quinta-feira, 22 de março de 2018

São eles que dizem


O europeísmo, que ainda domina uma certa social-democracia desta forma em franco declínio no continente, é uma máquina de fabricar ilusões políticas, de resto altamente complementar com a máquina europeia de fabricar liberalizações económicas com profundos impactos políticos.

Há quantos anos andam, sobretudo a partir do sul, com a história da mudança na Alemanha, da qual dependeria sempre tudo, incluindo a última hipótese de reformar o euro? Agora é que é: a repetição do mesmo, ou seja, a coligação das duas alas do partido exportador alemão, produzirá resultados diferentes.

Entretanto, reparem na fraude que foi a ideia de que o aprofundamento da integração equivaleria a uma partilha da soberania, incluindo no decisivo plano da política económica. Creio que são cada vez menos os que têm o topete de repetir tal ideia.

Enfim, o novo Ministro das Finanças alemão, oriundo do politicamente moribundo e ideologicamente colonizado SPD, já veio dizer ao que vem e de forma bastante clara: “um Ministro das Finanças alemão é um Ministro das Finanças alemão, a filiação partidária não tem qualquer papel”. 

19 comentários:

Paulo Marques disse...

A única reforma da UE vai ser o colapso.

Anónimo disse...

Se alguém tivesse dúvidas, o novo ministro das finanças alemão reafirma assim claramente o primado dos interesses alemães sobre os da EU ou qualquer resquício de social-democracia.

E assim confirma a tese de Ashoka Mody em artigo na Vox:
"The euro area’s deepening political divide"
https://voxeu.org/article/euro-area-s-deepening-political-divide

E repare-se, trata-se de um economista muito longe de ser um "esquerdalho". Professor em Princeton, carreira no Banco Mundial, Director Assistente do Departamento Europeu do FMI, enfim, um homem do sistema. E no entanto diz:

"Today many hope that, spurred by French President Emmanuel Macron’s call for euro area reform, Merkel will work on repairing the euro area’s architecture. Such a hope is illusory. Merkel is all too aware that any sign of financial generosity toward Europe will embolden the rebels within the CDU. Other northern nations have made clear that they will oppose calls on their taxpayers (Rutte 2018, Finance Ministers 2018). No euro area nation state is willing to cede its national parliament’s sovereignty on fiscal matters. Policy decisions will remain disengaged from politics. Hence, even if new financial arrangements are engineered, it will be impossible to achieve accountability in euro area governance. Political tensions will continue to build."

O que implica que o caminho da desintegração está traçado. Resta planear para minorar os inconvenientes e preparar o inevitável. Quem se deixar iludir pelas ilusões europeístas pagará um alto preço pela sua credulidade.
S.T.

Jaime Santos disse...

Sim, e o que é que isso tem de mais? A política externa dos Países normalmente não muda muito, quem quer que esteja no Poder, e a política do novo Governo alemão é antes de tudo determinada pelo acordo de coligação, não pela personalidade em questão, mesmo se há, como sempre, nuances...

O João Rodrigues gosta de tomar os europeístas por ingénuos. Não, não somos, sabemos muito bem que a realidade é o que é. O que não nos deixamos é enrolar por quem faz do agit-prop uma profissão. Apresente uma alternativa séria e detalhada que permita que o nosso País saia do Euro sem grandes convulsões, não os chavões do costume que não são mais do que uma alavanca para a estatização de Economia e para acabarmos pior que a Venezuela. Porque se o que por lá se pratica é a soberania, por favor, venham as grilhetas de Bruxelas...

Está a ver? Amor com amor se paga...

Anónimo disse...

Já cá faltava a Venezuela... E o Zimbabwe? JS esquece-se do Zimbabwe.

Claro que se o agora aposentado Ashoka Mody, ex-Director Assistente do Departamento Europeu do FMI faz agit-prop, então quem é que é sério? Schauble, que nem sequer é economista?

Haja um minimo de pudor senhor Jaime Santos!

