Na minha família os animais domésticos não eram cães nem gatos nem pássaros; na minha família os animais domésticos eram pobres. Cada uma das minhas tias tinha o seu pobre, pessoal e intransmissível, que vinha a casa dos meus avós uma vez por semana buscar, com um sorriso agradecido, a ração de roupa e comida.
António Lobo Antunes, Os pobrezinhos.
No final da história, a atração pela gravura revolucionária, pelo ato de “proteção da nação”, é mais do que compreensível. Foi Constança Cunha e Sá, felizmente regressada, que, a propósito de Isabel Jonet, lembrou Lobo Antunes.
O capitalismo televisivo sem freios e contrapesos há muito que decidiu prescindir do comentário desta excelente jornalista política. Não encaixa no coro com sotaque de classe dos Bernardos Ferrões. O pessoal é político: o meu filho nasceu em 2011, luz em tempos sombrios; quando a via na televisão, eu dizia, “força Constança, dá-lhes na pança” e ele ria-se muito.
Entretanto, Isabel Jonet garantiu: “Não ganho um tostão há 25 anos. Sou voluntária. É quase uma missão de vida”. Carina Castro respondeu-lhe bem: “O luxo de ser voluntária como vida e não como entrega solidária, mas subsidiária da vida que se gasta a ganhar a vida. Quanta fortuna será preciso para poder ‘não ganhar um tostão há 25 anos’?”
Aproveito também para relembrar Luísa Semedo, quando denunciou uma das tiradas imorais de Isabel Jonet –“em Portugal há quase um incentivo às pessoas quererem mais apoios sociais e menos responsabilidade na própria vida” –, aproveitando para resumir com fina ironia todo este programa de sociedade liberal até dizer chega:
“Dá-nos aqui algumas pistas úteis para caracterizar o que deve ser um bom pobre de família. Deve ser uma pessoa responsável, evidentemente sem dinheiro, mas que poupa naquilo que não tem e sobretudo não o gasta de uma só vez. E para isso precisa de ser formada ao que Isabel Jonet chama de racionalidade económica ou, em linguagem de pobre de família, de magia económica.”
1 comentário:
O mais grave disso é que, segundo os governantes, esses esgotos de comunicação "social" recebem subsídios e perdões de dívidas ao Fisco, para terem um mínimo de decência no que respeita ao direito de resposta. Nem nos tempos de obscurantismo salazarista se chegou tão longe.
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