quinta-feira, 26 de janeiro de 2017

O europeísmo utópico


Já há algum tempo que o Rui Tavares vem escrevendo artigos em que, de forma crescentemente agressiva, vai rotulando todos os que não estejam disponíveis para continuar a sacrificar a democracia, os direitos do trabalho e o Estado Social em nome de uma União Europeia outra, da qual não temos outro vislumbre senão a imaginação generosa dos que a sonham. Este raciocínio e o rótulo, inicialmente subtil, foi-se tornando crescentemente explícito e já chegou a este grau de clareza:

Se você defendeu que “não pode haver democracia para lá do estado-nação” ou que “os cidadãos do mundo são cidadãos de lugar nenhum”, você andou a promover ideias nacionalistas. Se sim, parabéns. Você ganhou por agora. Seja de direita, de esquerda, ou nem-uma-coisa-nem-outra, você ajudou a preparar o terreno conceptual para a vitória do presidente do país mais poderoso do mundo. De brinde, talvez lhe saia a presidente da França.
Rui Tavares, in Público (23/01/2017)

Não farei a maldade de replicar o expediente intelectual do Rui Tavares e acusá-lo de cumplicidade com toda a tragédia económica e social provocada pelas instituições da União Europeia, graças às quais a Europa tem experimentado o pior período económico e social da história do pós-guerra. Sei que o Rui Tavares defende instituições europeias diferentes e políticas europeias diferentes e que o seu projecto político é distinto e até oposto ao de quem domina a Europa.

Também não vou (neste texto) alongar-me sobre esta ideia de que o crescimento massivo da extrema-direita está relacionado, não com as consequências económicas e sociais da globalização liberal, mas com um “terreno conceptual” que as forças que se lhe opõem teriam ajudado a construir, reavivando sentimentos nacionais que (acha o Rui Tavares) teriam desaparecido.

No entanto, não é possível não recordar que a Globalização em geral, e a Integração Europeia em particular, coincidiram com uma gigantesca perda de direitos sociais e do trabalho. Nem que esses direitos foram conquistados no pós-guerra no quadro, veja-se lá, dos Estados-nação democráticos. Será tudo coincidência?

É porque este percurso histórico é tão útil que tenho tanta dificuldade em perceber o paralelismo do Rui Tavares entre a União Europeia e a Sociedade das Nações. Não tanto porque o paralelismo não tem sentido institucional (a Sociedade das Nações deu origem à Organização das Nações Unidas e não à União Europeia ou nenhum dos seus antepassados), mas sobretudo porque os objectivos e filosofia são totalmente diferentes. A União Europeia foi fundada na base da doutrina do Comércio livre e, na fase do Euro, por uma declinação contemporânea do Padrão-ouro, de tão má memória. As fábulas sobre a “Europa dos fundadores” são manifestamente exageradas. A União Europeia nasceu como um projecto liberal e os sucessivos tratados apenas reforçaram e cristalizaram essa identidade.

Mas falemos então das ideias atribuídas aos “nacionalistas” pelo Rui Tavares. A questão de saber se “pode haver democracia para lá do Estado-nação” não é bem a que é actualmente colocada pelo euro-cépticos. A questão, ou as questões, são, do meu ponto de vista, três:

1. Existe, hoje, de facto, democracia fora do Estado-nação?

A resposta é um rotundo não. Na União europeia, as instituições democráticas não têm poder e as instituições com poder não são democráticas. O Parlamento Europeu tem poderes à beira da irrelevância, o BCE tem um poder literalmente ilimitado e isento de qualquer escrutínio democrático e mesmo as chamadas regras europeias servem essencialmente para criar um território de arbitrariedade em que a bonomia das instituições europeias depende da submissão das instituições nacionais (essas, sim, democráticas) a um programa de “reformas estruturais” que ninguém sufragou. Não há democracia na Europa. Em bom rigor, não há sequer Estado de Direito.

