Público, 3/7/2013 |
[Para já, ficam as desculpas por este filme estar a ser apresentado com lapsos temporais tão alargados que é elevado o risco de o leitor perder o fio à meada. Mas tentemos retomá-lo...]
Público, 3/7/2013 |
Ainda mal refeitos da demissão do todo poderoso ministro das Finanças Vítor Gaspar, alma e coração da aplicação do programa político mais (neo)liberal de sempre, estilo rolo-compressor apadrinhado pelas ideias da troica (ver aqui), eis que novo espanto surge logo no dia seguinte, aquele que, segundo o Público, seria “o dia mais confuso de que há memória na democracia portuguesa”.
Se Vítor Gaspar se demitira por considerar não haver condições políticas para aplicar as suas ideias (neo)liberais sem hesitações políticas - fruto dos fracassos económicos já estarem, desde 2012, a ser travados na rua e no Tribunal Constitucional (TC), atingindo até a coligação; o nº2 do Governo Passos Coelho demite-se precisamente por considerar que a substituição de Gaspar por Maria Luís Albuquerque era ... a continuidade dessa política suicidária de austeridade.
Paulo Portas entrega a sua carta de demissão que diz ser “irrevogável”, ameaçando com ela a queda do Governo. Foi um torpedo violento lançado na pior altura (a duas semanas da oitava avaliação pela troica). Pedro Passos Coelho fez de conta de que este “caso” não existiu e passou a batata quente para o CDS/PP, obrigando-o a decidir se o Governo continuava ou não.
As dificuldades políticas então sentidas, mesmo por parte de um Governo de direita, eram perfeitamente naturais. Poderá ser até uma reacção humana de quem se vê a aplicar um programa sociopata de classe do BCE, Comissão Europeia e FMI, embora - depois - acabe por nunca retirar as devidas ilações dos seus actos irresponsáveis e esteja disposto a repeti-lo:
1) Obrigar um Estado a resolver a situação irresponsável gerada pela banca privada nacional, socializando os seus prejuízos, em nome de um potencial efeito sistémico da falência de alguns bancos; 2) Para solver a dívida gerada, obrigar esse Estado a financiar-se nos mercados financeiros (deixando que essa dívida de elevadas taxas de juro seja adquirida nomeadamente pela banca francesa e alemã); 3) Deixar esse Estado sem rede protectora quando se vê sob ataques especulativos; 4) Quando, na sequência desses ataques, a dívida se torna impagável, afectando já os credores, forçar politicamente - leia-se: chantageando - o governo desse Estado a ter de pedir um empréstimo ao FMI, BCE e Comissão Europeia; 5) Quando o Governo resiste, fazer o BCE fechar a torneira de financiamento aos bancos desse Estado - vulgo golpe de misericórdia; 6) Quando o Governo se senta para negociar as condições do empréstimo (Memorando de Entendimento) - o qual permitirá pagar aos credores que assim investiram sem risco! - condicionar o empréstimo a que este seja pago pelos trabalhadores e pensionistas, através de um programa recessivo que os fará sentir os
malefícios do desemprego, da pobreza e das desigualdades sociais, através de cortes de salários e de serviços públicos, ao mesmo tempo que impõe a esse Estado a venda aos desbarato de activos públicos estratégicos a investidores estrangeiros. “As dívidas são para ser pagas” disse algo assim o então PM Passos Coelho.
Tudo isto, quando esta desgraça social poderia ter sido evitada, como aconteceu mais tarde, quando o BCE pôs temporariamente de lado os cânones (neo)liberais e, intervindo nos mercados financeiros, defendeu "custe o que custar" os Estados dos selvagens mercados financeiros. Mas isso foi apenas mais tarde. Agora voltemos a Paulo Portas.
Paulo Portas demitiu-se pela impopularidade social da austeridade. Mas fê-lo antes de apresentar a famosa reforma do Estado que a direita (neo)liberal defendera na campanha eleitoral de 2011, e a que Portas se obrigara perante os seus colegas de Governo. Porque não o fez? Porque era difícil? Porque era impraticável ao delapidar um Estado já no osso? Porque, na realidade, representaria ainda mais austeridade e mais impopularidade? Porque seria ainda mais um fracasso económico?
Não se sabe. Preferiu demitir-se. Por ora...
4 comentários:
" 1) obrigar um Estado a resolver a situação irresponsável gerada pela banca privada nacional, socializando os seus prejuízos, em nome de um potencial efeito sistémico da falência de alguns bancos; ".
- Quem mandava?. A banca privada nacional ou o governo?. E qual governo que se terá deixado enganar pela banca privada?. Certamente o socialista de Sòcrates.
A falta de responsabilidade destas grandes instituições não é um pormenor, é claro que não assumem nada porque a maioria das vezes estamos a falar de crimes.
Boa lembrança a da farsa da dívida pública. As "vendas" memoráveis das empresas públicas até trazem lágrimas aos olhos, os franceses ficaram com os aeroportos de Portugal e os alemães com os da Grécia, isto é arte meus caros, isto sim é arte.
ò, joão, faz antes um livro disto. assim, não se perde o fio à meada,
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