domingo, 17 de agosto de 2025

Como se o blogue fosse um diário


Coimbra, 16 de agosto de 2025

“Não vás para Penedono, só lá vais atrapalhar, além disso não há comunicações, ainda há para lá estradas cortadas e a circulação é de evitar neste contexto.” 

Sou um cidadão obediente. Fico por Coimbra. Refugio-me no meu lugar à sombra no Jardim Botânico. O banco estava ocupado, felizmente por pouco tempo. Dois turistas deixaram um mapa de Coimbra, repararei depois. Estava assinalado com alguns dos monumentos a visitar ou já vistos, não sei. Lá estava o meu jardim marcado. 

Tento concentrar-me na leitura dos capítulos finais de um livro sobre o “fascismo tardio” que comprei em Espanha, da autoria de Alberto Toscano. Ignora a tradição antifascista de Dimitrov, Cunhal e tutti quanti. Ou melhor, não ignora, refere-a caricaturalmente de passagem, literalmente numa linha. 

Fez mal, mas em compensação tem uma excelente síntese do fascismo a partir dos “marxistas negros” – “o capitalismo requer a desigualdade e o racismo entroniza-a”, sendo que o fascismo “pugna violentamente por entronizar a desigualdade em condições de crise capitalista, criando simulacros de igualdade para alguns”. 

Contém ademais uma estimulante interpretação histórica dos “tempos para o fascismo, dentro do fascismo e do fascismo”. Os tempos para o fascismo são os do “vírus capitalista” e das suas mutações, denunciado por Karl Polanyi, citado, mas pouco escalpelizado. 


A verdade é que estou com dificuldade em concentrar-me. Informam-me, pelo WhatsApp da família, que tenho familiares heróicos a impedir que as chamas saltem a estrada. 

São os tais “populares” de que fala uma certa televisão, tão arrogante quanto desconhecedora do país e das suas gentes, totalmente desorientada, ou melhor orientada pela transformação do fogo em espetáculo monetarizável para gáudio de pirómanos. E há nas televisões uns idiotas a dizer mal do povo do interior, ouço dizer. É o mesmo capitalismo televisivo que não hesita em televisionar, em promover, o fascismo. 

Enervado, recebo uma foto de um souto por onde o fogo passou. Tinha sido capinado e só ficou chamuscado, há-de voltar a florescer. O castanheiro resiste, como o povo de um concelho pequeno, Penedono, onde, segundo a Presidente da Câmara Municipal, ardeu 90% da sua bela área verde, com prejuízos óbvios para a cultura mais rentável, a da castanha. 


Levanto-me e caminho sem mapa. Passo ao lado da maternidade onde nasceu o meu filho e encontro um camarada, daqueles imprescindíveis. Eu sou um democrata e patriota, não sou militante do Partido. Considero camaradas todos aqueles com quem partilho um longo caminho, sejam ou não militantes. Tinha acabado de ser avô, felicito-o e afasto-me emocionado. Haja vida.

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