2. Existe uma possibilidade plausível de construção de uma democracia transnacional a partir da União Europeia?

A resposta é outro rotundo não. Não porque a União Europeia não tenha mudado. Tem mudado para pior, e vai continuar a mudar, também para pior. Não admira, aliás, que o Rui Tavares não se alongue particularmente sobre o seu plano para a democratização da União Europeia. É que não há plano, não há protagonistas, não há contexto, não há mobilização e não há sequer como. Os tratados da União estão blindados pela regra da unanimidade, já para não falar dessa regra chamada Alemanha. Não vai haver democratização da União Europeia nenhuma. Há anos que a crescenteperda de soberania das democracias nacionais se faz com a promessa de democratização das instituições europeias. Em que se converteu essa promessa? No paleio da “ownership”, ou seja, na apropriação forçada pelos Estados-membros das reformas que Bruxelas impõe.

3. É possível proteger as democracias nacionais existentes enquanto aguardamos por essa democracia transnacional sonhada?

A resposta é um rotundo não e este “não” é provavelmente o mais importante. As instituições europeias em 2015 levaram a cabo um golpe de Estado na Grécia. Confrontadas com o resultado esmagador de um referendo que rejeitou as suas políticas, as instituições europeias arredaram esse momento democrático, recorrendo à chantagem da expulsão.

Esse ultimato coloca a toda a esquerda uma questão inevitável e inadiável: que posição ter perante esse cenário, que hoje sabemos ser possível, para não dizer provável? Uma esquerda que, como o Rui Tavares, divida o campo político entre “nacionalistas” e “cosmopolitas”, optaria por sacrificar os direitos dos seus cidadãos e a sua vontade democrática em nome da pertença à União Europeia, na esperança da sua transmutação futura? Só é possível responder “não” se se estiver, pelo menos, disponível e preparado para um cenário de ruptura com o Euro. E se a resposta for “sim”, então, meus amigos, olhem para a Grécia hoje.

É por estas razões que não partilho as ideias do Rui Tavares sobre Europa e Estado-nação. Mas, além disso, não tenho tanta pressa como ele em provocar uma fractura no campo político que está a reagir à austeridade. Faço política quotidianamente ao lado de gente que, tal como o Rui Tavares, não concebe a saída do Euro como uma possibilidade. E acho contraditório que esta linha na areia seja desenhada por quem tanto escreveu e falou sobre a unidade da esquerda. Basta observar que, se esta doutrina dos “aliados objectivos” tivesse presidido à actuação da esquerda portuguesa nos tempos mais recentes, Passos Coelho estaria hoje a governar o país.

25 comentários:

Anónimo disse...

O "nacionalismo" não vai trazer a democracia vai sim despoletar a guerra. É absolutamente evidente que nesta "União" Europeia e neste "mundo globalizado" não há democracia. O capitalismo é o instrumento de todas as subjugações e poucos parecem disponíveis para pôr em causa este perverso sistema.

Anónimo disse...

Substancialmente de acordo, se bem que com alguns reparos telegráficos.

Um, para dizer que não vale a pena perder tempo com o patetinha, que a realidade encarrega-se de lhe esvaziar o discurso, cada vez mais oco.

Dois, numa observação de forma, para dizer que o termo, elegante, de “declinação” («contemporânea do padrão-ouro»), não será o mais adequado, já que o seu sentido dominante corrente, de decadência, afastamento, recusa, é o oposto do que se quer afirmar.

Três, para dizer que o autor, talvez para evitar a autocrítica que nos era devida – nos tempos em que escrevia, com uma ingenuidade que empalidecia a do Rui Tavares, «é para mim puramente impensável que a gente que hoje integra o governo grego esteja disponível para semelhante papel [o Syriza rasgar e cuspir no seu programa, sujeitar e humilhar o seu país]» (Ladrões de Bicicletas, 10/4/2015) – continua a fazer de conta que só houve uma miserável imposição de um lado (das instituições europeias) e uma não menos miserável traição do outro (dos dirigentes gregos).

Quatro, e mais importante, para dizer que já vai sendo tempo de sair de cima do muro e passar do “estar preparado para um cenário de rutura com o euro” (até os think tanks da burguesia se preparam) para o “preparar a rutura com o euro”.

Anónimo disse...

Falta um "não" no terceiro parágrafo do meu comentário das 08h21: «... continua a fazer de conta que só houve uma miserável imposição de um lado (das instituições europeias) e não uma não menos miserável traição do outro (dos dirigentes gregos).»

