terça-feira, 7 de janeiro de 2025

A viragem direitista pode ser travada


Uma das muitas imagens chocantes de 2024 tem de ser lembrada em 2025: uma imensa fila de pessoas, com as mãos encostadas à parede, alvo de uma aparatosa operação policial, numa zona de Lisboa, a rua do Benformoso, ao Martim Moniz, onde residem e trabalham muitos imigrantes. Foi uma «operação especial de prevenção criminal», chamou-lhe a Polícia de Segurança Pública (PSP). Está em linha com a política governamental, anunciada pelo primeiro-ministro Luís Montenegro e apoiada pela extrema-direita de André Ventura. A natureza da operação faz lembrar as «guerras preventivas» de neoconservadora má memória, trazendo para a esfera nacional, para o terreno social, a violência estrutural que pulula na esfera internacional. 

«Muitas vezes não é necessário que haja muitos crimes para que as pessoas se sintam inseguras», afiançou o primeiro-ministro em reação à operação. Este tipo de declaração é parte de uma política governamental de perversa promoção do sentimento que se diz querer combater, de resto reconhecidamente desligado da realidade dos números da criminalidade. Inscrita na lógica territorial deste tipo de operação policial, e sobretudo no discurso governamental que a procura instrumentalizar, está, insidiosamente, a associação, falsa, entre criminalidade e imigração. Esta associação é, de resto, explicitamente feita na propaganda da extrema-direita. 

Terrenos de disputa 

Um dos terrenos da disputa político-ideológica, a que ninguém se pode furtar, é agora mais claro: a insegurança e as suas causas e, correlativamente, as formas de gerar segurança. O governo aposta na fragilização da melhor fonte de segurança – a social, e os direitos laborais que a sustêm –, e aceita e aplica as regras europeias cada dia mais austeritárias, causando uma erosão estrutural dos serviços públicos. Ao mesmo tempo, aposta politicamente no reforço do Estado policial. Não há contradição, antes complementaridade, entre estas apostas governamentais, com um evidente conteúdo de classe. Menos Estado social, mais Estado policial: este é um padrão reconhecido há muito na história da economia política, até porque o aumento da discricionariedade patronal exige o aumento da discricionariedade policial. O círculo vicioso da insegurança social, promovido pela política de direita, tem uma resposta já testada por parte das direitas cada vez mais extremadas. Qual é essa resposta? A busca, mediaticamente promovida, de bodes expiatórios entre os setores mais vulneráveis da população, incluindo os imigrantes pobres, procurando proteger politicamente os grandes beneficiários das suas políticas (incluindo fiscais), isto é, os grandes grupos económicos, a classe dominante, e atirando trabalhadores contra trabalhadores, dividindo para reinar.

O resto do artigo pode ser lido no Le Monde diplomatique - edição portuguesa de janeiro.

1 comentário:

José Cristóvão disse...

Mais uma vez se prova: acabando com a televisão privada, acaba-se com metade dos problemas em Portugal.