As taxas de juro da dívida pública não cessam de subir nas periferias. As políticas de austeridade falharam: governar a pensar nos voláteis mercados dá sempre mau resultado. Depois da Grécia e da Irlanda, Portugal vê-se agora pressionado a recorrer à “ajuda” europeia e do Fundo Monetário Internacional. Ajuda é um eufemismo para uma nova ronda de políticas de austeridade, de maciças privatizações e de desregulamentação do mercado de trabalho, ou seja de baixa de salários e aumento do desemprego, como contrapartida para empréstimos a taxas de juro só ligeiramente mais reduzidas do que aquelas que os “mercados” cobram agora às periferias, mas muito mais elevadas do que aquelas que vigoravam ainda em meados de 2010.
O empobrecimento das periferias europeias é o que resultará da tentativa de garantir que as perdas dos credores, ou seja, dos bancos e investidores dos países centrais, os grandes detentores de dívida, são minimizadas, num contexto de pressões especulativas por debelar.
Como bem sublinhou Manuel Alegre, as forças conservadoras nacionais, coerentes com a sua história de favorecimento de relações internacionais de subalternidade e dominação, desejam o controlo das politicas públicas pelo bloco político que transformou a União num FMI. Sabem que um governo sob a tutela de funcionários de instituições internacionais que não são eleitos é a melhor forma de impor um programa político que a maioria dos cidadão não sufraga.
Que fazer? Resistir. Os países periféricos, na linha do que tem sido proposto por vários economistas críticos, devem avançar com uma auditoria à sua dívida, preparando o caminho para uma reestruturação por sua iniciativa. De qualquer forma, esta reestruturação é inevitável na ausência de mudanças no enquadramento europeu. Estas mudanças só poderão surgir precisamente se houver uma iniciativa diplomática concertada das periferias que use a arma dos fracos: não podemos pagar a estas taxas, vamos lá renegociar com transparência até porque há dívida odiosa (a auditoria revelará certamente mais submarinos e outras brincadeiras internacionais...).
Só com a ameaça credível da reestruturação, liderada por uma aliança de países, é possível introduzir as reformas europeias que urgem: emissão de euro-obrigações, mudança do papel do BCE, maior flexibilidade das regras do mercado interno para permitir políticas industriais de apoio a novos sectores económicos, maior controlo dos fluxos financeiros, um orçamento europeu que seja a contrapartida a essa escala da perda de instrumentos de política económica à escala nacional, harmonização fiscal, etc. Só assim se poderão debelar os desequilíbrios que este euro reforçou.
É necessário rejeitar os ditames das forças conservadoras nacionais e internacionais. Cavaco diz que não critica as pressões especulativas dos mercados financeiros. Cavaco não critica um sistema financeiro disfuncional criado pelo neoliberalismo e que está feito para gerar bolhas especulativas e crises financeiras acompanhadas por estoiros bancários e por muita venalidade. Cavaco recusa qualquer reforma do seu enquadramento. Percebemos bem porquê. Os interesses são uma força poderosa, sobretudo no mundo das finanças público-privadas.
Publicado no Arrastão
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