domingo, 30 de abril de 2023

Querido diário - Baixos salários e a carestia de vida na mira da Polícia

Jogo de Futebol entre SLB e FCP, 1956

Foi há 67 anos.

“A carestia de vida que dia-a-dia se agrava, a falta de alguns géneros da primeira necessidade, a pobreza dos salários e de vencimentos dos funcionários de menor categoria, dão lugar a queixas que se exteriorizarão em protestos, mais ou menos, violentos, quando a ocasião os permitir. Fala-se da alta de preços e da impunidade que parece rodear esta especulação e este dize tu direi eu não se limita aos centros urbanos, pois faz-se sentir grandemente nos meios rurais, onde a crise de desemprego, por motivo de inconstância do tempo e das baixas jornas (20$00 de sol a sol), mais perniciosa se tem tornado. Se não fosse o enfraquecimento do “partido” devido à repressão policial (27 “funcionários” presos de 1950 a 1955) e a diminuição da agitação nas classes operárias e nos meios rurais, pelas razões já expostas, poderiam, ter-se já dado acontecimentos de certa gravidade." (Informação da PIDE para o presidente do Conselho de Ministros, António de Oliveira Salazar, 18/4/1956)

 

Nessa altura, a repressão política não era apenas violência repressiva. Não era apenas um regime de partido único (União Nacional/Acção Nacional Popular), sufragado em eleições falcatruadas desde o recenseamento eleitoral. Não era apenas um regime de um organismo ideológico-policial dentro do aparelho do Estado.  

A PIDE representou uma das peças essenciais articulada com a política do dito Estado Novo para criar as "melhores" condições políticas a uma dezena de grupos económicos, financeiros e monopolistas, detidos por um punhado de  famílias privilegiadas. Impôs-se pela força baixos níveis salariais e de vida, o empobrecimento, o analfabetismo (em 1960, 40% dos portugueses não sabia ler nem escrever e havia apenas 4 anos de ensino obrigatório) e o subdesenvolvimento social como condição de impedir uma maior consciência colectiva de classe, premissa para uma maior exploração e desigualdade na repartição do rendimento. 

Ao tempo de Salazar, cerca 61% do rendimento nacional cabia aos lucros e 39% aos salários. Essa era "a" tarefa da Polícia Política, instrumento do sistema capitalista, no seu regime mais violento e terrorista - o fascista. 

E quando hoje se assiste à forma violenta, provocatória e desabrida como a extrema-direita actua no Parlamento; ao mesmo tempo que vota ao lado dos partidos "institucionais" de direita todas as iniciativas políticas visando rebaixar o poder dos trabalhadores face ao poder empresarial e desvalorizar a parte dos trabalhadores na repartição do rendimento; não se pode deixar de sentir em democracia o cheiro da função do fascismo. Ou seja, a vontade de certos grupos económicos - potenciais financiadores da extrema-direita - de usar forçar uma mais acentuada deriva à direita para criar um regime livre de todos os constrangimentos que a Constituição ainda lhes cria, nomeadamente na salvaguarda do Estado Social e dos seus recursos. 

Veremos se as "linhas vermelhas" da direita não serão apenas boas intenções do momento. E se no momento da verdade, outros valores se erguerão. Cá estaremos. 


1 comentário:

Anónimo disse...

É evidente que essas linhas vermelhas não existem, o capitalismo é no limite um sistema fascista.