A decisão sobre a data de reabertura das escolas é política, e não técnica, mas o governo tem bons argumentos técnicos para contrariar os dois peritos que recomendam manter escolas do ensino básico fechadas até à Pascoa. Haja coragem.
O Governo tem 10 razões para abrir as escolas do ensino básico na próxima semana, ao contrário do que sugeriram os peritos no Infarmed.
1. Baixo risco, enormes ganhos. Cruzando o risco da reabertura das escolas com o impacto social do seu fecho, os ganhos são evidentes e reconhecidos pelos peritos que estiveram no Infarmed. Não se compreende por isso que o seu plano de desconfinamento reabra o ensino básico em simultâneo com as esplanadas dos cafés e restaurantes.
2. Abrir tudo complica avaliação. Reabrir escolas do ensino básico (entre os 6 e os 12 anos) ao mesmo tempo que as esplanadas e o comércio em espaços fechados é não só chocante numa ótica de prioridades, como é contraproducente num desconfinamento que se pretende gradual e experimental. Como dissociaremos o impacto de cada setor nos contágios?
3. Incidência reduzida. O número de casos acumulados em 14 dias por 100 mil habitantes é já inferior a 120, que é o limiar proposto pelos especialistas para se passar ao nível 3, que reabre escolas do ensino básico. Não há critério epidemiológico para adiar a reabertura por duas semanas.
4. Caso único na Europa. Portugal tem o mais baixo nível de incidência de covid-19 e o menor R(t) de toda a UE. É também o único país que mantém todas as escolas fechadas desde 22 de janeiro.
5. Critérios draconianos. Na Europa, só Portugal e a Dinamarca é que cumprem o critério dos peritos de menos de 120 casos para a reabertura das escolas do ensino básico.
6. Metas irreais. Portugal tem agora 118 casos por 100 mil habitantes, mas a curva dá sinais de querer achatar e o R(t) sobe há duas semanas. Não é crível que o país consiga reduzir muito mais os contágios, como não conseguiram a Alemanha ou o Reino Unido com confinamentos idênticos. Assim, dificilmente cumprirá a meta para abrir escolas aos maiores de 12 anos. Ficariam assim fechadas todo o ano letivo.
7. Experiência passada. Quando arrancou o ano letivo, Portugal já estava acima da fasquia dos 60 e um mês depois passava os 120, que é onde começa o quarto nível de risco que prevê fecho das escolas do
ensino básico. Apesar disso, o primeiro período decorreu com normalidade e sem surtos relevantes nas escolas.
8. Mudança de critérios. Os dois peritos consideram risco elevado 120 a 240 casos, rompendo com as anteriores categorias e com os critérios do ECDC, que consideram esse nível de risco moderado.
9. Há tempo para preparar reabertura. Não são precisos muitos dias para preparar o regresso dos alunos. Além disso, o Governo pode antecipar o anúncio já para amanhã quando se reunir com os parceiros sociais e a reabertura pode ser feita só no dia 17, quarta-feira, quando entra novo estado de emergência em vigor.
10. Aumento de circulação é contido. Reabertura não implica grande aumento de circulação de pessoas. Olhando para os dados de mobilidade do Google, conclui-se que as deslocações baixaram pouco com o fecho das escolas e que a principal descida resultou do confinamento geral, iniciado uma semana antes.
Manuel Esteves, 10 razões para reabrir já as escolas, Jornal de Negócios, 10 de março de 2021.
2 comentários:
Caro Joao Rodrigues:
Ponto por ponto:
1) O risco nao e baixo. Mas de resto concordo com este ponto 1. Partilho em particular a perplexidade com a recomendacao de abertura simultanea das escolas com outras actividades sociais.
2) Subscrevo integralmente.
3) Concordo.
4) E de uma estupidez irremediavel, ao fim de mais de um ano, alguem ainda ensaiar o uso da incompetente e incapaz Europa para algo mais do que aprender com os erros dos outros ou ilustracao ao vivo e a cores de uma gestao profundamente descoordenada e incompetente desta crise.
5) Vide 4
6) Pior que metas irreais, sao accoes baseadas em "wishful thinking". Repito-me, as vezes que for necessario: Quem reclama querer equilibrar saude publica com economia/sociedade/educacao e nao acautela a manutencao do valor R sustentadamente abaixo de 1, nao equilibra nada.
7) A experiencia passada e precisamente o que deveria aconselhar cautela agora. Aquilo que se passou em Portugal no Outono de 2020 foi um previsivel e previsto "train wreck" em camara lenta.
8) John Maynard Keynes: 'When the facts change, I change my mind - what do you do, sir?'
9) Concordo.
10) Afirmacao temeraria. Nao tem informacao suficiente para afirmar isto de forma tao assertiva.
Uma ultima nota: na minha modesta opiniao, agora que Portugal finalmente tem informacao mais solida a indicar um valor R firmemente abaixo de 1. A reabertura das escolas, comecando pelas faixas etarias mais jovens deveria ser planeada e implementada cautelosa e gradualmente. Sempre com um olho no que se esta a passar com o R e com os dados de mobilidade/interacao social.
A continua tendencia dos grupos que advogam a reabertura das escolas para minimizarem o impacto e consequencias que a reabertura tera na epidemia deixam-me profundamente temeroso de que este planeamento e cautela se concretizarao.
Ha sectores da opiniao publica portuguesa que insistem em analises superficiais e pueris da situacao pandemica. Com os atrasos na vacinacao, a reabertura das escolas, que, concordo, e prioritaria, significa que para compensar e evitar a subida do R acima de 1, importantes porcoes de actividade social/economica sejam sacrificados.
Valores de R sustentadamente acima de 1 significam eventual confinamento. Tanto mais severo e prolongado quanto mais tempo se deixa correr a situacao.
Subscrevo o comentário de Lowlander. E acrescento ao texto uma décima primeira razão que coloca seriamente em dúvida até as "compreensíveis" elencadas no post. É ler: https://www.princeton.edu/news/2020/09/30/largest-covid-19-contact-tracing-study-date-finds-children-key-spread-evidence
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