Desde os anos noventa, é difícil encontrar um divulgador das apologias económicas da globalização mais influente do que Thomas Friedman, cujo “mundo é plano” apresentava a globalização neoliberal como um inevitável subproduto de supostos desenvolvimentos tecnológicos. Friedman reconheceu recentemente a validade das hipóteses daqueles que antes considerava anacrónicos. Afinal, a globalização e o egoísmo causam um desastre evitável, já que se erodiram as normas e regras que asseguram a “resiliência” dos sistemas naturais e sociais, tornando tudo mais “frágil”.
No entanto, mais importantes do que os que “transacionam ideias em segunda mão”, para usar a fórmula de Hayek, são os economistas de quem muitos políticos são escravos, para relembrar Keynes: no que diz respeito ao papel causal das ideias económicas, estes dois intelectuais idealistas até convergiam.
Desde os anos noventa, é então difícil encontrar um economista neoliberal mais influente do que Lawrence Summers: de economista-chefe do Banco Mundial a Secretário do Tesouro de Clinton, responsável pelo desmantelamento do que restava da regulação financeira do New Deal, passando pela presidência da Universidade de Harvard ou pelo cargo de principal conselheiro económico de Obama, garantindo o salvamento de Wall Street, mas não da Main Street, ou não tivesse também ganho imenso dinheiro na primeira. Agora é o principal economista mobilizado por essa refrescante novidade chamada Joe Biden.
Desde a Grande Recessão, Summers vem reconhecendo os efeitos negativos das políticas que preconizou, sublinhando as tendências do capitalismo neoliberal para a estagnação secular ou defendendo um nacionalismo responsável, dados os efeitos deletérios da globalização também por si promovida. No contexto da atual crise, até veio reconhecer as vulnerabilidades geradas pelas cadeias de valor globais e tudo.
O culminar deste percurso intelectual ao arrepio da política que preconizou é um longo artigo, publicado em coautoria com Anna Stansbury no National Bureau of Economic Research (NBER), sobre luta de classes e seus efeitos macroeconómicos. A sério. É realmente inacreditável.
Obviamente, a realidade ainda é peneirada pela economia convencional, mas o mecanismo está lá. Em resumo, “argumentamos que o declínio do poder dos trabalhadores – com a queda do sindicalismo e do seu poder no sector privado, o declínio do valor real do salário mínimo, o incremento do activismo dos accionistas e as táticas de gestão agressivas – redistribuíram rendimento dos trabalhadores para os proprietários do capital”. Ou como dizia Warren Buffett, “a luta de classes existe e a minha classe está a ganhá-la”.
Tanta sofisticação convencional e o estudo acaba a convergir explicitamente com a hipótese de John Kenneth Galbraith, formulada em 1952, sobre as virtudes do chamado poder compensatório, exercido por exemplo pelos sindicatos. A reabilitação das teses de Galbraith é cada vez mais evidente, como bem antecipou José Madureira Pinto. Hayek abominava de resto este economista keynesiano e institucionalista radical seu contemporâneo. Percebe-se bem porquê se lerem este crítico incisivo das ficções de mercado. Há realmente muitos economistas políticos do passado que têm de ser salvos da barbárie económica.
A tendência é cada vez mais clara, da financeirização do capitalismo à economia política da redistribuição de baixo para cima: o melhor que a economia convencional consegue fazer é chegar atrasada umas décadas à identificação dos mecanismos reais, por comparação com as tradições institucionalista, marxista e keynesiana sem abastardamentos que procurou tantas vezes proscrever, tendo de resto alcançado grande sucesso nesta redução do pluralismo. Não os identifica com a mesma clareza. E só o faz, quando o faz, depois de ter flagrantemente andado a influenciar a política económica numa direcção perniciosa para a maioria.
segunda-feira, 22 de junho de 2020
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11 comentários:
As contradições do neoliberalismo, ou ordoliberalismo na europa (o ordoliberalismo é o nazismo recondicionado e reempacotado) não são algo que possamos usar para o combater.