Fernando disse...

Se vai despoletar a guerra é caso para ficar descansado. Grave seria a possibilidade de a espoletar.

Álvaro disse...

Gostei de ler. Mais disto e menos Rui Tavares, Varoufakis e companhia é o que precisamos. No entanto, olhando à minha volta, o europeísmo utópico continua a ser dominante numa certa camada urbana, com formação superior e educação política.

Entretanto, questiono-me por que razão este posicionamento político continua invisível nas televisões e jornais. A entrada em cena da geringonça não devia permitir alguma abertura? Regista-se que neste campo, como nos outros, o aparelho de estado continua blindado à presença e influência da esquerda.

Geringonço disse...

Rui Tavares é um ressabiado elitista que tal como Francisco Assis não aceita que as pessoas (o povo) tenham a capacidade de ver os péssimos caminhos que estão a ser trilhados.

Eles verdadeiramente não acreditam na opinião do povo (democracia). O povo é uma mescla de mentecaptos que têm que aceitar tudo o que as ditas elites impõem.

Rui Tavares como outros acham que as pessoas (o povo) deve ser sacrificado para que ele e outros vejam os seus desejos concretizados por mais insuportáveis que sejam esses desejos para as pessoas (o povo)…

Há agora nos artigos de opinião PAGOS um senso de desespero, do fim dos tempos, isto porque esta gente PAGA fez carreira na base de inevitabilidades. Se fossem de facto comentadores independentes saberiam que o fim da História não aconteceu, assim, poupavam-nos da sua celeuma.

Anónimo disse...

Concordo em linhas gerais com o autor e com a generalidade dos comentários adjacentes, nomeadamente o de Álvaro e o das 8 e 21

Um pouco mais tarde que o desejável, mas ainda bem que José Gusmão se distancia cada vez mais deste euro que se vai afundando e nos afunda com ele

António Pedro Pereira disse...

É espectacular ler vários comentários das mesma pessoa, repetindo a mesma canção de embalar.
É a velha técnica para dar a ideia de que, afinal, são muitos.
Os amantes da saída do euro só não nos explicam, nem as consequências desastrosas, nem como passar a viver no Paraíso (que muitos de nós conhecemos bem, especialmente antes de os fundos europeus terem começado a entrar, ainda com o escudo: só no I Quadro Comunitário de Apoio, entre 1989 e 1993, entraram 14,8 mil milhões de euros, que permitiram ao Pau Queimado de Boliqueime ter duas maiorias absolutas. Portanto, com o fim do euro e dos fundos europeus é a reentrada nesse Paraíso de foguete).
E passamos a ser independentes, da ex-UE, talvez também do resto do mundo.
Espera aí, do resto do mundo não, fazemos uma aliança com o democrata Putin para construir o socialismo da corrupção, dos oligarcas, do nepotismo: em breve teremos o verdadeiro Paraíso na Terra.

Jaime Santos disse...

Parabéns pela clareza da exposição. Mas infelizmente apresenta contradições nessa mesma exposição. Desde logo, acusa Tavares de um expediente intelectual e utiliza outro, coloca uma foto de arame farpado com a bandeira da UE em pano de fundo. As cortinas de ferro, estavam, desculpe que lhe diga, noutros sítios. Sobre isso, estamos conversados. Depois, reescreve a tragédia grega, esquecendo a incompetência de Tsipras e Varoufakis que esticaram eles também a corda e não estavam preparados para a ver rebentar. É que aquele referendo, marcado à revelia dos restantes governos europeus, deveria ter lá outra pergunta, a saber: 'deve a Grécia aceitar o presente programa, ou deve recusá-lo, saindo do Euro?' Porque se existia ameaça de expulsão era só da moeda única. Aliás, note-se que o pobre do Papandreou aceitou fazer essa pergunta antes, e isso custou-lhe o lugar de PM. Não sei se Rui Tavares concebe um País sem o Euro. Eu concebo e até dou de barato que esse Euro foi o principal responsável para a década perdida do País de 2001 a 2011. Só que o que não estou preparado é para apoiar pseudo-eurocéticos (a expressão é do Rui Tavares) que me dizem onde querem chegar sem dizerem como. E não me venham com a frase 'onde há uma vontade, há um caminho'. Eu até simpatizo com ela, mas o que ela não diz é quão estreito e duro o caminho pode ser. Finalmente, saúdo quem rejeita as utopias. Mas tem que dizer que as rejeita todas e sem exceção, não apenas o europeísmo, porque convém lembrar outras que foram tentadas e deram resultados bem piores do que a UE...