É óbvio que qualquer saida tem que ser negociada para evitar prejuizos maiores de parte a parte.

Agora enterrar a cabeça na areia e ignorar a inevitabilidade da desagregação do Euro é a pior das soluções porque nesse caso serão outros a ditar os tempos, e as condições que mais lhes convenham, o que seguramente não será em benefício do nosso país.
S.T.

Anónimo disse...

Jaime Santos fala em agit-prop?
E logo a seguir na Venezuela?

JS percebe aquilo que acaba por juntar? E que o elo de ligação entre estas duas coisas é o próprio JS?

Reduzido à Venezuela e a um amor que se paga?

Não é só a credulidade. É também um enorme vazio que rodeia já este europeísmo à procura da sua própria sobrevivência custe o que custar.

Sem olhar a meios e a tentar justificar as suas próprias grilhetas

Anónimo disse...

A desintegração é a consequência da inabilidade dos Europeus em responder aos problemas comuns. Políticas inviáveis sao processos de destruição com desfechos trágicos, a apatia perante tudo isto é um sinal óbvio de resignação, talvez seja esta a culpa que terão que transportar aqueles que desistiram antes de tentar.

Jose disse...

Um bom exemplo do que deve ser um ministro das finanças.

Anónimo disse...

Para este o único óbice de Salazar era não falar alemão

Fazia outras coisas como os alemães

Anónimo disse...

Há um erro inerente à frase de um comentador acima 23 de março de 2018 às 07:59

Diz ele:

"A desintegração é a consequência da inabilidade dos Europeus em responder aos problemas comuns."
De facto os problemas de alguns membros da zona Euro são o ganho de outros. Há uma assimetria entre países que lucram e outros que são expoliados como Kalder previra e Ashoka Mody confirma.

Não se pode escamotear esta assimetria.

À frase,
"talvez seja esta a culpa que terão que transportar aqueles que desistiram antes de tentar."

a resposta é que misturar interesses antagónicos não é boa ideia, e ainda mais extremá-los como os países do norte da Europa insistem em fazer:

"The single monetary policy continues to feed the economic divergence between northern and southern member states, which sustains and amplifies the political divisions."
(Ashoka Mody, ibidem)
S.T.

Anónimo disse...

Quando falo em problemas comuns falo por exemplo na desigualdade dentro de fronteiras e da indissociável relação credor/devedor e da sua consequente mutua dependência.

Não me parece credível que aqueles que defenderam e perpetuaram esta lógica insustentável sejam capazes de desenhar algo que altere o essencial como tal não me espanta o caminho no sentido da desintegração.

Vitor disse...

O problema é o Sul andar sempre a reboque da Alemanha, a tal postura do "bom aluno" em vez de se organizar e defender os nossos interesses. POrtugal, Espanha Itália, Grécia têm de se organizar e criar estrutras conjuntas para ter uma posição de conjunto forte no BCE que defenda os nossos interesses.
Por exemplo a metodologia de aferição da inflação é de extrema relevância...
Agora obviamente que isto exige trabalho, preparação, negociação etc (enfim trabalho) e nós ficamos à espera das posições da Alemanha e depois criticamos que não defendem os nossos interesse. Não pode ser, temos de apresentar as nossas posições que defendam os países do Sul e eles depois que as critiquem se conseguirem...

Anónimo disse...

Respondendo ao Vítor:

O que defende é um frentismo de países, que lamento mas vai ser muito difícil de concretizar.

A dificuldade reside na diversidade das situações que provoca clivagens fácilmente aproveitadas pelos corpos gerentes da Eurolândia.

Clivagens esquerda-direita entre os governos de Portugal e Espanha, clivagens de situação entre Portugal e Itália porque a Itália é um contribuinte liquido para o orçamento comunitário e Portugal recebe amis fundos do que paga, e subretudo clivagens dos interesses das respectivas elites compradoras que competem entre si mas têm poderosos interesses na manutenção do status quo.

