domingo, 15 de abril de 2012

Anatomia de Gray

Francisco Assis mobilizou o filósofo John Gray para defender a aprovação do Tratado de Merkozy no seu artigo do Público da passada quinta-feira. Gray é um dos críticos das visões redentoras da história e de todas as utopias em nome de um realismo que vê a política como a arte de evitar o pior. De ideólogo de Thatcher e de original apologista de Hayek, Gray tornou-se num dos mais denodados críticos das utopias neoliberais do mercado global, num movimento intelectual em contracorrente. Acho curioso que Assis se sirva dele para os seus propósitos, ainda para mais tendo em conta que Gray é um critico da moeda única e dos esforços austeritários “sobre-humanos”.

Diria então que é mais plausível defender que este Tratado exprime bem tudo aquilo que filósofos como Gray criticam: a ideia de que é possível domar as forças da crise através de uniformizações legais inflexíveis, impostas de cima e sem consideração pelas especificidades de desenvolvimento nacional, que impedem os governos de agir pragmaticamente em função de circunstâncias socioeconómicas inesperadas, ainda para mais tendo em conta que o défice orçamental é uma variável endógena; a forma irresponsável como se está a tentar demolir arranjos sociais que provaram ser outros tantos diques contra as torrentes devastadoras das crises capitalistas; a ilusão sempre presente, que esquece a história, segundo a qual a construção europeia é um processo destinado a progredir por etapas rumo ao federalismo e a confiança associada na capacidade de decisão de elites liberais iluminadas, ao arrepio de hábitos e tradições enraizadas, ao arrepio da soberania democrática.

Trata-se então de um tratado que confirma, uma vez mais, que este euro e esta União se transformaram num Cavalo de Tróia dos mercados globais, tal como padrão-ouro nos anos trinta. Estas utopias acabam sempre mal.

1 comentário:

Anónimo disse...

«Merkozy no seu artigo do Público».
Suponho que o artigo é de Francisco Assis e não de Merkozy.
Ass.:Corrector Amigo
(Isto não é um comentário para comentar, é apenas uma proposta de correcção).