segunda-feira, 12 de agosto de 2024

Dever da esperança


Catarina Coutinho é uma professora da Amadora, orgulhosa da sua terra, que encarna no Twitter e fora dele, estou certo, embora não a conheça, os melhores valores da escolha pública. Valoriza e visibiliza a generosidade e a empatia, as motivações intrínsecas, sem as quais não há progresso cognitivo e moral: “as boas pessoas salvam”, realmente.   

Tive algumas professoras assim, felizmente, na Martim de Freitas, em Coimbra, e o meu filho também as tem na mesma escola pública. Há muita desesperança pública na escola, mas depois há paredes luminosas pintadas por pessoas boas e que tornam a escola pública de hoje melhor do que era no meu tempo. E, já agora, os professores que tenham perdido a esperança na juventude e no progresso estão perdidos. Isto também vale para a universidade, bem sei. 

Por vezes, discordo do ecumenismo à esquerda de Catarina Coutinho, até porque há clarificações políticas que são necessárias e urgentes. No entanto, prefiro enganar-me com ela do que acertar com o padrão oposto, por vezes presente num certo Twitter elitista, que se julga de esquerda: Portugal é um país racista e os portugueses de todas as idades são, em geral, irrevogavelmente incultos e más pessoas. 

Esquece-se uma lição política fundamental quando se escreve desta forma: nunca se insulta o povo, nunca se generaliza a partir dos piores exemplos. Bem sei que o algoritmo quer que assim pensemos, mas temos a obrigação de ser mais luminosamente capazes de ir à raiz, olhando e vendo à nossa volta. 

A esquerda que conta cultiva a esperança no país e nos seus concidadãos e tem o dever do orgulho nas melhores e mais rebeldes tradições plebeias, sempre por redescobrir e reinventar. 

Uma pessoa com rugas belas e que me influenciou muito costumava dizer, com paciência sábia perante os meus juvenis arrufos, tão arrogantes quanto imaturos: “sim, camarada, mas não te esqueças que o 25 de abril foi feito por este povo”. 

É preciso então repetir: o pior é minoritário, tem de ser, na dúvida é sempre, a maioria invisibilizada faz o melhor de que é capaz nas circunstâncias que são as suas, sendo a tarefa da ação coletiva humanizar essas circunstâncias e desenvolver essas capacidades, como não me canso de repetir. 

Como disse alguém: “repetir, repetir, repetir sempre e quando estás farto de repetir é quando as pessoas começam a prestar atenção pela primeira vez”. Há tantas coisas que merecem a nossa atenção e nós somos só humanos. 

É a cooperação que nos salva e esta requer motivações adequadas, esquecei os economistas desatualizados. E há tanta cooperação invisibilizada por aí. Sem cooperação, a barbárie já teria triunfado definitivamente. E nós cremos ainda, e é de crença que se trata, não tenhais medo da palavra, na hipótese do socialismo

Temos então o dever da esperança na chamada bondade de estranhos, tudo o resto são nocebos.

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