Fonte: Serviços de Estrangeiros e Fronteiras |
O candidato da extrema-direita está assustar aqueles que não votam nele, mas - curiosamente - também assusta aqueles que dizem apoiá-lo.
Vai se conhecendo cada vez mais casos de pessoas da classe média brasileira que já chegaram a Portugal e que afirmam votar Bolsonaro, mas que acham que a situação no país é tão insustentável que preferem abandonar o país e vir viver para a Europa. Na semana passada, os pedidos de nacionalidade portuguesa de residentes no Brasil entupiram o consulado português de S.Paulo, ao subir 30% face ao mesmo período de 2017. Esta fuga está a gerar anti-corpos em Portugal: essas pessoas procuram as vantagens de um Estado Social (com educação, saúde, transportes, segurança, etc.), em muitos casos sem que tenham descontado para ele - porque vivem em Portugal de rendimentos gerados no Brasil - embora estejam contra a consolidação de um Estado Social no Brasil.
O que se está a passar? Ver-se-á de que forma um uso abusivo da lei - não controlado pelas autoridades nacionais - lhes pode conceder uma vantagem que os faz evitar trabalhar durante cinco anos em Portugal para conseguir ser portugueses na plenitude dos seus direitos.
Número de pedidos: Sim, é verdade, o número de pedidos de nacionalidade por brasileiros está a subir. No total dos dez anos de 2008 a 2017, cerca de 248,7 mil pessoas adquiriram nacionalidade portuguesa e desses 69 mil foram de brasileiros. Se bem que, na última década, o número de pedidos em cada ano se manteve mais ou menos estável, assiste-se a uma subida por parte de brasileiros e asiáticos, enquanto cai o dos naturais dos PALOPs e da Europa. Em 2008, o Brasil representava apenas 23% das pessoas que adquiriam nacionalidade. Esse valor manteve-se até 2014. A partir daí, a coisa explodiu. Em 2017, eram já 38%, bem acima dos naturais dos PALOPs (28%). Verifica-se igualmente uma subida dos asiáticos (de 5,6% em 2013 para quase 10% em 2017).
Mas haverá mesmo uma "regra"que é igual para todos?
Razões de aceitação dos pedidos: Aqui é forçoso entrar nas razões que a lei prevê para a concessão da nacionalidade portuguesa. A lei da nacionalidade (Lei 37/81, de 3 de Outubro) que já foi alterada dez vezes, a última das quais este ano (Lei orgânica 2/2018 de 5 de Julho) estabelece diversas formas de ver aceite o pedido de nacionalidade. Há uma nacionalidade originária que decorre das relações das relações familiares com portugueses e que é quase imediata; há uma nacionalidade adquirida (por filiação ou casamento); há uma nacionalidade por naturalização (em que se inserem todos os estrangeiros, a qual é concedida ao fim de cinco anos de residência legal, regra que se estende aliás aos seus filhos, que, apesar de nascerem em Portugal, apenas lhes será concedida nacionalidade caso os pais já sejam portugueses...o que só se verifica ao fim de cinco de trabalho).
Ora, o que acontece? Quais as principais razões por que se tornam os estrangeiros portugueses?
Metade dos pedidos ainda são de cidadãos estrangeiros que tiveram de trabalhar pelo menos cinco anos para conseguir ser portugueses. A segunda maior razão é por casamento com quem já seja cidadão português pelo menos há mais de três anos. Junta-se a estas razões uma fatia de dez por cento que são os filhos daqueles que se tornaram portugueses. Ou seja, para quase quatro em cada cinco dos pedidos dos últimos dez anos, houve um esforço de enorme espera para serem portugueses.
Mas em compensação verifica-se agora uma ascenção rápida de quem tenha descoberto que, afinal, é descendente de portugueses e, sem dificuldades de maior, consegue a nacionalidade. Foram 3,3% em 2008, mas são já 6,4% em 2017. Este é um facto que convinha ter em atenção porque decorre da própria lei. Apesar de os brasileiros serem estrangeiros como todos os outros - no sentido de não terem laços com as comunidade portuguesa - poderão beneficiar de uma pequena janela.