Anónimo disse...


A historia contemporânea regista Ruis Tavares por tudo quanto e´ lado. E´ mais um, infelizmente!
Vira-casacas há-os por todo o lado e a qualquer preço.
O capital-financeiro não se cansa de recrutar novos arautos da mentira, paga-lhes bem e dão-lhes pistas para se poderem exercitar – TV, Radio e Imprensa --.
Ele não foi integrado (ainda) nas forças dominantes, para isso ser-lhe-á necessário apresentar informação de relevo mais insidiosa, gerando mais confusão, tanta quanto possível, no seio da esquerda organizada. Sem isso, não chegara´ la´! de Adelino Silva

Unknown disse...

No seu livro «Solução: O Novo Escudo», Francisco Louçã e João Ferreira do Amaral, discorrem de forma intelectual e academicamente honesta, sobre os principais impactos a curto e a médio prazo na economia portuguesa e consequentemente na vida dos portugueses, da saída de Portugal do Euro.

Entre outros aspectos focados elencam 4 fundamentais que teriam / deveriam ser previamente acautelados para que essa saída não entrasse num descontrolo dificil de pôr cobro nas suas potenciais consequências nefastas.

Apesar de alguma Utopia, os autores, focam dois aspecto que considero fundamentais nessa saída.

O apoio maioritário do povo português, consubstanciado num REFERENDO ou num governo eleito com esse apoio maioritário em que a saída do Euro, fosse um dos pontos do seu programa eleitoral. Portanto LEGITIMIDADE POLITICA.

O segundo aspecto é a necessidade da saída não ser feita à REVELIA das instituições do Euro, sob pena, de ficarmos reféns AD ETERNUM, de algumas condicionantes, uma vez que a ideia seria a de sair do Euro sem sair da UE.

Subscrevo integralmente estas duas condições sinequanon, mas não vejo forma destas serem concretizadas.

Declaração de interesses: Não acredito que a médio prazo fiquemos melhor fora do Euro, que dentro dele. Mas essa é outra questão.


António Pedro Pereira disse...

Caro Carlos Miguel Sousa:
As duas condições postas pelo F Louçã e pelo JF do Amaral não são concretizáveis.
O nosso histórico mais recente, desde o 25 de Abril, mostra-nos que, sempre que tivemos apertos, os governos ou caíram quase de imediato ou caíram logo que a situação melhorou um pouco, colhendo outros os louros do ligeiro alargamento do cinto.
Portanto, esperar apoio maioritário a um governo que irá exigir sacrifícios como nunca, é puro delírio.
No caso da UE, esperar condescendência da sua parte, em especial de quem manda, que são os países do Norte que acham que os do Sul são os culpados pela crise económico-financeira (das dívidas soberanas) que se vive, é puro delírio.
Estamos perante dois puros delírios.
Logo, estamos condenados a apodrecer no euro, até que outra solução, não se sabe bem qual, ocorra.
Antes de termos entrado é que deveríamos ter visto onde nos metíamos.
E aí, tanto governantes como populaça, embarcou tudo na onda do euro, iríamos, como que por milagre, ficar de repente todos ricos.
O JF do Amaral bem avisou nessa altura o que nos iria acontecer, está escrito em artigos e livros.
Não será a mesma populaça, acrítica e seguidista, que aplaudiu a entrada virtuosa e à pressa no euro, que vai aplaudir a nossa saída dolorosa.
Agora é tarde: estamos fritos, tanto dentro como fora do euro.
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P. S. Hoje vai jogar-se a Taça da Liga no Estádio do Algarve.
Quase só serve para isso.
Tal como outros que foram construídos para o EURO 2002: Aveiro; Leiria; Braga; etc.
Venda-se aquela trampa ao quilo.
E muitas autoestradas, que foram construídas em vez de estradas do tipo IP, hoje às moscas: vendam-se também.
E o CCB.
E a EXPO98 (o que resta dela).
Venda-se tudo ao quilo, com desconto.
Renderá pouco mas deixará de dar despesa.


