As recentes eleições legislativas trouxeram várias novidades à política portuguesa, eventualmente até inaugurando uma mudança do ciclo iniciado em 1987. A eleição de 1987 foi um ponto de viragem na democracia portuguesa. Após anos de instabilidade governativa, falta de entendimento entre os partidos para soluções de governo minimamente estáveis, de 1987 até 2005 os eleitores responderam com uma concentração de votos nos dois maiores: o voto conjunto do PS e do PSD variou entre um mínimo de 72,7 por cento, em 1987, e um máximo de 79,7, em 1991. Pelo contrário, nas últimas legislativas os votos nestes dois partidos somados quedaram-se por 65,7 por cento, a mais baixa percentagem desde 1987. Além disso, as eleições do penúltimo domingo ficaram marcadas pela vitória mais curta do partido vencedor (36,6 por cento) desde 1987 (a segunda mais baixa tinha sido em 2002: 40,2 por cento).
Há dois elementos especialmente relevantes nestes dados. Primeiro, os portugueses estão cansados do bipartidarismo que marcou a política nacional desde 1987. Segundo, estão cansados da governação baseada em maiorias absolutas monopartidárias e, por isso, deram ao PS a mais pequena maioria relativa desde 1987. Este último elemento exige grande sentido de responsabilidade do vencedor, que agora é obrigado a negociar sempre com a oposição para aprovar legislação e, consequentemente, a incorporar mais o contributo das minorias no processo de tomada de decisão. Mas as exigências que esta situação coloca aos partidos da oposição, especialmente àqueles que historicamente têm sido mais resistentes à ideia da “cooperação conflitual” (como lhe chamou Camilo Mortágua), são também bastante mais elevadas. O modelo da “democracia consociativa”, do qual nos afastámos entre 1987 e 2005, é mais inclusivo; porém, para funcionar exige das minorias uma atitude compromissória que tem faltado na política portuguesa, sobretudo à esquerda.
Originalmente publicado no Público de 5/10/2009.
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