As previsões sobre riscos globais do Fórum Económico Mundial são sempre uma “lufada de ar fresco” para as nossas mentes desatentas. Ao relatório de 2009, apresentado na semana passada, acresce a pretensão de estabelecer as orientações para sarar as feridas provocadas pelo ‘desastre’ de 2008. Aos líderes mundiais é recomendada prudência: numa altura como estas, a precipitação poderá converter-se no maior risco que o mundo pode enfrentar em 2009. Na leitura que propõem sobre os riscos globais, sugerem que seja dado um passo atrás e, simultaneamente, se olhe para o longo prazo, agarrando as oportunidades e aprendendo as lições resultantes dos erros cometidos nos últimos anos. É esse o mote para Davos, aprender com os erros!
Pede-se, carinhosamente, aos líderes mundiais: deixem que 2009 seja o ano em que o mundo encontra uma agenda comum que permita começar a mitigar os impactos dos riscos globais acumulados. Mas qual é verdadeiramente a novidade trazida pelo relatório Global Risks 2009? Na “paisagem de riscos globais” anunciados para o ano que agora entrou destacam a deterioração/derrapagem das contas públicas (sobretudo nos países do G8), o risco de agravamento da queda do mercado de acções, as ameaças para a saúde resultantes das alterações climáticas, o aumento do desemprego, a queda dos níveis de confiança dos consumidores e das empresas, o desinvestimento em infraestruturas essenciais, a falta de liquidez financeira, entre muitos outros. Das previsões parece não vir muito suplemento de novidade. Passemos aos problemas que lhes estão associados: continuação do colapso do mercado de acções, crédito mal parado, ameaças à produção alimentar, deflação, ameaças sobre o clima do planeta, ameaças sobre os recursos naturais, escassez da água, mais tensões entre os países, entre outros. Também não parece ser por aqui. Será, então, nas respostas? O Fórum Económico Mundial propõe que se redefinam as instituições multilaterais para adaptá-las ao mundo actual e deixam, a título de aviso, muitos cuidados – cuidado com as decisões, cuidado com as vistas curtas, cuidado com o excesso de intervencionismo estatal, cuidado com a forma de regulação adoptada para que esta não enfraqueça os mercados, cuidados com as escolhas de empresas a salvar para que não se premeie a má gestão e se prejudique a concorrência. Aqui parece já haver alguma novidade. A novidade de quem pede que tudo mude para que tudo fique na mesma. O exercício de aprendizagem com os erros cometidos em mais não se traduz, afinal, do que na criação de instrumentos ou na redefinição dos existentes para que o mercado continue a funcionar na sua melhor forma. A maior novidade vem, enfim, da falta de novidade.
Mas há, de facto, outras novidades, e essas passam pela inclusão de “novos riscos” no Barómetro dos riscos globais. O Fórum Económico Mundial tem identificado todos os anos os riscos globais, dividindo-os em cinco grandes categorias: riscos económicos, riscos geopolíticos, riscos ambientais, riscos sociais e riscos tecnológicos. A turbulência de 2008, se outro efeito não teve, fez com que o Fórum Económico Mundial reconhecesse a existência da “novidade” nos tipos de riscos que devem ser avaliados anualmente. Nos riscos económicos foram incluídos como novos riscos o custo da regulação e o risco de sub-investimento em infraestruturas; nos riscos geopolíticos foi incluído o risco de falhas na governação global; aos riscos ambientais acrescentaram-se os riscos de inundações costeiras, de poluição atmosférica e de perda de biodiversidade; nos riscos sociais acrescentou-se o risco de migração (!); e, finalmente, aos riscos tecnológicos juntou-se o risco de perda ou fraude de dados. A ‘novidade’ destes riscos dispensa comentários. Agradecemos o aviso.
Agora que eles já sabem, o que podemos esperar de Davos 2009 senão uma vontade incontornável de cumprir (ou mesmo ratificar) protocolos e convenções internacionais sobre direitos humanos, desenvolvimento sustentável ou saúde, como, por exemplo, o Protocolo de Quioto? Agora que eles já sabem, não é legítimo que esperemos respostas fortes que não coloquem sistematicamente as ‘urgências’ económicas à frente de prioridades estratégicas no domínio do desenvolvimento sustentável? Agora que eles já sabem, talvez consigam, finalmente, fazer a distinção entre crescimento e desenvolvimento, perceber que os “riscos globais” têm impactos locais muito desiguais, que o sistema capitalista neoliberal gera modelos de produção injustos e insustentáveis, que o papel regulador dos Estados e que as instituições públicas contam sempre e não apenas na aflição.
É pena que ainda não saibam o quão exíguas são as fronteiras do ‘mundo de partida’ e do ‘mundo de chegada’ patente neste diagnóstico.
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3 comentários:
Excelente análise. Permita-me sugerir que ela sej filtrada pelo catalisador global em que se converteu a tomada de posse de Obama: http://ovalordasideias.blogspot.com/2009/01/livro-sobre-presidncia-de-obama.html
Carlos Santos
Não, eles não sabem. Nem sonham.
É espantoso e mete nojo como é que aqueles srs, apesar de todas as desgraças, permanecem com a treta de que "é preciso que tudo mude para que fique tudo na mesma."
Não há dúvida de que tal gente não se enxerga.
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