sexta-feira, 26 de novembro de 2021

Nada como ir à fonte


«Este setor é um setor que se carateriza pela mão-de-obra intensiva e que, num contexto de necessidades crescentes em saúde, ao qual não vamos conseguir escapar – porque temos, felizmente, uma população cada vez mais envelhecida, mas também com um conjunto de necessidades que precisam ser respondidas com exigências diferentes daquelas que eram há uns anos – estes profissionais, de facto, são chamados a profissões extraordinariamente exigentes. E, também é bom que todos nós, como sociedade – e isto envolve várias áreas – pensemos nas expetativas e na seleção destes profissionais. Porque, porventura, outros aspetos, como a resiliência, são aspetos tão importantes como a sua competência técnica. Estas são profissões, de facto, que exigem uma grande capacidade de resistência, de enfrentar a pressão e o desgaste, e temos que investir nisso» (Marta Temido, 24 novembro 2021).

Cheguei inicialmente à gravação das declarações, ipsis verbis, da ministra da Saúde, através do Eduardo Barroco de Melo. Em nenhum momento - e ao contrário da forma como a sua intervenção foi amplamente noticiada (ver por exemplo aqui, aqui ou aqui, chegando a Renascença, numa clamorosa falta de ética jornalística, a colocar a suposta afirmação entre aspas) - Marta Temido disse que era preciso contratar profissionais «mais» resilientes (o que sugeriria de facto, nesse caso, que os atuais não o seriam suficientemente).

Ignorando o inventado «mais» que está a mais (por má-fé, lobby mal disfarçado, incompetência, mimetismo, caça ao click ou simples mas pouco provável mal-entendido), e podendo discutir-se se aspetos como a resilência (ou a sensibilidade e capacidade de empatia, acrescento eu) são tão importantes como a competência técnica (esse sim um debate interessante), dificilmente se estará em desacordo com Marta Temido quanto à necessidade de valorizar cada vez mais - perante as atuais e futuras exigências e desafios, ao nível dos cuidados de saúde - a capacidade de resistência, entre outros aspetos, nos processos de contratação.

6 comentários:

José disse...

O "mais" não está, mas está subentendido. O problema não é o "mais", mas o que ela disse,

Anónimo disse...

"E, também é bom que todos nós, ..., pensemos nas expetativas e na seleção destes profissionais. ... outros aspetos, como a resiliência, são aspetos tão importantes como a sua competência técnica". Se isto não configura uma clara sugestão de que os atuais profissionais são pouco resilientes, então eu, como muitos dos portugueses, devíamos voltar à escola para aprender Português de novo. Porque razão se fala em resiliência sem ninguém anteriormente ter levantado o tema?
É evidente que a ministra se sente incomodada com as demissões em catadupa dos médicos dos vários hospitais e acha que os médicos deviam fazer todos os sacrifícios possíveis para não dar a ideia de uma falta de controlo na gestão do SNS. Não é pelo facto de alguém querer muito fazer boa figura num trabalho que ele no final acabará bem feito. Quando se é incompetente toda a vontade do mundo não consegue mudar o resultado final. Colocar a ideologia à frente do pragmatismo em geral não resulta bem. Claro que também não é dizendo milhares de vezes que o SNS está muito bem que isso passa a ser uma realidade. Infelizmente quem mais diz que quer fortalecer o SNS é quem o está a contribuir para a sua degradação. Esta ministra e este governo vão deixar o SNS num estado calamitoso.
Lamento, mas a Ministra não merece que a defendam. Ela disse o que disse e foi com ressabiamento. Mesmo mais tarde, quando pediu desculpa teve ainda a lata de complementar o pedido com mais uma dose de ressabiamento dizendo ter ficado "indignada com esta receção, com esse mal-entendimento". Isto não é um pedido de desculpa como querem fazer crer.
Sérgio.

Anónimo disse...

"outros aspetos, como a resiliência, são aspetos tão importantes como a sua competência técnica ... e temos [de] investir nisso."

se têm de investir nisso, é por não haver. não é problema de não ter dito o que a SIC disse que disse. a diferença é apenas um problema do grau do que foi dito. não é problema de qualidade do que foi dito, que é e mesma.

rui disse...

Por outras palavras. Não está mas poderia estar porque daria muito jeito à chicana política. Como não está mas é preciso que esteja, "subentende-se". E como é sabido, o subentendido é aquilo que um homem quiser

Ed disse...

A partir do minuto 5:49

Carlos Marques disse...

«pensemos nas expetativas e na seleção destes profissionais. Porque, porventura, outros aspetos, como a resiliência, são aspetos tão importantes como a sua competência técnica. Estas são profissões, de facto, que exigem uma grande capacidade de resistência, de enfrentar a pressão e o desgaste, e temos que investir nisso»

Ela está a propor que se pense na seleção de médicos tendo em conta a sua resiliência.
Que se pague mais ("temos que investir nisso") pelas horas extraordinárias acima do limite legal ("capacidade de resistência").

Marta Temido, perante a sangria de médicos do SNS para o Privado, não só por questões salariais, como pela falta de condições (trabalho a mais, o que será cada vez pior à medida que mais médicos fugirem do SNS) está a dizer que o problema se resolve com a contra-proposta que o PS deu ao BE: violar a lei europeia que limita a 200 as horas extraordinárias, e pagar um pouco mais aos profissionais que aceitem fazer mais de 500h extraordinárias, e "pensemos" em selecionair profissionais tendo mais em conta a sua resiliência/resistência (para fazer estas horas todas sem protestarem nem se demitirem) do que a sua competência (ou seja, o SNS vai plantando os "jovens atletas", e o Privado vai colhendo os profissionais já experientes).

Isto é uma VERGONHA, e quanto mais tentam defender o indefensável (este governo que quer destruir o SNS, com Marta Temido a dar a cara por péssimas políticas e inaceitáveis declarações, e A.Costa a falhar todas as promessas), mais figura de urso fazem. É que uma coisa são as interpretações diferentes que se podem fazer de um texto/discurso ambíguo, outra bem diferente é fechar os olhos ao problema, e atirar areia para os olhos de quem viu que o rei vai nu. É insultuoso o Nuno Serra usar este blog para tentar fazer dos outros parvos.