quinta-feira, 13 de setembro de 2007

O solo onde a democracia floresce

Um artigo de Vital Moreira. A ler. A «democracia liberal pode coexistir com formas assaz limitadas de mercado. Nos anos 60 do século passado, a generalidade das democracias europeias eram caracterizadas por um forte intervencionismo do Estado na economia, por monopólios públicos em vários sectores económicos, pelo planeamento público da economia, pela fixação de preços de muitos bens e serviços. Mais do que economia de mercado em sentido estrito, muitos falavam em "economia mista", não faltando mesmo elaboradas teorias sobre a aproximação entre o capitalismo e o socialismo (tendo em vista algumas experiências de "socialismo de mercado")».

Diria mesmo que a experiência histórica nos mostra que formas robustas de democracia só podem florescer no solo alimentado por este tipo de estruturas e pelas ideias que lhes estão subjacentes. Por outro lado, é muito curto dizer que uma «economia de mercado bem sucedida tornou-se uma condição de êxito da transição democrática e da consolidação da democracia liberal», mas que «só por si o mercado não gera a democracia». O mercado tem as costas demasiado largas, é muito plástico e pode coexistir com os mais variados arranjos nos regimes de propriedade (entre outros elementos) e com vários tipos de sistemas socioeconómicos (é anterior ao capitalismo e nenhum sistema alternativo pode provavelmente prescindir dele para falar curto e grosso e para retomar coisas já escritas pelo próprio Vital Moreira).

A questão crucial é a de saber se não estamos num processo que, a continuar, tenderá a secar o solo onde a democracia pode florescer. O aumento do poder das forças do mercado e a consolidação de regimes de propriedade que dão demasiado poder aos accionistas seriam alguns dos mecanismos dessa secagem. Por exemplo, o economista Jean-Paul Fitoussi, insuspeito de simpatias socialistas, fala de uma «regressão "pacífica" das democracias» que se deve fundamentalmente à «expansão da esfera do mercado quer no interior de cada país quer à escala do Planeta» (A Democracia e o Mercado). Estaríamos assim numa conjuntura histórica marcada por uma situação de desequilíbrio entre um mercado em acelerada expansão (politicamente suportada como sempre aconteceu) e uma esfera da política democrática em perda de fôlego. Este é quanto a mim o problema central.

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