoria com Helena Lopes, faz o mesmo para as teorias da empresa. Dado o escandaloso preço desta obra colectiva, habitual neste tipo de livros, resta-me apelar às bibliotecas nacionais de ciências sociais. Não temos comissão…
4 comentários:
Por falar em economia moral:
Berlin calls for Swiss to be on tax blacklist
Sempre? Porque e' que a economia ha' de ser sempre carne ou peixe? Nao pode a economia ser gelida tecnocracia? Nao pode a economia ser romantico moralismo? Porque e' que tem ser so' um dos dois?
Consigo perceber perfeitamente as afinidades entre o conservadorismo moral e o capitalismo (neo-liberal). Ambos acham desejável uma sociedade estratificada, onde alguns mandam e outros obedecem. Daí ambos serem alvos da Esquerda, e por isso se tornaram aliados ao longo do processo histórico. Basicamente, a Igreja, no sentido lato, sempre gostou da protecção do poder temporal, e este viu no poder da Igreja uma preciosa ajuda na submissão da maioria explorada. Quem dizia que a religião é o ópio do povo?...
No entanto, na aliança entre Igreja e Capitalismo houve sempre uma tensão subjacente. Tal deriva de, pelo menos, dois factores: a clara discrepância entre parte da mensagem central de todas as religiões, nomeadamente a igualdade intrínseca a todos os seres humanos e a denúncia da ambição desmedida e da usura; o facto do Capitalismo promover quer a substituição da relação de dependência necessária à religião organizada por uma relação de dependência do consumo, quer a uniformização social e cultural como meio de criar mercados cada vez mais maiores e portanto lucrativos. Ou seja, o Capitalismo destroí a noção de comunidade (central no apelo da religião organizada) e substitui o ópio da religião pelo ópio do consumo. Já Marx tinha identificado como uma das características do Capitalismo a mudança constante que impõe às sociedades onde impera. Parece-me ser assim completamente incoerente querer o crescimento, ou até a simples manutenção, duma ética colectiva que promova o bem-comum (em particular de origem religiosa), defendendo ao meso tempo uma sociedade onde o Capitalismo exige a maximização do consumo individual, exige que nada se intreponha entre o desejo de consumir e a sua concretização.
A propósito do tema, aqui fica o link
para o webcast de um debate realizado na Universidade de Columbia em torno do tema "Podemos salvar a economia mundial?". Os oradores convidados foram George Soros, Nouriel Roubini e Jeffrey Sachs.
O webcast é algo comprido (cerca de uma hora com as intervenções dos oradores e os restantes 44 minutos de debate propriamente dito) mas vale a pena. Gostei em particular da intervenção do Jeffrey Sachs que aborda pontos que são tocados pelo João Rodrigues nesta entrada e que recomendo vivamente. Apenas algumas ideias que me ficaram na memória:
- estamos perante a explosão de enormes "bolhas intelectuais" em diversos domínios, após um período de predomínio de uma "irrealidade profunda" - a crença de que tudo está bem, que "nada precisamos fazer que não tornarmo-nos ricos"; esta crença é agora abalada pela percepção de que os contextos socio-económicos, tal como na esfera bio/geofísica, estão sujeitos a "não linearidades abruptas" - o que exige uma coordenação global extensiva a vários domínios (e que obriga, por exemplo, a que os EUA reequacionem a sua posição no mundo);
- há uma discrepância entre o que vemos à superfície e os mecanismos que lhe são subjacentes, o que choca com a forma como (desde os anos oitenta), na economia e na política "mainstream", se ensina as pessoas a pensar; as pessoas não são ensinadas a serem cépticas de forma a terem o discernimento para distinguirem a superfície da realidade.
Vale mesmo a pena ouvir...
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