quarta-feira, 14 de janeiro de 2009
Da sustentabilidade da Segurança Social
António Dornelas, do Canhoto, não percebe a contestação à introdução do factor de sustentabilidade da segurança social. Através deste factor, o aumento da esperança média de vida resulta numa diminuição da reforma ou em mais tempo de trabalho. Ninguém se opõe a medidas que preservem o carácter público e universal da segurança social, mas é exactamente esse carácter que está a ser posto em causa com este factor. À medida que as reformas se vão - lentamente, reconheço - desvalorizando, tanto maior é o incentivo ao recurso a fundos de capitalização privados que sirvam de complemento. Uma privatização de facto da segurança social. Estes complementos, de duvidosa sustentabilidade, não são para quem quer, mas sim para quem pode.
António Dornelas não vê alternativas a este processo, mas elas existem. Contudo, antes de aí chegar, é necessária uma nota central a esta discussão. Quando se fala de insustentabilidade da segurança social, não se pode só invocar o benigno aumento da esperança média de vida. Há que introduzir as baixas taxas de fecundidade nacionais para explicar o progressivo envelhecimento da população. Ora, é aqui que entram as políticas públicas. Podemos aprender com países como a França, ou estados como o Québec, como fazer. Por outro lado, na discussão pública raramente se invoca uma das variáveis mais importantes nas projecções feitas: o crescimento económico. Sem taxas de crescimento económico robustas, não existe sustentabilidade de longo prazo possível para qualquer modelo de segurança social. Pode parecer ligeiro querer discutir crescimento económico em tempos de crise profunda, mas neste domínio a última década foi perdida pelos sucessivos governos. Devem, por isso, ser responsabilizados por todos nós.
Mas vamos então às alternativas. A primeira é o chamado modelo Meidner, que deve a sua designação ao nome de um economista social-democrata sueco e que é explicada nesta posta, recorrentemente "linkada" por nós. Como a social-democracia sueca dos anos oitenta deve ser demasiado radical para António Dornelas, como segunda alternativa podemos discutir as contribuições patronais por ele invocadas. Se o Governo fiscalizasse de facto a vergonhosa situação dos falsos recibos verdes que, um pouco por todo lado, são cada vez mais a norma do que a regra (ver aqui para bons relatos), as contribuições para a segurança social disparariam. Embandeirar com os vergonhosos 5% agora introduzidos, em vez dos normais 22%, é ridículo. Finalmente, o recurso ao orçamento de estado não me chocaria. Se tivermos em conta que o governo continua a subsidiar os fundos de pensões através de benefícios fiscais de que só alguns efectivamente beneficiam, porque não acabar com esses benefícios e aplicar a receita ganha? A sustentabilidade da Segurança Social como sistema público, universal, deve ser o resultado de uma ampla discussão, que não enjeite a criatividade nas formas de a preservar. Encolher os ombros perante a desvalorização das pensões não ajuda.
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2 comentários:
Além disso mesmo considerando exclusivamente a questão demográfica, estariamos perante o ajustamento temporário que não devia colocar em causa o sistema. A lei da vida dita que os mais velhos acabem por desaparecer, sendo por isso expectável o reequilíbrio das faixa etárias. Ou não?
Por outro lado, talvez não seja de desprezar o facto de que talvez estejamos perante a primeira geração que não vai viver mais tempo que os seus pais, com o estilo de vida que a malta leva... é ver os cancros a disparar e tudo o que tem que ver com stress e má alimentação...
sem discordar do geral, duas pequenas notas:
1- se a esperança média de vida subir para, por exemplo, 200 anos, não me parece razoável que as pessoas apenas trabalhem até aos 65 (seja de um ponto de vista económico, social, ou psicológico do próprio indivíduo). podemos sempre encontrar uma fórmula que satisfaça os diferentes critérios de forma razoável, exprimindo tempo de vida laboral em precentagem da esperança média de vida.
2- disparar a natalidade pode resolver alguns problemas mas cria muitos outros, talvez muito mais fundamentais, no que diz respeito à sustentabilidade da vida na Terra... problemas energéticos, alimentares, ou de espaço são alguns reparos óbvios...
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