quinta-feira, 27 de janeiro de 2011

Direita contra direita


A direita domina com grande mestria a arte de ser oposição a si mesma. Isto tem sido a chave dos seus sucessos eleitorais e continuará a ser enquanto não houver um número suficiente de pessoas que se aperceba da manha.

A direita quis um estado pequenino. Prometeu às “classes médias” que assim não teriam de pagar impostos. Muitos acreditaram, pensando que o Estado era só gordura e nenhuma produção e que teriam tudo a ganhar com o seu emagrecimento. A direita pediu e aplaudiu a austeridade, chorou por mais austeridade ainda com FMI em vez de governo. Muitos pensaram: “a austeridade só vai afectar os outros”.

Agora que a austeridade se começa a traduzir em incapacidade do Estado cumprir os seus compromissos e belisca interesses dos que pensaram que a austeridade só afectaria os outros - como sucede no caso do subsídio público às escolas privadas - a direita exercita movimentos de protesto ao estilo “tea party” com o aplauso dos políticos de direita. Mais episódios como este se seguirão, sem dúvida, dentro de momentos.

A austeridade recessiva, o tipo de consolidação do défice e da divida que não leva a lado nenhum, não pode deixar de suscitar protesto e resistência e bom seria que os economistas incorporassem esta variável nos seus modelos. Há, é claro, um protesto e a uma resistência que podem levar a algum lado: coesão europeia e consolidação pelo crescimento. Mas esse é o protesto que em toda a Europa tem como alvo a direita que aplaude a austeridade recessiva. Onde está essa direita? Em muitos sítios, mesmo em partidos ditos de esquerda. Mas há uma direita particularmente manhosa e perigosa a que é preciso estar atento agora mais do que nunca: a que representa o topo da pirâmide do rendimento e do poder económico, a que engordou no forrobodó financeiro, a que pensa tudo ter a ganhar com a via da austeridade recessiva e ainda por cima tenta cavalgar o descontentamento que essa mesma austeridade inevitavelmente origina.

Acrescento, para que não haja ambiguidades, que considero o corte nos subsídios ao ensino privado, onde não existe falta de oferta pública, inteiramente justificado e só não compreendo como é que isso não aconteceu há mais tempo. Parece-me também que se deveriam considerar, com cuidado, soluções de integração dos professores afectados na escola pública.

7 comentários:

Anónimo disse...

http://www.alternet.org/newsandviews/?id=449637&t=fancy_hollywood_types%2C_facebook_founders_give_rahm_emanuel_over_%2411_million_in_campaign_cash

Anónimo disse...

Bom texto.

Carlos Albuquerque disse...

E para quando uma esquerda que seja capaz de ser esquerda em vez de andar a implementar as políticas de direita?

Quando o PSD estava no governo os partidos de esquerda serviam de barreira a certas políticas. Agora com o PS no poder o PS está controlado e os sindicatos estão ineficazes. Se estivesse o PSD no poder será que o PS serviria de oposição?

O que é absurdo é que haja quem se diga de esquerda e ande politicamente de braço dado com os governantes que implementam as medidas de direita mais radicais desde o 25 de Abril.

Micael Sousa disse...

Parece que a concretização de certas e determinadas políticas, de esquerda ou direita, independentemente dos partidos que as apadrinham farão bem aos portugueses. Não para a melhoria da sua qualidade de vida, mas para a sua educação política. Talvez a diferença entre esquerda e direita seja agora mais tangível.

Anónimo disse...

Caro José Castro Caldas, e o problema da competitividade? A palavra é feia, mas o que ele indica é o problema central da economia portuguesa. O investimento público é sempre bom e multiplicador?
Eu não tenho dúvidas de que uma parte da chmada austeridade é virtuosa. Talvez fosse preferível distinguir diversos aspectos na consolidação orçamental e no crescimento. Há o bom e o mau. Ou não?


Jorge Rocha

Anónimo disse...

http://www.ft.com/cms/s/0/a37cf284-2543-11e0-93ae-00144feab49a,dwp_uuid=79cadde4-5c1b-11df-95f9-

Concordo. A Europa saudável é esta a do crescimento.


João Paz

Maquiavel disse...

O Carlos pös o dedo na ferida aberta!

O partido que mais políticas de direita implementou em Portugal foi... o PS! Começou com os contratos a termo e a invençäo dos salários em atraso, e por aí fora.

É verdade, isso que diz é absurdo, mas provém da cegueira de quem näo vê que o PS é, nos actos, de direita. Aliás, foi assim que foi apresentado num documentário da TV finlandesa, para que vejam!

E o que me interessa säo actos, e näo paleio.

Jorge, o investimento público nem sempre é bom e multiplicador, o mesmo vale para o privado. Depende mais de quem o implementa. O investimento público nos EUA e países nórdicos, por exemplo, tem-se mostrado bom e multiplicador, assim como o privado. Em Portugal, nem um nem outro.