quarta-feira, 1 de julho de 2009

Para a história da neoliberalização do Estado

«A venda da rede básica de telecomunicações à Portugal Telecom (PT) por 365 milhões de euros, quando o valor contabilístico da mesma era, à época, de 2,3 mil milhões de euros, foi uma das formas encontradas por Ferreira Leite para controlar o défice português em 2002». A notícia do jornal i serve para lembrar que o Estado predador não é monopólio da esquerda dita moderna. É monopólio do bloco central. Através de irresponsáveis privatizações, este tem consolidado um «regime de acumulação por expropriação» dos recursos públicos gerador de corrupção. A actual UE apenas criou a estrutura de constrangimentos ideal para estas opções. No dia em que Dias Loureiro foi constituído arguido, não nos esqueçamos que tudo começou com o cavaquismo. A história da neoliberalização do Estado português está por fazer. Quem se oferece para a escrever? Quem se oferece para lhe colocar um ponto final?

12 comentários:

Anónimo disse...

na mouche, meu caro

JOSÉ LUIZ FERREIRA disse...

Então, se bem entendi, ao privatizar a rede básica de telecomunicações, Ferreira leite roubou 193,50 € a cada português; a ao nacionalizar o BPN, José Sócrates roubou a cada português 255,00 €.

Se a roubalheira funciona nos dois sentidos, isto é, tanto se pode roubar nacionalizando como privatizando, parece-me que a propriedade privada é um direito de que só gozam os ladrões.

Mário Moniz disse...

José Luiz.
Pode parecer demagógico ou falacioso, mas não é.
É mesmo verdade!
E se falarmos das situações em que quem foi generosamente indemnizado pelas nacionalizações utilizou essa indemnização para readquirir direitos, nas privatizações, por preço abaixo daquela, ao mesmo tempo que beneficiava de incentivos fiscais, ainda estaremos a falar de situações mais manhosas.
Aguardemos por quem queira fazer a tal história do neoliberalismo em Portugal.
Ou então "parta-se a loiça" já.

Ricardo Castro disse...

São estes comentários que confirmam, quotidianamente, que de facto existe um grande paradoxo na sociedade portuguesa: nomeadamente em todos aqueles que defendem abertamente um papel social e economicamente relevante para o Estado.

Eu faço parte desse grupo. Portanto também luto para resolver este paradoxo.

Acredito na importância do Estado como meio de equilibrar as sociedades, mantendo-as dentro de níveis de coesão razoáveis.

Embora não exista um valor quantificável para este "razoáveis", posso tentar descrevê-lo: a partir de uma certo nível de coesão (monetária e também social) a sociedade gera confiança em si própria, os cidadãos passam a acreditar uns nos outros e começam a aumentar os níveis de cooperação, estabiliza-se uma qualquer estrutura ética, cria-se um ambiente mais previsível, e, a partir dessa situação, a sociedade é capaz de gerar algum desenvolvimento sustentado. Os resultado intermédios são fulcrais para reforçar este ciclo.

(Um excesso de coesão gera outro tipo de problemas, mas esse assunto deixarei para outra altura)

Acontece que o nosso Estado tem sido muito activo desde sempre. A decisão de vender a rede da PT e de injectar dinheiro nos bancos foi do Estado. Deste Estado. Também foi ele que desenvolveu a prática autárquica, a justiça, os estádios de futebol, que não é capaz de controlar as suas contas, nem os seus projectos. Os exemplos de más práticas são muitos. E os resultados do país com um estado sempre a crescer não são brilhantes.

Aqui está o paradoxo. O falhanço deste nosso estado é notório, mesmo assim continuamos a defender que seja o estado a orientar os destinos económicos do país.

Faz sentido? Faz. Mas há muito a resolver na realidade concreta. Caso contrário esta posição será a prazo completamente desacreditada.

C. disse...

MFL já deixou bem claro que o seu programa será "restringir o Estado ao mínimo" (sic) e "apostar no empreendedorismo" como solução para o país (sic).
Mas não é por isso que votarei PS!
Apesar de tudo, prefiro um ladrão que diga a verdade do que um polícia mentiroso.
Só espero que desta vez o Garcia Pereira chegue à AR.

Diogo disse...

