Abril entrou com as ruas do país a mostrar o que uma bela canção de A Garota Não e Chullage, intitulada «Não sei o que é que fica», vinha dizendo num dos seus versos: «Habitação é fractura exposta» (1). Dói por si e expõe outras dores. A negação do acesso à habitação — esse direito constitucional que continua por cumprir quase meio século depois da Revolução que o consagrou —, cobre de sofrimento os dias de quem só vê os preços das casas a subir e os salários a perder poder de compra. Como ficou patente a 1 de Abril no mapa das manifestações «Casa para Viver», a falta de habitação a preços comportáveis para a maioria dos trabalhadores estende-se pelo país, ainda que seja mais grave nas cidades onde se concentra, após décadas de desinvestimento no território, a maior parte do emprego. O problema nasce da insignificância do parque habitacional público e da ausência de medidas de controlo de preços e rendas, agrava-se com o fosso entre baixos salários (nacionais) e elevados afluxos de investimentos imobiliários (nacionais e internacionais), num contexto em que se multiplicam, com dinheiros públicos, os incentivos a proprietários e senhorios sem sequer serem adoptadas medidas que impeçam os despejos. Afecta todas as gerações, desde os jovens mais precarizados e com salários mais baixos até aos reformados com pensões que (já antes) mal lhes permitiam viver, passando pelos imigrantes que acumulam eixos de fragilização e são tantas vezes preteridos no acesso à habitação. Em comum têm, todas essas gerações que se manifestam juntas, o lado que lhes calhou na lotaria das classes em que nasceram ou acabaram vivendo.
Não percam o resto do editorial deste mês - Habitação, salário e conflito social -, da autoria de Sandra Monteiro, no site do Le Monde diplomatique - edição portuguesa.
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