Como? Por incrível que pareça trata-se de uma medida que fora chumbada em 2006 e que voltou a ser adoptada em consonância com o governo Passos Coelho, por iniciativa do PSD, que estava preocupado com os netos de descendentes que, por inércia dos pais, não conseguiam ser portugueses. A mim, suscitou-me uma dúvida, não comprovada: na altura em que se planeava uma vaga de privatizações, quem eram os brasileiros que o PSD gostava que fossem portugueses?
O projecto iria ter uma longa vida. Deu entrada em Março de 2013 e, depois de muitos pareceres e propostas de alteração, foi votado em 2015, já na recta final do governo PSD/CDS. O PS fez introduzir que a concessão de nacionalidade obrigava a uma efectivos laços à comunidade portuguesa e que esses laços passassem pelos "contactos regulares com o território português", a qual ficou na lei.
Diz a alínea d) do artigo 1º, relativo à nacionalidade originária estabelece-se que, para ser “português de origem” aqueles “indivíduos nascidos no estrangeiro com, pelo menos, um ascendente de nacionalidade portuguesa do 2.º grau na linha reta que não tenha perdido essa nacionalidade, se declararem que querem ser portugueses, possuírem laços de efetiva ligação à comunidade nacional”.
É, pois, uma conjugação de vários motivos que se tem de verificar, mas que na realidade, basta que encontrem um avô nas berças. Ninguém vai fiscalizar se têm vindo a Portugal visitar os avôs perdidos algures.
É sintomático ver, por exemplo, no site da Hemeroteca de Lisboa os pedidos de informação relativamente a parentes no Brasil e em Portugal.
No gráfico ao lado, é visível que o número de atribuição de nacionalidade por essa via é ainda diminuto face ao movimento geral de estrangeiros em geral, visível no gráfico em baixo, em que europeus e asiáticos são as novas vagas. Mas pode ser revelador precisamente dessa desigualdade de tratamento entre imigrantes.
Ou seja, pessoas completamente ao lado do espírito do legislado, que procuram uma porta de entrada, à viva força, conseguem com aquele expediente legal supostamente “de sangue” evitar um período de cinco anos de trabalho e de contributo para o Estado português.
Mas quem nasça hoje em Portugal vai ter de esperar que os seus pais sejam portugueses para beneficiar da nacionalidade.
14 comentários:
Exactamente em que sítio da Hemeroteca é que se encontram esses comentários/pedidos?
Não percebi o seu comentário ao comentário registado na Hemeroteca. Pareceu-me tratar-se de um Português que anda à procura de família no Brasil. Eu próprio tenho lá parentes e tive parentes que foram para lá e regressaram depois a Portugal.
Aliás, o número de emigrantes para o Brasil em finais do século XIX e princípio do século XX que regressavam e que tinham em alguns casos que pedir ajuda para tal não era tão pequeno quanto isso. Muitos não encontravam no Brasil o Eldorado com que sonhavam.
Quanto à lei de nacionalidade, há duas coisas de que não fala. Se alguém reside legalmente em Portugal e aufere de rendimentos, justifica-se que pague aqui os seus impostos, salvo se existir um tratado com o País de onde provêm esses rendimentos. Se se trata do acesso à Segurança Social, bom, aí funciona o princípio de que só recebe quem descontou, salvo o caso de pensões de sobrevivência (que se tratam de facto de subsídios).
Quanto ao risco de brasileiros de classe média virem para aqui votar na Direita, não fico muito preocupado. Os brasileiros de classe baixa que adquirem a nacionalidade provavelmente mais do que compensam os primeiros e parece-me que esses irão votar nos Partidos que defendem os seus direitos, ou seja na Esquerda...
Portugal deve ter uma política relativamente àqueles que fogem à violência no Brasil semelhante à que o Brasil teve em relação aos foragidos da ditadura de Salazar, com realismo, evidentemente. Convém que não nos esqueçamos disso. O Brasil não é simplesmente outro País qualquer. Se por aí vierem também uns bolsonaristas, pois paciência...
E se alguém ficou surpreendido com o facto de que a larga maioria dos brasileiros residentes em Portugal votaram Bolsonaro, convém lembrar que a abstenção foi elevada e que só existiam dois lugares para votar. Os brasileiros pobres, muitos que tiveram provavelmente que trabalhar naquele Domingo, não votaram porque não puderam, infelizmente...
«embora estejam contra a consolidação de um Estado Social no Brasil» eis a conclusão mais óbvia!!!
