Algumas fracções do capital terão sempre lugar garantido no tal contrato que rompe o laço social, claro. Os pobres podem esperar migalhas da mesa, já que as selectivas políticas para pobres são sempre pobres políticas, políticas residuais desenhadas para perpetuar as desigualdades, a pobreza, a punição e todos os preconceitos de classe, ao contrário das políticas universais, que são as únicas decentes porque com potencial político redistributivo. De resto, reparem na consistência global de um dos ideólogos da vitoriosa estratégia de redução dos salários. Pouco interessa que o diagnóstico seja inválido. O que interessa é alcançar a hegemonia. Esta é facilitada por um dualismo que procuro descrever em artigo publicado no Le Monde diplomatique – edição portuguesa:
Registou-se um dualismo cada dia mais insustentável: a liberalização e a privatização foram acompanhadas e legitimadas por uma desigual modernização dos padrões de consumo, oleada pelo endividamento entre os grupos mais desafogados, e pela manutenção do Estado social, mesmo que ainda longe dos padrões europeus. A variedade medíocre de capitalismo que se consolidou, puxada pelo euro, é incompatível com o Estado social e são agora poderosas as forças sociais nacionais e europeias que querem resolver esta incompatibilidade através da destruição do último, em vez de se modernizar a economia, o que requereria outro enquadramento europeu.
Registou-se um dualismo cada dia mais insustentável: a liberalização e a privatização foram acompanhadas e legitimadas por uma desigual modernização dos padrões de consumo, oleada pelo endividamento entre os grupos mais desafogados, e pela manutenção do Estado social, mesmo que ainda longe dos padrões europeus. A variedade medíocre de capitalismo que se consolidou, puxada pelo euro, é incompatível com o Estado social e são agora poderosas as forças sociais nacionais e europeias que querem resolver esta incompatibilidade através da destruição do último, em vez de se modernizar a economia, o que requereria outro enquadramento europeu.
A conclusão é clara: este euro é o outro nome da derrota histórica de um projecto de desenvolvimento inclusivo, da derrota do mundo do trabalho organizado, da derrota da esquerda.
8 comentários:
Infelizmente, não vejo traduzido no discurso político dos partidos mais à esquerda a afirmação clara de que é necessário ponderarmos a saída de euro, se a Europa continuar por este caminho...
foi muito bonito, gostei das cadeiras
A saída parece ser inevitável... Tem razão (aparentemente) o José M. Sousa quanto à ausência de afirmação clara da saída por parte da esquerda. Isso porque ainda vislumbram alternativas dentro do Euro. Se sim, ninguém as discute. Essas e cenários de saída. Para mim, deviam ser discutida a CPLP como Plano B...
As crises financeiras já têm mais de um século (lembrar a 1929), ainda antes do capitalismo ter atingido a sua máxima força.
É necessário distinguir entre finança e economia, não obstante a sua interpenetração. A primeira tem o seu foco no dinheiro e é controlada pelos bancos (um monopólio bancário, de facto). A segunda tem a ver com produção e distribuição e tem o seu foco nas famílias, empresas e Estados.
As «crises financeiras» são deliberadamente criadas pelo monopólio bancário que, primeiro por inflação, injectando dinheiro na Economia, depois por deflação, retirando dinheiro da Economia, se vão apoderando da riqueza criada pelas famílias e empresas.
Mas o capitalismo está cada vez mais sob fogo cerrado devido à evolução tecnológica: a máquina está num crescendo a substituir o homem no trabalho. Donde resulta que há cada vez mais desemprego e, portanto, menos salários, menos poder de compra, menos vendas e menos produção. O caminho será inevitavelmente o fim da propriedade privada dos meios de produção. As empresas, cada vez automatizadas, serão pertença das comunidades. E a Banca deixará de fazer sentido.
Saír do Euro e ficar "orgulhosamente só", entre o Atlântico e a Espanha, como? Com uma governação neo-libral histérica como a que temos agora? Ou há uma fórmula milagrosa de saírmos do Euro com um governo de esquerda, que milagrosamente também nos conduzir à felicidade, apesar da solidão?
Vítor Bento foi promovido pelo Banco de Portugal, estando 8 anos com licença sem vencimento. O próprio BdP fundamentou a decisão de promover Vítor Bento a partir de 1 de Janeiro de 2008 por "critérios de gestão e equidade interna".
Depois desta afronta, é caso para perguntar: mas que moralidade tem esta figurinha para pretender traçar o destino deste país e do seu povo, e vir para aqui falar em “bolos, partilhas, migalhas e equidades”?
A luta de classes está mais acesa do que nunca. Ou nós ou eles.
«If there were an easy exit from the Euro, Greece would be gone already. But Greece is not Argentina with soybeans and oil for the Chinese market, and legally exit from the Euro means leaving the European Union. It’s a choice only Germany can make. For the others, the choice is between cancer and heart attack, barring a transformation in Northern Europe that not even Socialist victories in the next round of French and German elections would bring.» James K. Galbraith
Há um medo tremendo em encarar essa possibilidade, por ignorância e receio dos efeitos que essa mudança poderia ter na nossa Economia...O que nos leva à conclusão de que a maioria -se não a totalidade- dos intervenientes na discussão destas questões, estão a trabalhar em terreno pouco seguro, a Economia está quase num patamar semelhante ao da Filosofia...Teoria e mais teoria, alguma fé e muita ideologia política...Quem é de direita acredita cegamente no empreendedorismo e nas capacidades e virtualidades do mercado livre e odeia organicamente "o aparelho" de Estado, a não ser quando o sistema entra em crise, aí, vai a correr colocar-se debaixo do manto protector das receitas Estatais e derruba tudo à sua frente.
Quem é de esquerda como eu desconfia por princípio do mercado completamente livre e desregulado e crê muito mais na planificação da Economia...
Enviar um comentário