Isto porque existe uma tomada do poder por fases.
Até cerca de 2008, foi feita a colonização dos partidos de poder, nas democracias mais robustas e economias mais importantes (que normalmente coincidem), principalmente aqueles partidos ditos de centro-esquerda, pois só assim seria possível coordenar a ação dos partidos de direita e esquerda, na alternância.
A partir de 2008, assiste-se à decapitação rápida da democracia, o que fará das contradições do neoliberalismo autênticas anedotas em pouco tempo.
Querem exemplos: a Hungria está dominada por uma oligarquia de um aprendiz de soros; o Brasil está a caminho da idade média; a Turquia vive uma paródia de estado de direito; Israel; Arábia Saudita; Coreia; Rússia; Irão; Venezuela, etc.
E falta o mais importante: os EUA da trumpofonia e a charada tecnocrata chamada UE.
Quem é que quer saber de contradições do neoliberalismo nos EUA, hoje em dia?
Eles estão mais preocupados em não cair na crescente teia de mentiras, tecida pelo incrível elenco de filme de 5ª categoria que ocupa o poder.
Não percam tempo com os estados de alma dos spin doctors do neoliberalismo; sempre que surge uma crise, eles ficam assim: mansinhos, chorosos, arrependidos.
O objetivo é levar-Vos a pensar que algo mudou, mas isso é só para Vos distrair, enquanto forçam os estados a praticar a "segurança social" dos oligarcas.
Afinal a História não acabou
"da financeirização do capitalismo à economia política da redistribuição de baixo para cima..."
Há que prestar contas
Sempre me sinto frustrado por nunca ver tanto pensamento reflectido no custo de vida e nível de consumo das populações a resgatar da odiosa teia globalizante.
Percebe-se que resulta em prejuízo do capital financeiro mas quem beneficia e em quê já não é nada claro.
Identificar o que se altera no modo de viver das maiorias sempre será missão a que a economia política não pode furtar-se.
Qual é o espanto? O poder, todo ele, procura assegurar as condições de auto-perpetuação. Se a crise se torna evidente, procuram-se estratégias, de preferência conhecidas, para salvar a maior parte do que existe. É preciso que alguma coisa mude para que o resto fique na mesma...
Claro, pessoas como o João Rodrigues jamais serão capazes de admitir que a crise dos anos 70 levou à recuperação de fórmulas anteriores (por isso é que o neoliberalismo se chama de facto 'neo-classical liberalism') em face da falência das soluções social-democratas. Tudo isto tem um ar de deja vu...
Portanto, somos chegados a um momento histórico em que todas as soluções políticas anteriormente tentadas falharam. A social-democracia falhou, o socialismo real faliu estrondosamente e o dito neoliberalismo apresenta sinais mórbidos crescentes, que se manifestam no aparecimento dos nacionalismos xenófobos de Trump, Bolsonaro, Putin, etc, mas que escondem pouco mais de que um neo-patrimonialismo de captura do Estado por elites económicas ainda menos recomendáveis do que as de Davos (de facto são parcialmente pelo menos, as de Davos)...
E tudo isto no contexto de uma crise ambiental crescente que naturalmente coloca em causa o modelo de crescimento perpétuo comum a todas as tradições económicas referidas acima. Aliás, a social-democracia pela qual tanto gosta de chorar lágrimas de crocodilo foi a primeira vítima do que se podem chamar os limites do crescimento...
E portanto, temos um conjunto de pessoas que, confrontadas com problemas novos, recorre a diagnósticos velhos e a soluções velhas...
Quando começarem a admitir que vamos mesmo ter todos que ficar mais pobres (a começar naturalmente pelos mais ricos), as coisas talvez mudem. Até lá, não...
