Sabemos que as mulheres, essencialmente por razões biológicas e sociais, têm uma esperança de vida superior à dos homens. Tal como sabemos, neste que é um dos indicadores demográficos elementares, que a esperança de vida nos países ricos supera a dos países pobres. Uma declinação deste dado muito menos comum, porém, é a que o procura aferir em função das desigualdades sociais. Isto é, estimar a esperança de vida entre os segmentos mais pobres e mais ricos da população.
Foi esse cálculo que o Libération divulgou recentemente para o caso francês, dando eco de uma estimativa do Insee, relativa a 2018 (e a que cheguei através da Maria João Pires). Por mais que tenhamos a intuição de que os pobres vivem pior (e por isso menos), o resultado obtido para o caso de França, um país desenvolvido, é um murro no estômago: à idade legal de entrada na reforma (62 anos) - 25% dos franceses mais pobres já tinham falecido, caindo esse valor para «apenas» 5% no universo dos franceses mais ricos.
De facto, do mesmo modo que a redução das taxas de mortalidade infantil não resulta apenas da democratização do acesso a cuidados de saúde, mas também da melhoria generalizada das condições de vida (como sucedeu no caso português depois do 25 de Abril), são também as condições de vida (trabalho, rendimentos, habitação, etc.) que ditam as diferenças, em termos de esperança de vida, entre ricos e pobres.
Seria por isso muito interessante que o INE pudesse replicar, no nosso país, esta estimativa realizada pelo Insee em França. Aliás, melhor ainda, que o Eurostat cuidasse de recolher e sistematizar a informação necessária para aplicar o respetivo cálculo a todos os Estados membros da UE, permitindo assim comparações a essa escala. É que as diferenças na esperança de vida dos ricos e dos pobres constituem porventura um dos melhores indicadores para aferir as desigualdades sociais de um dado país (e a sua evolução), mas que tem sido, de facto, ignorado.
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3 comentários:
É de facto um resultado impressionante e haveria todo o interesse em que o INE replicasse o estudo. Mas, ao selecionar apenas os 5% mais ricos e os 5% mais pobres, o resultado teria que ser necessariamente extremado. Tal como o seria, ainda mais, comparar a esperança de vida dos 1% mais ricos e dos 1% mais pobres; e tal como seria menos a comparação, por exemplo, entre os 10% ou 20% mais ricos e os 10% ou 20% mais pobres.
A própria idade de reforma, tomada como justa referência, perde um pouco o sentido. Não tanto por causa dos mais ricos, embora bastantes destes certamente não trabalhassem, vivendo apenas de rendimentos de patrimónios e capitais, próprios ou familiares, designadamente dos cônjuges. Mas sobretudo por causa dos mais pobres (dos mais pobres) da população, que, cingindo-nos aos 5%, em enorme medida não trabalhará, subsistindo graças a apoios do Estado, familiares ou de caridade pública. Nele se incluirão situações de grande desamparo e degradação social (toxicodependentes, doentes mentais, incapacitados, sem abrigo, etc.) que, com uma esperança de vida muito curta, inferior à de camadas trabalhadoras ou um pouco menos pobres, reduzem ainda mais a esperança de vida para o respetivo segmento.
Concordo com uma análise do mesmo género, que seria oportuno realizar no nosso país, agora que a idade limite para a reforma foi fixada num valor inferior de 66 anos.Por esse facto,das diferentes idades em que os vários países europeus estabelecem as idades de reforma não resultaria, a meu ver, alguma vantagem numa análise comparativa global.O que seria de relevo seria estabelecer a relação entre o rendimento do trabalho,dependente ou independente e o valor da reforma e o número de anos em que foi paga,até ao final da vida do reformado ou aposentado.
Um gráfico que levanta várias questões. Uma está em saber se a idade da reforma deve ser a mesma para todas as profissões.
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