Evidentemente que não se coloca a hipótese de não confiarem que a mafia PT consolide porra nenhuma.
E da Venezuela não vem ninguém?
Vai o Bolsonaro servir de travão aos fugitivos do Maduro?
Por um lado venham os que de África e do Médio Oriente se atirem ao mar; por outro há que peneirar os netos de portugueses?
Caro anónimo e caro Jaime,
São questões que aparecem nos links relacionados com a Hemeroteca. Não lhe consigo remeter o link porque remete apenas para aquele página que surgia e que eu, erradamente, pensei que dirigisse o leitor para lá. Retirei o link.
Caro José,
De facto, ao contrário do seu preconceito (permita-me a provocação), a Venezuela não é relevante estatisticamente nestes dados. É o Brasil que absorve a quase totalidade dos dados do continente Americano... Pelo menos até 2017, a Venezuela não surge.
O que traz aqui JRA merece estudo e reflexão
Não se compagina com os que "porra" e os mecanismos pavlovianos de jose
De acordo com Kaos Calmo
Jaime Santos fala de algumas coisas com leviandade
"Se se trata do acesso à Segurança Social, bom, aí funciona o princípio de que só recebe quem descontou, salvo o caso de pensões de sobrevivência (que se tratam de facto de subsídio".
Não, não são só os impostos e a segurança social no sentido estrito.
Trata-se de mais coisas. Está no texto. É só ler:
"as vantagens de um Estado Social (com educação, saúde, transportes, segurança, etc.)"
Adeptos de Bolsonaro a virarem parasitas, não obrigado.
" embora estejam contra a consolidação de um Estado Social no Brasil".
Ninguém dúvida que os adeptos de bolsonaro que se resguardaram em Portugal, sobretudo da classe média e não subjugados pelos evangelistas que se encarregam de pregar para as classes baixas, estão contra a consolidação de um Estado Social
Foi esta de resto uma das grandes raivas contra Lula. Como era possível tirar da miséria gente que nem é gente para esta gentinha.
Pelo que se percebem as esperanças que jose tem para com bolsonaro e a sua consolidação do Estado Social.
Faltam-lhe neste caso apenas os "porra" com que abrilhanta a sua sessão de propaganda
Porque será que a estas questões levantadas por joão Ramos de Almeida assistimos a estas trôpegas exibições de portuguesismo serôdio à cata dos "netos"?
Há sempre qualquer coisa de atávico e de sonho colonial atrelado a este discurso saudosista e passadista. Saudades do império e dos portugueses, de primeira claro, com árvores genealógicas embranquecidas pela acção da lixívia rácica.
Um neto de um português é coisa de primeira, claro. Sobretudo se seguir a cartilha propagandista em uso pelo colonialismo de antanho.
Só agora lhes vieram à memória os avós egrégios?
E no entanto tanta coisa que nos une, para além destes oportunismos rascas e racistas
Caro João
Admito que li o texto sem atentar nos gráficos, mas tenho lido notícias sobre a Madeira que imagino tenham sido em conta.
Agora que vi o gráfico recordo-me de ouvir falar de algo que não referiu: os avoengos do sec.XVI dos israelitas que lhe dão um estatuto priveligiado.
Afinal sempre há pontos em comum entre alguma esquerda e o PNR. Sempre achei isso, mas agora há aqui uma prova.
Ricardo Silva?
Se não é outro que não o aonio eliphis joão pimentel ferreira
O coitado tem passado o tempo a debitar em blogs. Ontem levou uma lição nos comentários no Público, como aonio eliphis. Metia dó tanto disparate. Metia dó tanta asneira.Metia dó tanta frustração condensada. Metia dó tanto baile
E repetiu num comentário o que agora diz aqui
Parece aquele coitado que saca da Venezuela como o Goebbels sacava da pistola quando ouvia falar de cultura. E depois o tiro saiu-lhe pela culatra.
Será algum à cata de privilégios por herança de avoengos duvidosos e suspeitos?
A propósito de Bolsonaro
Este disse esta semana que era preciso acabar com o "coitadismo"
Com o "coitadismo de negros, mulheres, homossexuais e nordestinos"
Há nesta linguagem algo de familiar. De terrivelmente familiar.
Um inspirou ou copiou o outro?
Ou isto é tudo a mesma ideologia?
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