sexta-feira, 18 de junho de 2021

Neoliberalismo duplicado


1.
O Presidente do Tribunal de Contas declarou, do alto da ridícula pose imperial com que se deixou fotografar no Público, que “onde há muito dinheiro público há riscos de corrupção”. O ideal neoliberal é haver pouco, portanto. Não se preocupem que, para lá da propaganda, não há muito. À boleia disto, tem sido todo um programa de entrada do capital privado nos serviços e infraestruturas públicas, que de resto vai continuar. É claro que não passa a barreira do preconceito pensar que onde há muito “dinheiro privado”, muito concentrado, há transmutação do poder económico em poder político, ou seja, corrupção, cujos mecanismos neoliberais são relativamente óbvios há muito anos. 

2. O Governador do Banco que não é de Portugal, correia de transmissão do soberano monetário que está em Frankfurt, Mário Centeno, confirmou a orientação neoliberal que declara irreversíveis as conquistas laborais do patronato ao tempo da troika, agora em nome da “estabilidade”. Os neoliberais são conservadores, mas só depois de vencerem. E venceram, para desgraça de um país onde o excessivo poder patronal assegura a desigualdade estrutural e a estagnação. Na Flórida da Europa, a força de trabalho deve ser uma mercadoria descartável. E não se esqueçam que numa economia monetária de produção quem controla a moeda, controla politicamente muito do que é essencial.

2 comentários:

Jaime Santos disse...

Onde há dinheiro, há corrupção, ponto final. Que me lembre, a URSS não era exatamente um exemplo de probidade política, João Rodrigues.

A venalidade não tem cor política. Se a Esquerda o admitisse em vez de se dar os ares de superioridade moral do Presidente do TC, pelo menos não seria acusada de hipocrisia.

E quem controla a moeda não controla coisa alguma se a moeda não valer nada. A MMT é muito bonita para Economias que possam emitir moeda que valha alguma coisa. Como o Euro, por exemplo...

Anónimo disse...

Eu só sei no tempo do Escudo que "não valia nada" era mais difícil aos donos da Jerónimo Martins mandar dinheiro às carradas para as Caimão e mandar os lucros das vendas do Pingo Doce para a Holanda. Nesse tempo, tão pouco importavam leite polaco, em autotanques, para o vender cá, como leite português. Os polacos, não por acaso, mantêm o zloty!