segunda-feira, 25 de novembro de 2013

Jacobinos

No espírito do meu último post, quero partilhar uma descoberta recente: a revista norte-americana Jacobin, “uma revista de cultura e polémica” resolutamente socialista. Nem tudo está disponível gratuitamente na sua bem desenhada página, mas do último número podem ler um artigo sobre a economia convencional e a sua ofuscação da desigualdade e dos conflitos de classe no centro do capitalismo actual, uma recensão ao livro de um dos historiadores críticos, Vijay Prashad, que mais tem feito para construir uma história global da possível ascensão do Sul global ou um ensaio sobre Maurice Dobb, um dos injustamente esquecidos economistas e historiadores do século XX, um marxista na “corte de Keynes”. Trata-se de voltar, contra modismos debilitantes à esquerda, de qualquer forma trucidados pela crise, aos grandes e clássicos temas da prática teórica socialista, com arrojo renovador e alguma intransigência estratégica, tentando manter a distinção entre dois planos articulados, mas autónomos, entre derrota e vitória políticas, questão de poder, e vitória e derrota intelectuais, questão de validade. Não é fácil esta distinção, mas se não a mantivermos em tempos sombrios estamos mesmo condenados a perder tudo.

3 comentários:

José Gabriel Pereira Bastos disse...

A mim me parece que a prova da validade não pode ser 'intelectual' sob pena de se construir um círculo vicioso narcísico, sem relação com a história. O mundo avançou e transformou-se (como sempre) e não é voltando aos 'clássicos' que se pode avançar, é preciso inteligir com novos dados e novos enfoques porque é que a balança do poder está a tombar tão fortemente a favor da ideologia cultural anglo-americana com a conivência divisionista de toda a esquerda, embrenhada em clivagens identitárias. Falta pensar quais são as novas tarefas organizacionais e críticas, as quais precisam libertar-se da ganga museológica e romântica, isto é, da compulsão à repetição. Nenhuma teorização aconselha que se repita o que repetidamente falhou. Sem união não há esquerda, há uma multidão de estilhaços de esquerda. Sem novas análises e novos projectos e sem união construída em novos moldes (por objectivos, não por tradições) a mim me parece não há futuro para a esquerda. O que não me agrada mesmo nada, mas é o que a análise histórica indicia. Na verdade, o poder anglo-americano deve estar a rir-se às gargalhadas com a tal "validade teórica" incapaz de equacionar a questão do contra-poder democrático e da sua falhada vocação hegemónica que, com a excepção analítica de Freud, estava prevista desde a Revolução Francesa e a criação da ideia de "povo", como sujeito da história. Acontece que é fácil dividir o povo, como a Esquerda pratica, o que é difícil é uni-lo e para isso há que tornar evidente onde está, quem é e como actua sociopaticamente o inimigo de que 'o povo' gosta tanto (a banca, o consumo, a cultura cinéfila e musical americana).

Baltazar Garção disse...



José Gabriel Pereira Bastos,

apesar de bastante denso e complexo, concordo bastante com este seu comentário.


O "poder anglo-americano" é uma evidência, mas não sei até que ponto compensa (e não só intelectualmente...) elegê-lo como "inimigo" do(s) Povo(s), ou figuração duma Direita histórica.


O que me parece é que, contra um couraçado, ou um blindado, vale mais uma pequena bactéria, bem viva, do que uma bala, isto para pôr as coisas de uma forma muito sintética e figurada.


E a "validade teórica", não sendo suficiente para mover a História, não deixa de ser uma peça importante do argumentário da Esquerda histórica, pelo menos no plano ético, desde que, claro, não constitua apenas o tal ciclo "vicioso" e "narcísico", sem relação com a História...

Irene Gonçaves disse...

"Nenhuma teorização aconselha que se repita o que repetidamente falhou."

Isto é verdade para qualquer sistema, incluído o cada vez mais falhado norte-americano, agora que a URSS acabou, e já não precisa de ter um lado humanitário.