Isso não parece ser um problema para o João Rodrigues, cuja via alternativa é o capitalismo autocrático à chinesa ou porventura à vietnamita (ou não). Mas já se perguntou qual o mecanismo de crescimento da China? O crédito, naturalmente... Isso não preocupa?
Já quanto a Biden, acredito que não o entusiasme muito, mas quando a sua alternativa era outro 'jarreta' como Sanders, desculpe lá mas não tem grande moral para criticar.
Esperemos, naturalmente, que a Esquerda americana tenha dois dedos de testa e seja capaz de, se achar necessário, pôr dois dedos no nariz para eleger o antigo vice de Obama... É que este ganhou as primárias democráticas por uma milha e é o que está disponível. Nem se sequer se podem queixar do que sucedeu em 2016...
Que não venham para cá com racionalizações idiotas do estilo Macron 2017=Le Pen 2022...
As pessoas podem naturalmente fazer a birra do costume e decidir não aparecer no dia das eleições, facilitando a reeleição de Trump... Mas aí, das três uma, ou são estúpidas que acreditam no quanto pior melhor, ou são estúpidas e masoquistas, ou são simplesmente estúpidas...
Claro que não, fosse Le Pen presidente e ainda tinhamos a polícia todos os dias a usar gás pimenta e balas de borracha contra manifestantes. Livramo-nos de boa.
Temos todos que empobrecer, começando pelos mais ricos? Quem os obriga? Macron, Biden, Costa, e demais colaboracionistas não são com certeza, muito pelo contrário, dão-lhes cada vez mais. Até ao dia em que não haja brioches...
Sente-se jose frustrado.
E depois desbobina a sua frustração sem que se entenda bem o que diz,com duas prementes excepções:
-O capital financeiro não tem tido prejuízo. Em geral o que se tem visto é a engorda deste, à custa de todos os demais
Daí que, se não der muito transtorno a Jose, ele que não aldrabe os factos já que não estamos em blogs manhosos. Repita-se: "redistribuíram rendimento dos trabalhadores para os proprietários do capital”. Ou como dizia Warren Buffett, “a luta de classes existe e a minha classe está a ganhá-la”.
Mais claro do que isto é difícil. Mas jose tem aquela lágrima fácil para os terratenentes e afins
-A outra questão é a noção do que é a economia política para Jose. Mas francamente, agora nem vamos abordar a questão, porque outra mais funda se impõe:
O que temos nós a ver com as frustrações do Jose?
(Parece que era ele que conhecia um pantomineiro dum psiquiatra espanhol, que vivia aos sábados à custa dos portugueses. Será que o poderia consultar se as frustrações forem por demais avassaladoras?)
Quanto a Jaime Santos...
Talvez mereça uma resposta quando estiver mais calmo e se se portar de forma mais adequada a uma "elite" que já só tem isto para dar.
Quando se fala de Binden ( "essa refrescante novidade chamada Joe Biden" ) e se responde com um "jarreta", referindo-se a Sanders é porque as coisas estão feias com os fígados de JS.
É que só uma ala assim encostada bem à direita considera que Sanders não era uma carta fora do baralho habitual do xadrez político americano. Com todas as suas limitações, era uma lufada de ar fresco, compreendida pelo voto jovem que o apoiava.
Chamar-lhe de "jarreta" ( pela idade?) é sinal de irritação,má fé e desnorte.
Um chazinho para JS, que talvez voltemos ao assunto
Será que essa paixão assolapada de JS por Macron, tem a ver com o facto de este ter traído o seu partido e os seus ideais?
Jaime santos está pateticamente reduzido a isto
A encontrar "justificações" para as pulhices dos seus companheiros de percurso.
Parece que se trata de "auto-perpetuação". Desapareceram os horizontes dourados propalados em função de um processo ideológico. Sobrou isto. Uma "auto-perpetuação". E está justificada a existência de moluscos e de invertebrados nas suas variáveis modificações de.