Unknown disse...

Manuel Silva
o Brexit também não era concretizável.
O Syriza jamais aceitaria a austeridade que está a ser imposta à Grécia.
O Trump também não ganharia eleições.
A China jamais defenderia o livre comércio.
etc...

Anónimo disse...

O pobre Manuel Silva continua enfeudado aos seus fantasmas peculiares.

São todos o mesmo, repete, num paroxismo suspeito da sua sanidade intelectual.

Enquanto vai remoendo sobre os amigos de Putin, outra consequencia funesta do seu carácter paranoide.

Mas isso é apenas o mal menor porque registo igualmente menor dum perfil de um comentador

O que interessa mesmo focar é o derrotismo de quem assim se expressa. Estamos condenados a. Estamos fritos. E depois mais uns comentários inconsequentes uns sobre futebol ( como é hábito entre nós) e outros sobre as auto -estradas e o CCB a vender ao Quilo e ainda por cima com desconto.

Um derrotista que nos oferece outras inevitabilidades.

Antes em relação ao euro era apenas Ferreira do Amaral mais um punhado de economistas e o PC. Está escrito.
Mas a populaça nao queria. E os governantes também não.
Ainda bem que houve gente com tonates que foi coerente com a sua posição e que nao se rendeu.

Agora é aquele registo aí em cima expresso.

Maa as coisas evoluiram. A cada dia que passa mais se repara no logro em que caímos. O proprio Louçã ,cujo discurso era um até há pouco, tem actualizado o seu pensamento. O BE quase que no seu todo, também. Este blog tem ajudado ao creser duma massa crítica e coerente. Ao contrário dos profetas do irremediável, a maré vai crescendo. Pode nao ser suficiente? Pode. Mas quem desiste nunca vencerá. Pelo contrário estes convites à submissão bovima podem ser apontados como conivências envergonhadas.

E depois... Depois a razão mesmo que minoritaria nao deixa de ter razão. Pode o conceito de quem tem razao ser discutível. Mas as nossas convicções não são mercadejadas nem em pelos votos nem por queixumes pueris.

O futuro nao está escrito. O sr Tavares proclamava há tempos a irreversibilidade da globalizaçao. Hoje é o que se vê.

Vivemos, ao contrário do que alguns em pânico nos querem vender, tempos interessantes. O que era dado como certo hoje já não o é. Afinal a História nao morreu. Só temos que defender o que nos parece justo e se possivel lutar por isso.

Anónimo disse...

O referendo grego marcado à revelia dos outros países europeus?

Mas o que é isto?

Devia convocar -se só após a autorização do directorio e da Alemanha? Já chegámos a este ponto?

Anónimo disse...

Reescreve a tragédia grega esquecendo a incompetência de?

Mas quem reescreve a história é Jaime Samtos que há dois dias dizia falsamente que nao havia plano B.

Não se lembra? Porque não se corrigiu e pediu desculpa? Porque andou até ha pouco a defender Tsipras e agora diz que foi incompetente? Porque fala agora em incompetência e nao diz claramente que Tsipras traiu o seu povo e as suas convicçoes?

E porque quer à semelhança daquele Schauble de má memória ditar os termos do projecto referendario grego?

E vem ainda chorar lagrimas por outro traste traidor e co-responsável pela situação na Grécia chamado Papandreou?

Mas caro Jaime Santos o senhor pensa que a história se reescreve ao gosto do vendedor de banha da cobra de ocasião e que s memória é um pormenor menor?

Filipe Martins disse...

Tenta animosidade pelo Rui Tavares. Até dizem que ele está disposto a sacrificar os concidadãos para ficar na UE, que é elitista e que está à espere que a Europa mude.

Tanta ignorância que até cheira a má-fé. O Rui Tavares é europeísta mas não está à espera que a Europa mude sozinha. Ele tentou fazê-la mudar quando era Eurodeputado (eleito como independente nas listas do BE) e continua a fazê-lo como cronista e militante.

