Aproveito para deixar uma crónica que escrevi no setenta e quatro sobre o tema:
As alterações climáticas são uma das manifestações mais perniciosas de uma crise ecológica planetária que ameaça a vida na Terra e acentua desigualdades geográficas, socioeconómicas e ambientais. Com efeito, as alterações climáticas afetam desproporcionalmente camadas da população estruturalmente empobrecidas e invisibilizadas, nomeadamente as mulheres, as crianças, os idosos, as pessoas racializadas, os povos indígenas, os migrantes e os refugiados.
Embora nos seja frequentemente apresentado como um mero exercício tecnocrático, o combate às alterações climáticas é eminentemente político, constituindo um terreno fértil para a contestação e construção de alternativas, desejavelmente à esquerda. Tal implica colocar a luta de classes, o género e a raça no centro do debate, revelando como as suas múltiplas intersecções vulnerabilizam determinadas comunidades num cenário de intensificação das alterações climáticas.
Torna-se imperativo reconhecer que o sistema capitalista explora, simultaneamente, os trabalhadores e a natureza, depende de trabalho reprodutivo não remunerado e assenta e perpetua as desigualdades de género e o racismo. O combate às alterações climáticas parte, pois, da imaginação e edificação de futuros anticapitalistas, feministas e antirracistas.
Uma proposta radical chega-nos do Ecossocialismo, uma corrente de pensamento e um movimento que procura aliar os ideais fundamentais do marxismo à ecologia crítica. O seu princípio basilar está contido na seguinte formulação: não pode haver uma verdadeira revolução ecológica que não seja socialista, e uma verdadeira revolução socialista que não seja ecológica.
O Ecossocialismo expõe uma contradição insanável: a expansão do modelo de produção e consumo dos países capitalistas avançados, alicerçado na acumulação de capital e lucro, no extrativismo e nos combustíveis fósseis, colide com os limites biogeofísicos do planeta, intensificando a crise ecológica e as desigualdades multidimensionais que dela decorrem.
O objetivo primordial do Ecossocialismo seria construir uma sociedade fundada na democracia, na igualdade e no respeito pelos limites ecológicos do planeta. Defende-se o controlo coletivo dos principais meios de (re)produção e o planeamento democrático da produção e do investimento. Os seus atores políticos centrais seriam as classes trabalhadoras urbanas e rurais e os seus sindicatos, numa aliança com protagonistas de outras lutas socioecológicas.
Aspetos como o papel do Estado, as escalas de operacionalização do planeamento democrático e a definição de um programa capaz de competir pelo poder, permanecem em disputa no campo Ecossocialista. Se o Ecossocialismo nos oferece um vislumbre de futuros mais democráticos, ecológicos e igualitários, os caminhos para lá chegar serão necessariamente distintos, já que os contextos nacionais, onde reside a soberania democrática, são também eles diversos.
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