quinta-feira, 8 de novembro de 2012

"Não passaria do primeiro ano"



O Diário Económico de hoje pré-publica dois textos sobre o Euro, confrontando duas opiniões diferentes sobre a moeda única e o seu futuro. O texto de João Ferreira do Amaral deve ser lido com atenção, sobretudo por quem alinha na tontice de identificar o cepticismo em relação à moeda única com chauvinismo nacionalista. O passo atrás (fim do euro) para dar dois à frente (novos mecanismos de coordenação monetária que possibilitem um projecto europeu progressista), que Ferreira do Amaral apresenta, é o caminho a seguir.

Mas a motivação deste texto está mesmo na defesa do Euro feita por António Borges. Este é muito mais divertido. Não me vou focar nos mirabolantes argumentos como "O euro é um dos grandes pilares de uma nova prosperidade europeia que começa a emergir", mas sim nos exemplos e factos que fornece para os apoiar.

Borges argumenta que o Euro é um exemplo de sucesso para um conjunto de países europeus. É verdade que o euro serviu os interesses da elite de alguns países (com a Alemanha à cabeça, um país que globalmente cresceu muito pouco na primeira década, pouco acima de Portugal), mas, dos cinco países assinalados como casos de sucesso, dois não pertencem à zona euro (Polónia e Suécia). Mais à frente o euro é dado como factor explicativo para o progresso de três economias europeias do leste europeu nos últimos dez anos: Polónia, Eslováquia e Eslovénia. A Polónia não tem euro, a Eslováquia só o adoptou em 2009 e a Eslovénia em 2007. Destes três a Eslovénia é aquele país que era um caso de sucesso até entrar no euro e que, entretanto, está à beira do resgate financeiro...

Em seguida, Borges aponta para o facto de certos países se terem tornado mais fechados, ilustrando com o caso da Grécia, que só exporta 5% do PIB para a zona euro. Esqueçam o facto de na verdade a Grécia ter na Zona euro os seus principais parceiros comerciais (à excepção da Turquia por motivos óbvios) e nas contas de Borges, presumo eu, só entrarem exportações de mercadorias (o total das exportações de mercadorias e serviços em relação ao PIB ultrapassa os 20%). As que são provavelmente as duas maiores indústrias do país não entram nas suas contas: o turismo e o transporte marítimo (são serviços). Mais, também não é verdade que os países europeus que não estão no euro se comportem como se estivessem. É certo que há ancoragem cambial, mas em momentos de crise, como aconteceu em 2008-09, as moedas europeias desvalorizam-se face ao euro, permitindo um ajustamento mais indolor. A Letónia que insistiu no câmbio fixo, sofreu uma quebra do PIB de 20%.

Finalmente, Borges aponta o sucesso do euro enquanto moeda de reserva internacional concorrente do dólar - o que é bem verdade, embora fique por explicar o que isso traz para uma economia como a portuguesa - e que os países sem problemas orçamentais beneficiam de taxas de juro extraordinariamente baixas. Borges, ao contrário do resto do mundo, acha que taxas de juro negativas são sinal de robustez em vez de consequência da fuga de capitais do Sul da Europa para o Norte como forma de assegurar valor numa moeda em risco de implodir. Enfim,  António Borges "não passaria do primeiro ano do meu curso na faculdade".

4 comentários:

LJC disse...

Um autentico asco esse Borges.

Dias disse...

O “génio Borges” espalhou-se ao comprido, ainda por cima num artigo pensado. Tanto rigor, tanta petulância, e afinal é só propaganda. (E a propaganda só interessa a uns “happy few” colaboracionistas, não ajuda a formar qualquer opinião.)

Como português e europeu (que também entende o processo de integração como a construção de uma organização de Estados soberanos, civilizados), prefiro reflectir sobre a proposta de JF Amaral, que considero séria e pragmática: nem vende as ilusões de Borges, nem embarca em devaneios a pretexto de “complexos nacionalistas”.

João Garcia disse...

Deixemo-nos de hipocrisias com a ideia de "o Euro não serviu Portugal, só serviu algumas elites". É verdade que não serviu Portugal, mas é mentira que isso tenha acontecido por defeito. Se dizemos, hoje, que o euro não nos beneficiou,temos de pensar porquê:

- não aproveitávos a redução substancial das taxas de juro para investir fortemente na Zona Euro ou em países de língua portuguesa (o primeiro grupo pela inexistência de risco cambial, o segundo por razões mais do que óbvias). Isto, por sua vez, deveu-se a;
- não haver muitas empresas em portugal que tivessem (e que tenham hoje mesmo) capacidade para o fazer. Mas o estado, com uma dívida de 60% do PIB e baixos custos de financiamento, tinha o dever de lançar investimentos através de empresas públicas (só se lembraram de isso bem mais tarde, com Mexia na EDP);
- O Estado também tinha o dever de investir na educação dos portugueses, que constituem das mãos-de-obra mais inqualificadas da ZE. Aqui está a principal oportunidade perdida: direcionar a economia para produção de bens de maior valor acrescentado, como um país desenvolvido deve ser. Ao invés disso, continuámos muito dependendes de setores como o textil, enfiando a cabeça na areia e ignorando que países como a Europa de Leste (nem é preciso falar da China) estavam a preparar-se para entrar no mercado único.

Em suma, dizer que o euro foi uma invenção em prol das elites é falacioso e produto de um recente ódio por quem soube estar neste contexto. Dez anos de dinheiro barato (e uns 25 de dinheiro fácil vindo de bruxelas) foram atirados fora entre submarinos, estradas e PPPs hospitalares. O euro não beneficiou Portugal, é certo, mas só há um único culpado: Portugal.

Anónimo disse...

Pois, mas o A.Borges também achava que os "sub-prime" eram uma maravilha e está ver-se.
Cagança e não só tem ele muita.