Opor regulação a desregulação, como se fosse aí que passa a fronteira entre esquerda e direita é uma mistificação. O mercado desregulado (financeiro ou outro) que a Terceira Via usa para descrever o neoliberalismo e dele se demarcar, nunca existiu e se existisse teria propriedades que nem sequer somos capazes de imaginar.
Permitam-me uma metáfora rodoviária para chegar ao ponto mais depressa. Nas estradas da minha terra a GNR regula sempre o trânsito. Sem essa regulação o trânsito seria muito diferente do que na realidade é. Quando acontece passar por lá um rali automóvel garante a passagem aos aceleras e impede a minha passagem. Isso não é uma estrada desregulada.
Os mercados são evidentemente regulados e os financeiros em maior detalhe ainda. A questão é que a regulação dos mercados financeiros que foi sendo instituída (com o consentimento mais ou menos entusiástico da Terceira Via) nos últimos 30 anos deu prioridade à liberdade de movimentos dos capitais e à ‘criatividade’ dos engenheiros loucos da finança. Deu prioridade aos aceleras, acalmando os outros – depositantes, pequenos accionistas, detentores de PPRs – com garantias que agora sabemos ser enganadoras.
Para se demarcar e se colocar no centro onde supostamente se situa a virtude a Terceira Via tem de inventar um extremo. A esse extremo chama-lhe mercado desregulado. Nunca existiu! O que importa é discutir as regras em concreto. Aí raramente vimos nestes 30 anos a Terceira Via a divergir das regras que dão prioridade aos aceleras.
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1 comentário:
Desregulação ou uma regulação diferente é afinal uma questão semântica. É claro que continuam a existir regras, mas também existem menos mecanismos de controlo por parte de quem deve fiscalizar, nesse sentido há menos regulação. Voltando à metáfora rodoviária, a GNR não só fecha as estradas para deixar passar os aceleras como não os pode multar, ou seja a própria GNR deixa de ter mecanismos para poder regular. Os ralis têm regras, mas são os próprios organizadores dos ralis que estabelecem e fiscalizam essas regras, e não uma entidade externa. Não será isto menos regulação? É uma questão semântica.
Seja como for é preciso regular, e é preciso instrumentos para por a regulação em prática. E é preciso, sobretudo, controlar os aceleras.
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