quarta-feira, 5 de setembro de 2007

O ranking da direita intransigente (I)

A direita intransigente ficou muito excitada com a queda de Portugal no «ranking da liberdade económica» (passou, em 2005, da décima nona para a trigésima oitava posição). O que é que o governo português andou a fazer (bem) para merecer esta distinção? Esperamos respostas. Entretanto, este exercício tem apenas a vantagem de nos dar a conhecer como os neoliberais trabalham nos seus bem financiados ‘think-tanks’ (existe alguma tradução aceitável?). Bem, talvez em Portugal os financiamentos não sejam tão generosos. Afinal de contas a nossa burguesia é a tristeza que se sabe. De resto, este estudo apenas reflecte os preconceitos ideológicos desta corrente e não deve ser levado a sério. Parece que até a Causa Liberal faz parte da rede que o suporta.

3 comentários:

Miguel Noronha disse...

É verdade. A CIA atrasa-se bastante no envio das avenças. Acho que vou ter que contactar a Mossad.

Diogo disse...

‘think-tanks’ (existe alguma tradução aceitável?)

Grupos de pseudo-especialistas a soldo de poderosos grupos empresariais e financeiros com o objectivo de exercer lobby a favor desses mesmos grupos.

Dinis Martins disse...

Bom este é um post longo.

Sobre a divulgação dos últimos dados sobre a posição portuguesa no ranking de liberdade económica do Instituto Frasier, tenho dois comentários prévios a fazer.
1. O Frasier Institute e os seus parceiros seguem uma definição de liberdade económica. É baseada na propriedade, no seu usufruto, na possibilidade do seu usufruto e na possibilidade da sua transacção entre indivíduos; este é o seu ponto de partida, concorde-se ou não. Para efeitos deste comentário, vou aceitar.
2. O Frasier Institute recorre a estatísticas nacionais recolhidas por entidades parceiras e elabora índices de liberdade, de 0 a 10, classificando assim a posição de cada país. Os indíces podem ser subjectivos, mas se aplicados da mesma forma aos dados de todos os países criam uma subjectividade trabalhável.

Mas ser trabalhável e ser útil…são coisas diferentes. Não vale a pena cair nos erros do próprio Instituto Frasier ao criar relações de causa-efeito entre a sua liberdade económica e o produto, prosperidade e desenvolvimento das nações. Mas por serem erros apresentados como verdades, vale a pena desmontá-los. Não vá a mentira ser dita tantas vezes, que se torne verdade mais tarde.

Comparei os dados de Portugal de 2004 para 2005 para ver as razões da apreciável queda neste ranking. E juntei dados de Noruega, Espanha e Eslovénia para efeitos comparativos.
- A Noruega obteve em 2006, com estatísticas de 2004, o indíce de desenvolvimento humano mais elevado no mundo.
- A Espanha pelo peso que tem nas estatísticas de comércio e finança internacional portuguesas é um elemento de comparação útil.
- A Eslovénia é a país imediatamente acima de Portugal ao nível da ranking do desenvolvimento humano. Teremos liberdades económicas diferentes?

A este tipo de comparações chama-se, convencionalmente, trabalho da treta. Mas por isso é que isto é publicado num blogue e não na Time!

Year Countries Size of Government
2004 Portugal 6,0
2005 Portugal 5,7

2005 Spain 5,2
2005 Slovenia 2,4
2005 Norway 4,7

Atão vamos a isto. Primeiro grupo de indicadores, o tamanho do governo.
Parece que de 2004 para 2005 o peso do governo português aumentou significativamente.
Culpa, ao que parece, do aumento do consumo público e da carga fiscal. OK. Engulamos esta.
O país com o maior IDH do mundo em 2005 no entanto, é muitíssimo mal comportado a este nível. O seu estado comilão norueguês é definitivamente um elemento de castração económica.
Nota metodológica. Parece que quando faltam dados, os países são 'castigados' com indíces mauzinhos.
Ou então quando os dados 'variam' (vide Espanha), fica-se um pouco confuso.
Seja como for parece que os países desenvolvidos são todos extremamente castradores da liberdade económica.

Countries 2 Legal System & Property Rights
Portugal 7,6
Portugal 7,4

Spain 7,1
Slovenia 6,0
Norway 9,3

Em seguida vamos à defesa da propriedade (e nem vamos falar agora do regime da mesma; isso são contas de outro rosário, porque bem me apetecia falar da defesa da propriedade pública, comunitária, …)
Claramente, de 2004 para 2005, os nossos sistemas de defesa da propriedade perderam pontos. Onde?
Ao que parece apenas porque agora à dados para 2 novas variáveis e antes não havia.
Mesmo assim protegemos melhor a propriedade que Espanha e Eslovénia.
Agora na Noruega é que é bom.
Curiosamente um Estado Forte parece proteger melhor os direitos de propriedade. Hummmm.

Countries 3 Sound Money
Portugal 9,5
Portugal 9,5

Spain 9,6
Slovenia 8,8
Norway 9,3

O verdadeiro valor do nosso dinheiro. Bom conjunto de variáveis.
Em contextos de baixa inflação e fraca volatilidade da mesma parece que pouco divergimos no mundo desenvolvido.
Penalizados os eslovenos e noruegueses pela montanha russa que são as suas taxas (entre baixinho e baixinho assim-assim)

Countries 4 Freedom to Trade Internationally
Portugal 7,6
Portugal 7,0

Spain 7,2
Slovenia 7,2
Norway 6,6

Comércio internacional
Aqui Portugal perdeu muitíssimos pontos de 2004 para 2005. O que se passou?
Aumentou a variabilidade das tarifas. Mas se as tarifas médias aumentaram (?) não terão caído quase todos os picos tarifários (que são os que realmente importam)?
2005 foi um ano de liberalização em muitíssimos sectores. Liberalização = menor liberdade económica? (desta já me tinha lembrado, mas parece que encontrei dados)…
Por outro lado parece que os custos de transacção em Portugal aumentarem imenso de 2004 para 2005.
Finalmente, os controlos de movimentos de capitais tornaram-nos verdadeiras ilhas do mundo.
2005 não foi um ano horrível para o comércio internacional e estes dados batem na trave das estatísticas sobre o seu crescimento.
A rever pelos autores?

Countries 5 Regulation
Portugal 6,6
Portugal 6,2

Spain 6,7
Slovenia 6,4
Norway 7,6

A regulação já é um tema controverso, especialmente se baralharmos a regulação com as variáveis que aqui são misturadas. Em termos gerais de 2004 para 2005, em Portugal:
- Portugal tornou-se um mercado menos regulado, com uma legislação laboral hostil à liberdade.~
- O Estado tornou-se mais burocrata, mais complexo, menos eficaz. Num ano a variação do índice é de mais de 10% (ai a subjectividade na análise. Uma quebra real desta magnitude teria sido catastrófica).
Mas sem dúvida tivemos um estado menos eficaz para o painel de análise. De 2004 para 2005. Estou curioso para ver dados de 2006.
Na Noruega não. O Estado crescido só fez bem.