Chamo a atenção dos moralistas para o continuado regabofe das “famílias portuguesas”, que dissipam os seus rendimentos, levando mesmo à uma redução, ainda que ligeira, da baixa taxa de poupança. Chamo também à atenção para a o aumento dos incumprimentos no crédito, o que confirma a irresponsabilidade de “famílias portuguesas” que andaram a viver acima das suas possibilidades. “Its payback time”, já dizia Lagarde.
Agora a sério porque a situação é tão séria num país de gente séria que até os moralistas andam mais discretos: na realidade, sabemos hoje que uma parte cada dia maior dos 40% de famílias que têm dívidas aos bancos, que eram geralmente das classes relativamente mais desafogadas, a tal parda média, tem agora problemas por causa da quebra de rendimentos gerada pela austeridade recessiva e pelo aumento do desemprego, como até o Banco de Portugal reconhece no seu último relatório de instabilidade financeira: “A evolução da situação financeira dos particulares foi marcada pela redução do seu rendimento disponível, associada à quebra das remunerações e das prestações sociais e ao agravamento da carga fiscal, e pela redução ligeira da taxa de poupança”.
A crise é mesmo “sistémica”, ou seja, é uma crise de um arranjo monetário e financeiro disfuncional. Apesar disso, o BdP, ideologicamente programado para enfatizar a “crise da dívida soberana”, continua insanamente “a apostar na concretização estrita do Programa”. Também convém passar discretamente a ideia de que os bancos são vítimas dos estados, os pobrezitos. Bom, o tal programa com p grande para um país com p pequeno, que se vai prolongar para lá de 2013, obriga precisamente um estado que não é soberano por construção monetária a comportar-se cada vez mais como uma família em crise. Isto quando estamos fartos de saber que tal não pode acontecer sem ameaçar cada vez mais as famílias realmente existentes com quebras de rendimentos e com a insolvência. E as empresas também. Este é apenas um dos muitos paradoxos da depressão gerada pelo esforço descoordenado por parte de todos os agentes económicos para poupar, comprimindo a procura, a actividade económica, os rendimentos e logo a própria poupança, que é o que sobra. E para um cada vez maior número não chega, nem sobra.
De resto, os bancos do centro e da periferia, que pressionaram para a adopção do tal “Programa”, estão também em muito maus lençóis, embora seja notável o desvelo público para com o sistema financeiro, sem contrapartidas que se vejam, ao contrário do que afirmam directores de jornais que mais parecem relações públicas da bancarrotocracia.
1 comentário:
Boa noite.
Em casa dos meus pais sempre se poupou e nos seguimos as pégadas.
Não vamos poupar na água para beber ou nos lavarmos , mas não queremos desperdiçar nada. Não temos extras mas quando havia emprego sabíamos que no fim do mês haveria alguma coisa.
Agora sem trabalho as economias serão de todo impossiveis.
Aqueles que chamam «piegas» aos portugueses deveriam ter dois anos de salário mínimo e ter que se bastar a eles e pagar as rendas....
Seria o fim do mundo...
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