Por isso só com a vitória de forças declaradamente eurocépticas em todos os países do Sul seria possível alinhar um bloco que desafiasse sériamente o sistema euro, o que, convenhamos, é bastante improvável que ocorra simultâneamente.

Depois há o factor inércia: Quanto tempo leva a substituir os membros do conselho de governadores do BCE?

Mas, mais importante, é que o problema não se situa (por agora) ao nível do BCE que até conseguiu impôr uma política monetária relativamente acomodatícia, mas ao nível da própria estrutura dos tratados que cria constrangimentos que os países do centro nada mais fazem do que explorar em seu benefício político e económico. E o número de países que "ganham" é superior ao dos que "perdem".

Por isso, o frentismo interpaíses não me parece que jamais resulte. E muito menos ao nivel do BCE, onde não teria qualquer influência sobre as políticas fiscais e orçamentais. Désolé!
S.T.

Anónimo disse...

O Euro é irreformável.

É uma questão de tempo apenas. Hoje alguém escrevia que o Euro é a moeda mais artificial de sempre e que as perspectivas do regresso a outra moeda estava ( ou devia estar) já nos planos dos Bancos Centrais para não serem levados na enxurrada.

A questão não é apresentarmos as nossas posições,o nosso caderno de encargos à Alemanha. A questão voa muito mais alto e exige outro tipo de atitudes. Tentar juntar interesses antagónicos no mesmo saco nunca deu bons resultados. Como se sabe "um Ministro das Finanças alemão é um Ministro das Finanças alemão". Tal deita por terra ( embora seja apoiada por alguns dos nossos germanófilos habituais) a conversa da treta da partilha da soberania, incluindo no "decisivo plano da política económica".

Muito levaram muito tempo a perceber que isto não conduz a nada. Muitos mais ainda persistem em tais ilusões. Os nossos interesses já não podem ser defendidos numa UE assim formatada, tanto mais que pura e simplesmente se estão nas tintas para nós. O que nos liga é apenas o verniz das aparências e as elites eurocratas interessadas nos seus poderes plenipotenciários

Anónimo disse...

Em relação ao anónimo de 23 de março de 2018 às 23:10

Lamento imenso frustrá-lo mas a "desigualdade dentro de fronteiras" não é um "problema" comum. Até porque não é acidental mas criada através de políticas específicamente desenhadas para isso. De facto, como diz, o caminho é o da desagregação, mas eu acrescentaria que se tratará de uma desagregação lenta, com a deterioração das instituições e a progressiva perda de qualidade de vida e degradação dos serviços públicos nos paises do Sul.

É triste, mas é nesse sentido que nos empurram os dirigentes dos partidos europeístas.
S.T.

Anónimo disse...

Acabo de ler um artigo genial que gostaria de partilhar convosco.

Eis um aperitivo:

"Se livrer pieds et poings liés à une puissance dominante, au mépris d’un capitalisme national, qu’il s’agisse des Etats-Unis, pour l’Amérique latine ou de l’Allemagne, pour l’Europe, ne fait qu’entraîner les nations déjà constituées vers une situation de type colonial dans laquelle les bourgeoisies ex-nationales se retournent contre leurs peuples."

Traduzindo:

"Entregar-se de pés e mãos atadas a uma potência dominante, desprezando um capitalismo nacional, quer se trate dos Estado Unidos para a América Latina ou da Alemanha para a Europa, não faz senão arrastar as nações já constituídas para uma situação de tipo colonial na qual as burguesias ex-nacionais se voltam contra os seus próprios povos."

E ainda:

"Ce détour par l’Amérique Latine révèle de manière empirique l’erreur fondamentale des idéologues de gauche qui prétendent que la sortie du capitalisme passerait par la destruction de l’Etat-nation."

Traduzindo:

"Esta digressão pela América Latina revela de maneira empirica o erro fundamental das ideologias de esquerda que advogam que a saída do capitalismo passaria pela destruição do estado-nação."