Eu admito sair do Euro, e até da UE, se tiver mesmo de ser. Mas tem mesmo, mesmo de ser! Mas anda «praí» uma certa Esquerda que parece pregar que sem Euro nos tornamos automaticamente numa Suiça da Europa do Sul, quando nunca fomos tal, fosse com que moeda fosse.

Anónimo disse...

Melhor resposta do dia

Anónimo disse...

Quanto à "tragédia grega", recordo o que Varoufakis revelou, em entrevista reproduzida no seu blogue, sobre a reacção de Tsipras quando ambos se encontraram logo que foi conhecida a vitória esmagadora do "Não" no referendo de Julho de 2015
[ https://yanisvaroufakis.eu/2015/08/03/9698/#more-9698 ].

Das palavras de Varoufakis - protagonista da "tragédia grega", a par de Tsipras - podemos salientar o seguinte: "I could tell he [Tsipras] was dispirited. It was a major victory, one that I believe he actually savoured, deep down, but one he couldn’t handle. He knew that the cabinet couldn’t handle it. It was clear that there were elements in the government putting pressure on him. Already, within hours, he had been pressured by major figures in the government, effectively to turn the no into a yes, to capitulate."

Outras confidências de Varoufakis - que se demitiu do governo grego poucas horas após o anúncio dos resultados do referendo - também não devem ser ignoradas:

a) "It wasn’t bad faith, it was a very definite plan. I called it the Schäuble plan. He has been planning a Greek exit as part of his plan for reconstructing the eurozone. This is no theory. The reason why I am saying it is because he told me so."

b) "We [Tsipras & Varoufakis] always thought that the European project, despite all its flaws … would be an opportunity for Europeans to get together, that maybe there would be an opportunity to subvert the original intentions and turn it into a kind of united states of Europe. And within that, to agitate for left-wing progressive politics. This was our mindset, how we were nurtured from a very young age."


Vejamos o que escreve José Gusmão: "Confrontadas com o resultado esmagador de um referendo que rejeitou as suas políticas, as instituições europeias arredaram esse momento democrático, recorrendo à chantagem da expulsão [do Euro]".

Infelizmente, esta narrativa - desculpabilizadora do SYRIZA - colide com o relato de Varoufakis. A chantagem da expulsão do Euro terá acontecido quando Varoufakis, na qualidade de Ministro das Finanças da Grécia, ainda reunia com Schäuble - ou seja, ANTES do referendo. Além disso, convém não ignorar que a chantagem só teve sucesso devido ao facto de o governo grego não querer mesmo uma saída do Euro: em parte devido ao "europeísmo utópico" partilhado por Tsipras, Varoufakis e outros responsáveis do SYRIZA, que acreditaram ingenuamente numa intervenção solidária de Hollande et al; em parte por não a ter preparado como devia, como aliás seria de esperar, atendendo ao dito "europeísmo utópico".

Tsipras, ainda ao leme do governo grego, aplica agora a receita austeritária - para ver se lhe concedem um alívio, ainda que infinitesimal, da dívida - e lá vai participando regularmente nas reuniões da "família socialista" europeia. Varoufakis criou um movimento "europeísta utópico" - DiEM25 - em torno de si próprio, e Rui Tavares faz parte do clube de fans.

A. Correia

Acácio Pinheiro disse...

Vamos lá, o texto é bom, mas define-se, e bem, como eurocéptico. Eu, enquanto velho internacionalista, não vejo qualquer vantagem para os trabalhadores e explorados do mundo na reafirmação dos Estados nação. E como economista não tenho dúvida que a soberania, num contexto de crescente globalização, não é solução. Nem para os portugueses, que veriam os seus niveis de rendimento cair brutalmente face à fragilidade do novo escudo, nem para os asiáticos ou africanos que têm direito a mais que uma malga de arroz. Dá vontade de lembrar a muitos soberanistas um slogan que ficou célebre - É a economia, estúpido. Este debate tem muito de passado mas pouco de futuro.

Anónimo disse...

As pessoas têm abordado esta questão com a mente demasiado fechada. Há muitas soluções...

Uma possibilidade é criação de uma nova moeda virtual que funcione em paralelo com o euro. Isso sim, ajudaria a diminuir o poder do BCE e de quem o controla sobre o nosso país sem "sair do euro".