É igual o sacana que andou meia-vida a fazer crescer a riqueza dos de cima à custa dos de baixo,do que denunciou e combateu tal processo
Ainda por cima tem a lata de citar ( mal, como é seu timbre) Tancredi. Ele, JS, é o protótipo de zelota maior do que é denunciado no Gattopardo.
Talvez cansado de ser acusado de padrões semelhantes, JS resolve dar um ar da sua graça e tenta desta forma assumir a "coisa" em vez de lhe apontar o dedo
Como hipocrisia é sintomático.Como impotência, dá cabo de qualquer um
Tremendista dirá:
"todas as soluções políticas anteriores falharam"
Uma espécie adulterada de nihilista a vender o seu peixe para justificar a trampa aonde foi parar o modelo societário que defende
Os sintomas mórbidos( agora até já cita um marxista) do neoliberalismo não são apenas os do aparecimento dos"nacionalismos xenófobos". (Repare-se que JS agora já usa a palavra "nacionalismos" no plural). Mas o que pretende é esconder os reais sintomas mórbidos. E eles estão à vista de todos. Até se manifestam nestas figuras de economistas que hoje são obrigados a contradizer o que disseram no passado. E JS miseravelmente faz um exercício de mistificação sobre as elites que capturam o Estado, sem uma palavra para quem de facto captura a riqueza produzida
De forma um pouco à papagaio repete o mesmo paleio vergonhoso e da treta:
" vamos mesmo ter todos que ficar mais pobres (a começar naturalmente pelos mais ricos)"
Não acham graça a esta comoção sentida pelo facto dos mais ricos serem os primeiros a ficar mais pobres?
E o que diz a realidade?
A actual pandemia atirou milhões para a miséria. JS agita uma mão duvidosa e diz em jeito de consolo: vamos todos empobrecer...a começar pelos mais ricos.Se não é agora, é depois
"Os Estados Unidos estão sofrendo uma pandemia horrível. Mas há enormes disparidades entre aqueles que sofrem com as consequências econômicas da pandemia. Pesquisadores da Universidade Columbia projetam que as taxas de pobreza nos Estados Unidos em breve atingirão seus níveis mais altos em meio século. Mas um relatório para o Institute for Policy Studies mostrou que a riqueza dos bilionários norte-americanos na verdade aumentou quase 10% em apenas três semanas, exatamente quando começou a crise da COVID-19.
Com o devido respeito mas esse "comentário" que encima os "comentários" tem coisas como estas:
-"o ordoliberalismo é o nazismo recondicionado e reempacotado". (Que idiotice larvar.Parece coisas daquele holandês ordoliberal)
-"existe uma tomada do poder por fases." (Tal como as da Lua)
-"Até cerca de 2008, foi feita a colonização dos partidos de poder". (Depois não)
-"coordenar a ação dos partidos de direita e esquerda, na alternância". ( isso. Alternar)
-"A partir de 2008, assiste-se à decapitação rápida da democracia, o que fará das contradições do neoliberalismo autênticas anedotas em pouco tempo" ( olha se não fosse a decapitação, deixávamos de ter anedotas)
-"Querem exemplos: a Hungria a Turquia v Israel; Arábia Saudita; Coreia; Rússia; Irão; Venezuela, etc" ( uma espécie de todos ao molho e fé em Deus.Falta a Holanda)
"E falta o mais importante: trumpofonia e a charada tecnocrata" ( afinal faltava mais alguma coisa)
"Eles estão mais preocupados em não cair na crescente teia de mentiras" ( olha este a tentar não cair)
"Não percam tempo com os estados de alma dos spin doctors do neoliberalismo"( e vivam os spin)
"O objetivo é levar-Vos a pensar que algo mudou, mas isso é só para Vos distrair" ( vai um tirinho freguês?, perguntava a Nádia)
Amén
(O que vem a ser isto? Um chorrilho de disparates a ver se passa como exemplar de um rebolucionário da treta?)
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