sexta-feira, 19 de fevereiro de 2010

Espectros

Há um espectro que persegue de novo o mundo do capital financeiro – o espectro da taxação das transacções financeiras. Em 1978, o economista James Tobin, que haveria de ganhar o prémio Nobel, propôs que se aplicasse um imposto modesto sobre as transacções nos mercados internacionais de divisas com o objectivo de reduzir a instabilidade cambial. Tobin limitou-se a aplicar aos mercados cambiais o argumento que Keynes tinha desenvolvido, nos anos trinta, para o mercado de acções. O número de crises financeiras mais do que triplicou desde os anos setenta, quando comparado com o período dos “trinta gloriosos anos” do pós-guerra marcado pelo maior peso da banca publica ou pela existência de controlos generalizados à circulação de capitais.

No entanto, durante o regime neoliberal, o espectro das taxas Tobin e Keynes sempre foi eficazmente esconjurado por uma santa aliança de reguladores, economistas e financeiros. A hipótese dos mercados financeiros eficientes era o seu cimento intelectual. A realidade encarregou-se de a desfazer e de recuperar a hipótese alternativa da instabilidade financeira, indissociável da finança liberalizada, defendida por economistas marxistas, institucionalistas e keynesianos. Precisamente 350 economistas de 34 países – de José Reis e João Ferreira do Amaral a Joseph Stiglitz e Ha-Joon Chang – subscreveram um apelo a favor da taxação das transacções nos mercados financeiros (via The Robinhood Tax). Até Gordon Brown, que durante mais de uma década foi um acérrimo defensor dos interesses da City de Londres, defende a adopção de uma taxa Tobin. Será desta que temos novidades? Afinal de contas, quantas mais crises financeiras teremos de aguentar até que se comece a reformar a sério o sistema financeiro à escala nacional e internacional?

[Publicado, originalmente, no Arrastão]

2 comentários:

Bruno Silva disse...

É mesmo ironicamente engraçado como o discurso eloquente da esquerda consegue chutar para a direita os resultados das suas próprias falhas.

Não obstante o "crime" que originou a crise foi de origem privada (qual o sistema que não tem crimes de origem privada?), a ocasião que criou o ladrão foi claramente mãozinha pública.. a bolha especulativa no mercado imobiliário não foi causada por "animal spirits" mas sim pela má política da FED, da Fannie Mae e do Freddie Mac... Apesar do Greenspam ter tentado iludir este facto com um discurso de redenção, esta é a verdade.. mas, curiosamente (e nisto é que o poder burocrático é fantástico), os reais causadores da crise vêm agora pedir mais poderes para regularem os mercados, esses bichos malditos... enfim...

Em Portugal temos um novo exemplo deste poder.. com a clara verificação de subsídios injustamente dados pela Segurança Social, o que foi decidido? Optimizar o sistema? não... contratar mais 60 fiscais.. ou seja.. se cada uma custar ao estado 20.000€/ano, dá um custo total de 1.200.000 €.. pergunto.. será que o trabalho destes vai ter um impacto positivo nas contas? hmmm. duvido muito...

E cá andamos na república das bananas.. sem competitividade.. mas, segundo os senhores deste blog, com uma enorme capacidade de cobrar impostos, endividar e dar subsídios a tudo o que mexe, ou direi.. que não mexe.. uma palha...

JP Santos disse...

Pessoalmente, penso que não sempre mas em determinadas condições (como o FMI parece estar agora finalmente a reconhecer) os controlos de capitais podem ser um instrumento útil senão mesmo necessário e defendo a tributação dos ganhos especulativos, mas sempre tive um problema com a taxa Tobin. Porventura por falha minha nunca fui capaz de compreender as suas virtualidades, para além do aumento da receita fiscal (que admito possa não ser despecienda), já que para mim não é nada evidente que essa taxa conduzisse a uma redução da instabilidade cambial.