sexta-feira, 23 de março de 2018

Tradição, veteranos e democracia

Depois de em 2016 ter sido eliminada a «lide do novilho a pé e a cavalo», a Comissão Central da Queima das Fitas, em Coimbra, decidiu este ano, por unanimidade, «propor a abolição da garraiada como evento tradicional da festa». Perante a proposta, a Associação Académica de Coimbra e o Conselho de Veteranos (entidades que tutelam a organização da Queima) acordaram na realização de um referendo, a 13 de março. Os estudantes, que aparentemente não tiveram que «pensar muito, muito, muito, muito» no assunto, decidiram de forma esmagadora pela abolição da garraiada, com cerca de 70% dos votos a favor e 26% contra.

Sucede porém que o Conselho de Veteranos, em reunião ontem realizada, decidiu «manter a Garraiada Académica no programa oficial da "Queima 2018"», tendo 14 dos 27 membros votado nesse sentido e 11 contra (havendo ainda a registar 2 abstenções). Isto é, desprezando olimpicamente os resultados da consulta à comunidade estudantil que o próprio Conselho de Veteranos apoiou, apesar de ter dito aos alunos, numa nota publicada no facebook antes do referendo, «a tua opinião conta». Já a Direção-Geral da AAC, numa tomada de posição exemplar, assegurou que defenderá, até às últimas consequências, «a decisão democrática dos estudantes».

Podia o Conselho de Veteranos lamentar o resultado do referendo (sem deixar de o aceitar), invocando argumentos como a tradição ou os impactos, na indústria tauromáquica, resultantes da não realização da garraiada? Sim, podia, mas não era a mesma coisa (ou, como se diz em latim manhoso do google translator, «etiam, potestate poterat, autem non erat idem»).

5 comentários:

Anónimo disse...

Era conveniente revelar quem compõe a Comissão de Veteranos. Não sei porquê, ainda iremos ouvir falar dessas pessoas. E assim ficava desde logo composto o CV

Anónimo disse...

"«etiam, potestate poterat, autem non erat idem»

Triplos parabéns:
-ao autor da posta
-aos estudantes de Coimbra
-ao apontamento sobre Cristas, mais o seu «pensar muito, muito, muito, muito» no assunto. Revela muito do seu carácter. Mas também revela como é feita a política por este tipo de gente

Vitor disse...

Parece-me uma óptima experiência de aprendizagem em contexto real proporcionada aos estudantes de Coimbra. Aprendem que podem votar no que bem entenderem que no final as decisões que interessam acabam a ser tomadas pelo conselho de veteranos.

Assim como nós cidadãos Portugueses podemos votar no que bem entendermos (políticos nacionais, eurodeputados, etc) que as decisões que interessam acabam a ser tomadas por uma espécie de conselho de veteranos (Comissão Europeia e BCE).

Parabéns à Universidade de Coimbra por ter a coragem de proporcionar esta competência aos seu alunos pois é do mais importante que lhes podiam ensinar num país em que não se gosta de manter a população na ignorância sobre o funcionamento real da política...

Anónimo disse...

Ensinar?
Ó Vitor Aqui não se ensina ninguém. Exerce-se a democracia quer a universidade ou o conselho de veteranos queira ou não

Alice disse...

A democracia é muito boa, mas só se ganhar aquilo com que eu concordo. Pois sim, que rico exemplo vindo do Conselho de "Veteranos"(o que é isso, andaram na guerra?).