terça-feira, 25 de setembro de 2007

O género da economia ortodoxa

Para não se comprometer mais com exercícios fúteis e furados de previsão sobre a evolução da recente crise financeira, Ricardo Reis brinda-nos com um artigo que mostra bem como os economistas ortodoxos precisam de uns ensinamentos de economia feminista para entenderem a realidade e para assim evitarem desconchavos deste tipo:

«Recentemente, as economistas Edlund e Korn avançaram uma nova explicação para o ‘puzzle’ das prostitutas. Eles [sic] notam que é difícil uma prostituta arranjar um marido. É óbvio porque é que os homens preferem mulheres sexualmente fiéis para assegurar a paternidade dos filhos, mas é menos claro porque é que os homens são tão avessos a casarem-se com ex-prostitutas. O facto, no entanto, é que o são. Por isso, uma mulher que se prostitui prescinde da felicidade que um casamento lhe pode trazer, assim como do acesso aos potenciais rendimentos do marido. Logo, poucas mulheres o querem fazer, limitando a oferta e subindo a compensação por prescindir do casamento. A favor desta explicação, Edlund e Korn notam que as imigrantes recebem menos na prostituição do que as nacionais. Estas mulheres podem voltar para o seu país e esconder o seu passado, tendo por isso melhores hipóteses de casar, pelo que exigem uma compensação menor».

Concentro-me apenas na última parte da citação. Reparem como se assume que tudo o que acontece na vida em sociedade é por definição o resultado de escolhas informadas, livres e autónomas: «exigem uma compensação menor». Sem mais. Como podia ser de outra forma se o economista decretou que não existem estruturas de poder, mecanismos de discriminação ou contextos sociais que constrangem as alternativas com que as pessoas são confrontadas? Assim se faz economia. Má economia.

4 comentários:

Filipe Castro disse...

Inacreditável! A separação entre a ideologia e a realidade. Tal como os astrólogos, certos economistas constroem modelos, às vezes complicadíssimos, para explicar fenómenos que só existem na imaginação deles...

P. Lumumba disse...

Mas em que planeta e' que esta personagem vive?

"é menos claro porque é que os homens são tão avessos a casarem-se com ex-prostitutas"?

"exigem uma compensação menor"?

Miguel Madeira disse...

Mesmo dentro da lógica da economia ortodoxo, o exercicio de RR (ou melhor, dos gajos que o inspiram) parece-me um bocado absurdo - em vez de elaborar uma complexa teoria sobre porque razão as mulheres preferem não ser prostitutas e concluir com "os homens são avessos a casarem-se com ex-prostitutas porque são", não era muito mais simples (e realista) assumir que "as mulheres são avessas a tornarem-se prostitutas porque são".

Luís disse...

Em boa verdade, acho que o nosso caro colega se deixou foi seduzir. Isso sim, mas por uma lógica deveras irresistível..
Poderás haver exemplo mais claro do que acontece quando se reduz tudo a uma lógica de duas dimensões? Euclides para cá, Euclides para lá.
Em contraponto a tão brilhante arguição econométrica só restará dizer "swinging all the way"; quero dizer, no caminho de ida e no caminho de volta...