Na terceira versão da sua modesta proposta para salvar o euro no quadro de um “europeísmo” dito “descentralizado” – com europeização da supervisão bancária, da emissão e gestão da dívida pública até 60% do PIB de cada país, as tais euro-obrigações, e do planeamento de uma política de investimentos com escala europeia suportada por instituições como o Banco Europeu de Investimento – Yanis Varoufakis e Stuart Holland apresentam numa frase o mecanismo final de desintegração do euro: “um euro numa conta bancária grega tem um valor esperado inferior a um euro numa conta bancária espanhola, que, por sua vez, está abaixo dum euro numa conta alemã.”
Passados mais de dois anos foi aqui que nos conduziu a brilhante resposta europeia de austeridade a uma crise bancária, de dívida que não é soberana, de falta de investimento e de desequilíbrios entre os países. E insistem no erro. A interacção entre estas crises do neoliberalismo europeu é cada vez mais tóxica numa zona que no seu todo é mais desigual do que os EUA sem ter internamente os mesmos mecanismos redistributivos entre zonas ricas e pobres. E, já se sabe, a desigualdade dificulta a cooperação e mina a confiança. Nunca é tarde para o bom senso keynesiano à escala da moeda e para lá dela, seja a moeda qual for, mas não creio que dramatizar o fim do euro, como fazem os autores, vá introduzir qualquer bom senso nas elites e levar ao abandono das politicas que nos levaram até aqui, politicas que estão bem inscritas na arquitectura deste euro e na correlação de forças que favoreceu. Assim como não compreendo a ilusão de que a europeização das politicas de supervisão bancária leve a uma qualquer redução da influência do capital financeiro nas políticas de regulação, antes pelo contrário: em Bruxelas há mais lobbies do que em Washington, beneficiando da ausência de democracia e do necessário afastamento das classes populares e seus movimentos. Bem sei que pragmaticamente os autores não querem mexer nos tratados no actual contexto e percebo bem as suas razões.
De resto, o obrigatório incumprimento grego dentro do euro por iniciativa do país, na linha de Varoufakis, vai desafiar gente que não está habituada a ser desafiada, acentuando, em conjunto com os desestabilizadores movimentos de capitais, tensões que podem ser produtivas ou podem não ser. Num cenário de incerteza radical, o contramovimento de protecção requererá intervenção acrescida dos estados, ali onde está a democracia, ainda que esventrada. Julgo que é partindo daí que se pode esperar reconstruir uma coordenação modesta depois do parêntesis deste euro disfuncional.
2 comentários:
Aos Srs. Doutores do Ladrões de Bicicletas, as lições de finanças de uma menina de 12 anos canadiana.
Caro João
Globalmente, discordo. Diz ele que
"Naturally, while a defaulted Greece can easily (...) remain in the eurozone, a long term resolution of its insolvency will have to be plotted by Europe."
Primeiro, não é fácil e as sugestões que ele aponta são um bocadito para o conjectural em excesso; depois não é óptimo (ao contrário que o Varoufakis também afirma, abusivamente); terceiro, confiar na "UE" para resolver o problema da insolvência, ou o problema estrutural de repetidos défices externos, é pedir ao ladrão que seja amável, mas continuando a fornecer-lhe a chave da casa...
À custa de tanto lermos o Varoukakis, acabamos realmente por ficar todos um bocado mais burros... e não só de Buridan...
Enviar um comentário