O Estado predador é apenas um agente dos banqueiros. É para estes que aquele trabalha. Quem são hoje os verdadeiros donos da Portugal Telecom?

Oscar de Lis disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Anónimo disse...

Concordo com o Ricardo Castro em que a perversão das práticas não desvirtua necessariamente o conteúdo da teoria. Se a teoria é boa (e eu também pertenço ao grupo dos que defendem que é) e a praxe é nefasta, o que se detecta é uma, no mínimo, ineficácia visível dos agentes. E nessa ineficácia, o clima pode ter muito a ver. Pois, há dous pontos já para intervir.

Cumprimentos

Marco disse...

Algum dos autores - ou visitantes - do blogue me pode indicar um trabalho de sintese, sério, onde se analise o desempenho económico de experiencias alternativas de produção, sejam elas dominantes como nos paises de Leste, sejam em "contra-ciclo" como as UCP,s portuguesas ou os kibutz?

Muito obrigado


marcoliberato@hotmail.com

Ricardo Castro disse...

Marco,

não sou economista e não conheço muitos estudos desta área.

Contudo gostava que fosse mais preciso com o quer dizer com "experiências alternativas de produção"?

Mais estado, menos estado? Ou outra coisa, que passa ao lado deste debate?

croky disse...

Caro Ricardo. Acho que devia parar para pensar neste ponto:

"estabiliza-se uma qualquer estrutura ética"

É desta estrutura ética que dependem as expectativas de uma sociedade. O problema é que as nossas expectativas são, acima de tudo, monetárias. O indivíduo é moldado por um sistema que privilegia o materialismo físico e intelectual, assim como o individualismo alheado do todo.

Quando a estrutura ética de uma sociedade for moldada, em primeiro lugar, pela necessidade do bem-comum então terá um "crescimento sustentado". Temos ciclos, nada pode ter um crescimento sustentado.

Ricardo Castro disse...

Croky,

o que eu acredito é no seguinte: quando uma qualquer política resulta e surgem resultados notórios, a estrutura ética que a suporta ganha uma capacidade de replicação tal que, a prazo, torna-se dominante.

Quando isso acontece aumenta a operacionalidade da sociedade em termos colectivos. Sem esse núcleo a sociedade torna-se numa tal manta de retalhos que é incapaz de se auto-governar. Porque não partilha interesses.

É uma manta de retalhos com bolsas de organização interna. E cada grupo organizado procurará defender apenas a parte que lhe toca. Tal como acontecia com as tribos. Isso já está a acontecer aqui, no nosso país.

Entenda-se que o contrário e bom não é a homogeneização. Também aqui existe uma certa amplitude, mas é necessário maior equilibrio entre os interesses individuas e colectivos.

A verdade é que as pessoas defendem sempre os seus interesses em função da realidade que observam e das suas espectativas, ambas são geradas a partir da sua ética.

Mas numa realidade já retalhada as espectativas imediatas serão muitas vezes incompatíveis com as necessidade do todo. Cada grupo cria o seu próprio sistema de avaliação, que partilha e é diferente do sistema aplicado pelos outros grupos. Mesmo que a ética seja a mesma. Isto é, mesmo que partilhem mais qualquer coisa de substancial, não acreditam na palavra dos "fora do grupo". Esse é mais um problema associado à falta de confiança.

O que é importante com a criação de confiança nas sociedades, é o facto da confiança permitir estabelecer uma relação mais estreita entre os interesses individuais. Não é possível transformar o ser humano e nós movemo-nos pelos nosso próprios interesses, mas podemos associar o interesse individual ao interesse colectivo. Quantas mais pessoas fizerem essa associação maior é a coesão, maior pode ser a capacidade para as pessoas criarem objectivos comuns e maior será a capacidade para colaborarem,
maior pode ser a capacidade para promover políticas que equilibrem a sociedade.

É a partir daqui que podem surgir alguns resultados, sejam ao nível social, económico, político ou cultural. O que interessa é que esses resultados estejam abrangidos pela estrutura ética dessa grande maioria. Só assim serão avaliados como bons. Só assim geram ciclos de confiança-resultados.

E isso depende da conversação social interna. Também não podemos continuar a importar a maior parte das nossas medidas e sistemas de avaliação, porque eles nem sempre estão de acordo com as nossas espectativas. Criando com isso um sistema altamente perverso.