Uma moeda com paridade em relação ao euro definida administrativamente pelo estado português será provavelmente apenas reconhecida a nível nacional, mas mesmo assim será útil como complemento ou substituto parcial dos salários em euros.

Acho que tal moeda deve ser puramente virtual, por ser mais fácil de criar e gerir (é o futuro), e o sistema que controla as transacções deve ser completamente controlado pelo estado português, o que permitirá evitar a fuga aos impostos e a economia paralela.

Gostaria que os partidos políticos discutissem abertamente propostas como estas e os detalhes de implementação. Isso ajudaria a diminuir a incerteza associada que tem afastado o voto popular.

Unknown disse...


Eu estaria na disposição de contrapor as suas sugestões / propostas, mas confesso-lhe que me é dificil fazê-lo quando nem sequer sei a quem estou a responder.

Estou e estarei sempre aberto a discutir o Euro, mas teremos ambos que admitir que escrever sob anonimato, não reforça a legitimidade de quem defende a solução de sairmos do euro, pelo contrário enfraquece a causa.

E escrever com pseudónimos, é igual.

Anónimo disse...

Acácio Pinheiro:

Pode-se todavia dizer que este debate tem tanto de futuro como o sr tem de passado.

Esta pedantice de fazer afirmações gratuitas tem destas coisas. Como jovem internacionalista não vejo qualquer vantagem para os trabalhadores serem dirigidos por estruturas pós-democráticas que os metem numa camisa de forças sem remissão.

E afirmações como esta "num contexto de crescente globalização"

Sim? tem a certeza? Uma malga de arroz para os coitadinhos dos africanos e dos asiáticos e a exploração à terceiro-mundo para os "preguiçosos dos trabalhadores do primeiro mundo?É isso mesmo Acácio Pinheiro?

Anónimo disse...

"A partir da vitória de Trump, os meios de comunicação hegemónicos lançaram uma avalanche de referências ao “proteccionismo económico” do governo imperial e, por consequência, ao possível início de uma nova era de “desglobalização”. Na realidade, a tomada de posse de Trump não será a causa dessa anunciada desglobalização, mas antes o resultado de um processo que deu o seu primeiro passo com a crise financeira de 2008 e que acelerou desde 2014, quando o Império reentrou em recessão.

Do ponto de vista do comércio internacional, a desglobalização avança desde há aproximadamente cinco anos. Segundo dados do Banco Mundial, na década de 1960, as exportações representaram uma média de 12,2% do PIB, na década seguinte passaram a 15,8%, nos anos 1980 chegaram a 18,7%, mas, até finais dessa década, o processo acelerou e, em 2008, alcançou o nível máximo, quando atingiu 30,8%. A crise desse ano assinalou o tecto do fenómeno a partir do qual se produziu uma descida suave, que se acentuou desde 2014-2015. A propaganda que dizia que as economias se internacionalizavam cada vez mais, condenadas a exportar porções crescentes da sua produção, foi desmentida pela realidade desde 2008 e agora a globalização comercial começa a reverter-se.

Mas as duas décadas de globalização acelerada foram principalmente um movimento de financeirização, de hegemonia total do parasitismo financeiro sobre o conjunto da economia mundial. O seu centro motor encontra-se nos EUA, estendendo as suas praças-fortes até ao conjunto do Ocidente e ao sócio oriental, o Japão. Os chamados “produtos financeiros derivados”, negócios especulativos altamente voláteis, verdadeiro coração do sistema, chegavam, no ano de 1999, a uns 80 biliões (milhões de milhões) de dólares, aproximadamente duas vezes e meia o Produto Bruto Mundial, logo essa massa expandiu-se vertiginosamente e, em 2008, um pouco antes do desastre financeiro, tocava os 683 biliões de dólares, quase 12 vezes o Produto Bruto Mundial desse ano. Ali alcançou o seu tecto histórico, cresceu depois muito pouco em termos nominais, de tal maneira que, até finais de 2013, chegava aos 710 biliões de dólares (9,3 o Produto Bruto Global desse ano), foi o começo da queda, já que, em Dezembro de 2015, havia caído para 490 biliões (6,6 vezes o Produto Bruto Global de 2015). A oligarquia financeira havia entrado em declínio, o que acentuou o seu canibalismo interno e as suas tendências depredadoras, não apenas na periferia, mas também no centro do sistema.

