“Sempre houve influência do poder económico sobre o poder político. Mas nunca foi tão evidente como agora”, informa-nos Augusto Santos Silva em entrevista, tomando como pretexto o seu livro sobre poder, esse bem posicional e relacional por excelência: mais para uns é menos para outros.
Nem sequer é caso para dizer mais vale tarde do que nunca, porque Santos Silva considera a globalização inevitável e porque está a referir-se apenas aos EUA, como se a União Europeia, a do Consenso de Bruxelas-Frankfurt, não fosse um exemplo, tão ou mais acabado, do reconhecido processo de desdemocratização, indissociável da globalização que essa mesma UE promoveu como ninguém. Como se Portugal, em crescente periferização, não fosse um exemplo, com as peculiaridades que são as suas.
No caso português, intelectuais como Santos Silva ainda não estão preparados para reconhecer um facto bruto, porque isso implicaria uma ética da responsabilidade, com a correspondente autocrítica: a subordinação do poder político ao poder económico tem nas privatizações um dos seus principais esteios. O PS, onde Santos Silva teve poder nas últimas décadas, privatizou mais do que o PSD.
A esmagadora maioria dos deputados constituintes reconheceu, há quase cinquenta anos, que as nacionalizações eram conquistas democráticas, esteio da subordinação do poder económico ao poder político. Tinham uma noção adequada das relações de poder. Houve um imenso recuo intelectual. Santos Silva participou dele, lamento dizê-lo.
E que dizer de quem fala de relações de poder cientificamente, mas não fala de luta de classes, a principal relação de poder que se pode cientificamente prever? Falar dessa relação, partindo do caso português e não só, implicaria, por exemplo, analisar a redução dos direitos laborais, correlativa do aumento dos direitos patronais. Estes últimos confundem-se com a inflação dos direitos, com cada vez menos deveres e funções sociais, associados à propriedade privada dos meios de produção.
O incremento da exploração passou por aqui, não é um dado natural, como os intelectuais do P sem S no fundo sabem, ou não tivessem defendido aquelas alterações regressivas na estrutura de direitos e de deveres subjacente às relações laborais. Já que Santos Silva está tão atento aos EUA, lembro Warren Buffet, num momento de enorme lucidez: “a luta de classes existe e a minha classe está a ganhá-la”. A social-democracia contribuiu para essa vitória e exauriu-se nesse processo com décadas dos dois lados do Atlântico Norte.
E que dizer das relações de poder entre Estados, mas também entre Estados e organizações supranacionais, como a UE? Santos Silva teria de analisar a forma como este Estado democrático perdeu poder ao perder instrumentos de política, transferidos para cima, para Bruxelas-Frankfurt, ou simplesmente eliminados, com a crescente irrelevância económica da fronteira política, essa grande regressão económico-política. Fazê-lo implicaria, uma vez mais, falar da responsabilidade do P sem S e, em breve, sem P.
Não, não é questão de pureza ter-se uma visão radical do poder, como parece insinuar no fim. É questão de realismo, incluindo do realismo brutalmente científico.
E que dizer de quem fala de relações de poder cientificamente, mas não fala de luta de classes, a principal relação de poder que se pode cientificamente prever? Falar dessa relação, partindo do caso português e não só, implicaria, por exemplo, analisar a redução dos direitos laborais, correlativa do aumento dos direitos patronais. Estes últimos confundem-se com a inflação dos direitos, com cada vez menos deveres e funções sociais, associados à propriedade privada dos meios de produção.
O incremento da exploração passou por aqui, não é um dado natural, como os intelectuais do P sem S no fundo sabem, ou não tivessem defendido aquelas alterações regressivas na estrutura de direitos e de deveres subjacente às relações laborais. Já que Santos Silva está tão atento aos EUA, lembro Warren Buffet, num momento de enorme lucidez: “a luta de classes existe e a minha classe está a ganhá-la”. A social-democracia contribuiu para essa vitória e exauriu-se nesse processo com décadas dos dois lados do Atlântico Norte.
E que dizer das relações de poder entre Estados, mas também entre Estados e organizações supranacionais, como a UE? Santos Silva teria de analisar a forma como este Estado democrático perdeu poder ao perder instrumentos de política, transferidos para cima, para Bruxelas-Frankfurt, ou simplesmente eliminados, com a crescente irrelevância económica da fronteira política, essa grande regressão económico-política. Fazê-lo implicaria, uma vez mais, falar da responsabilidade do P sem S e, em breve, sem P.
Não, não é questão de pureza ter-se uma visão radical do poder, como parece insinuar no fim. É questão de realismo, incluindo do realismo brutalmente científico.
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