Está aqui:

https://www.les-crises.fr/la-france-vers-le-modele-colonial-latino-americain-par-philippe-chapelin/

Boa leitura!
S.T.

Anónimo disse...

De que adianta o estado-nação quando já não há mercado-nação? A meu ver esta é a verdadeira pergunta: a Europa vai se constituir como um bloco ou vai ser um mercado sob influência americana, russa ou chinesa? É claro que em qualquer sistema federal ou semi-federal as desigualdades internas persistem, ou mesmo se agravam. Mas continuo a não ver qualquer alternativa séria para um país pequeno como Portugal. É uma ilusão acreditar nas burguesias nacionais. O Brasil tem tudo para ser uma potência, e vejam o que são as suas elites. Aliás o sistema capitalista atual praticamente dispensa as burguesias, os intermediários. Alguém tem alguma ilusão de que os jovens querem ir para o exterior não só por razões económicas? A meu ver a União Europeia é um fato. Pode funcionar mal, ser reformada etc, mas voltar aos estados nacionais é uma quimera.

Anónimo disse...

Ó Pimentel Ferreira e que tal ir aprender um pouco mais sobre a realidade e sobre o que se discute?

As formas de pusilanimidade tèm várias colorações.

Como a ignorância.

As burguesias estão a desaparecer? Essa é de cabo de esquadra. Tal como o estado- nação ser definido pelo mercado-nação

Anónimo disse...

Pimentel Ferreira.

Talvez sob a pata Holandesa ou alemã?

Anónimo disse...

Qualquer estado-nação no planeta terra sofre as influências de todos os outros estados.

Em que medida sofre e exerce tais influências é ditado por muitos factores como a geopolitica, recursos naturais e humanos, escolhas e alinhamentos politicos dos seus dirigentes, etc., etc..

Falar dos sucessos ou fracassos deste ou daquele estado seria demasiado longo embora pudesse fornecer exemplos interessante e porventura frutuosos. Mas há um princípio que facilita a estabilidade de um estado-nação, que é a chatice e o gasto que estados vizinhos para o dominar contra as vantagens da convivência pacífica. Esse equilíbrio forjou-o Portugal com o seu 5X maior e mais poderoso vizinho, Espanha. Forjou-o também a Suiça, que ajudada pela geografia construiu um estado soberano que devido à eficácia do seu exército miliciano nem Hitler ousou desafiar. Um terceiro exemplo foi a Finlândia, que defendeu bravamente a sua independência da Rússia Soviética na Guerra de Inverno.

O ponto comum a estes três exemplos é a "chatice" que dá dominar um povo que quer ser independente. O tamanho relativo dos países é quase irrelevante. Quantas vezes maior era a Rússia Soviética do que a Finlândia? E quantas vezes maior é Angola do que Portugal e quantos anos teve que lutar pela sua independência? O tamanho e até as vantagens tecnológicas são em grande medida irrelevantes quando comparado com a determinação de um povo.

As burguesias nacionais são o que o contexto social e político cria ao longo do tempo. Os seus interesses podem ser moldados por um estado forte que saiba criar os incentivos correctos para a prosperidade do país. A qualidade das instituições, e o vigor do debate politico são os melhores trunfos para combater a captura do poder por elites compradoras.

A União Europeia não é reformável. No actual estado de crispação será impossível construir os consensos necessários em torno de ideias claras porque as narrativas prevalecentes em cada um dos países pouco ou nada têm em comum. E lembremo-nos que os tratados só podem ser alterados por unânimidade. Acham mesmo que conseguem pôr de acordo 28 estados com interesses conflituantes, com 24 línguas diferentes em relação às reformas necessárias? LOL Não me gozem!

Por último, a dimensão dos mercados não é ditada pela dimensão dos estados. Existem umas coisas chamadas computadores, que calculam fácilmente taxas de câmbio; e uma coisa chamada pagamentos SWIFT. Qual é o problema?
S.T.