A esses processos económicos juntou-se uma profunda crise geopolítica, o expansionismo político-militar do Império foi travado no seu principal território de operações: a Ásia. Os dois rivais estratégicos do Ocidente, a China e a Rússia, estreitaram a sua aliança e foram arrastando para o seu espaço grandes, médios e pequenos estados da região: desde a Índia até o Irão, passando pelos países da Ásia Central. As recentes viragens da Turquia e das Filipinas, afastando-se da influência norte-americana e aproximando-se do espaço chino-russo marcam desde o Mar Mediterrâneo e desde o Oceano Pacífico, nos dois extremos da Eurásia, o declínio do domínio periférico do imperialismo ocidental. O fracasso dos EUA na Síria assinala o princípio do fim da sua omnipotência militar."

(Jorge Beinstein )

Anónimo disse...

"De facto, a decadência do Ocidente não implica a ascensão segura dos capitalismos de estado russo e chinês como novos donos do mundo, a crise está a chegar à China, o seu crescimento está em desaceleração, a Rússia está em recessão, ambas as potências são afectadas pelo declínio dos mercados ocidentais e do Japão, os seus principais clientes. Tratam então de compensar essas perdas estendendo os seus negócios e acordos políticos até à periferia, especialmente até ao espaço asiático. Talvez o mais ambicioso projecto chinês seja a “Nova Rota da Seda”, gigantesca massa de investimentos em infraestrutura e sistemas de transportes terrestre e marítimo distribuídas na Ásia, apontando à integração comercial do espaço euroasiático atingiria uns 890 milhões de dólares, segundo o Financial Times (3). Essa cifra poderia ser comparada com a do Plano Marshall que, em valores actuais, representaria cerca de 130 milhões de dólares, a China estaria empurrando para essa zona investimentos equivalentes a mais de seis planos Marshall. O problema é que todas essas economias que a China procura integrar estão a ser flageladas pela crise, a queda dos preços das matérias-primas deprime o conjunto da periferia, encurrala a Rússia, o Irão, as repúblicas centro-asiáticas… enquanto a Europa declina. A crise é global, obedece à dinâmica do capitalismo enquanto sistema planetário, à sua degeneração parasitária que degrada tanto os países centrais como os periféricos, emergentes ou não. A América Latina é agora vítima dessas trocas. Na sua retirada para o pátio das traseiras da história imperial, os EUA executam ali uma estratégia flexível e esmagadora de reconquista e saque que, em poucos anos, conseguiu deslocar os governos das Honduras, do Paraguai, do Brasil e da Argentina, encurralar a Venezuela e pôr de joelhos a cúpula da insurgência colombiana. De facto, essa reconquista tem lugar no quadro da crise económica, social-institucional, cultural e geopolítica do Ocidente que leva até ao pântano os regimes lacaios do continente. As vitórias direitistas do Paraguai, Argentina ou Brasil anunciam crises profundas de governabilidade. Onde os seus “governos”, na verdade, bandos de salteadores, geram com as suas acções grandes destruições do tecido económico e inevitavelmente a ascensão de protestos sociais massivos e crescentes. Dito de outra maneira, a actual investida direitista não é o começo da reconversão colonial da região, da instauração de uma nova ordem elitista, mas uma etapa de desordem, de revoltas populares ameaçando as elites dominantes. Enquanto a desglobalização segue o seu curso, as elites dominantes do planeta procuram desesperadamente preservar as suas posições, acentuam as suas disputas internas, começam a produzir salvadores pragmáticos de todo o tipo. Foi assim que irrompeu uma personagem grotesca como Donald Trump procurando combinar xenofobia, concentração de rendimentos, reindustrialização e recomposição do esquema geopolítico global. Ou os neofascismos europeus emergentes e os já instalados na América Latina. Trata-se de tentativas ilusórias de recomposição de sistemas decadentes que aprofundam ao mesmo tempo o saque, a dinâmica parasitária já vista ao longo da história humana acompanhando e acelerando os declínios imperiais".

(Jorge Beinstein)