quinta-feira, 27 de novembro de 2014
Aqui D’El Rei que é preciso investimento (público)
Apesar de ter presidido ao eurogrupo que arrasou a Grécia, Juncker, não empalidece, não cora, não pestaneja, quando diz ao Parlamento Europeu: “Vejo crianças em Tessalónica a entrar numa sala de aula nova em folha, cheia de computadores”.
O mesmo Juncker que em 2010 presidiu ao “aqui D’El Rey que é preciso acabar com o despesismo”, vê, como se só os burros não tivessem visto sempre, a necessidade de um impulso público ao investimento. Tem visões: fala de um novo Fundo Europeu para o Investimento Estratégico capaz de financiar investimento no valor de 315 mil milhões de euros sem gastar um cêntimo que seja de recursos públicos.
Como é que isto é feito? Juncker explica: Pega-se em 8 mil milhões do orçamento comunitário para apoiar uma garantia do tipo “se houver azar a gente paga” de 16 mil milhões, acrescentam-se outros 5 mil milhões do Banco Europeu de Investimento (se calhar também em garantias), mistura-se tudo e põe-se em reserva. São 21 mil milhões. Com estes 21 milhões em reserva, o Banco Europeu de Investimento pode emprestar 63 mil milhões para financiar projetos de investimento.
Mas para os 315 mil milhões faltam ainda 252 mil milhões? Ah, explica Juncker, isso é dinheiro de investidores privados.
Se bem entendo, e não é fácil entender, uma instituição financeira qualquer (se calhar o tal Fundo Europeu para o Investimento Estratégico) irá emitir títulos no valor de 252 mil milhões que serão adquiridos por privados para juntar aos 63 mil milhões do BEI e financiar os tais projetos do plano de investimento. Estes títulos – e isto é parte mais mal explicada - estão certamente cobertos por garantias públicas passíveis se de serem acionadas caso os projetos de investimento corram mal e não consigam remunerar os investidores financeiros privados.
Nesta engenharia catastrófica, o dinheiro público serve mais uma vez para anular o risco de investimento que é privado. Não há dinheiro público agora. Rezamos para que não haja no futuro. Uma gigantesca PPP.
É preciso investimento e tem de ser assim, diz Jucker, “porque o dinheiro não vai cair do céu. Nós não temos uma máquina de imprimir dinheiro. Temos de atrair dinheiro e fazê-lo trabalhar para nós”. Falso. A eurozona tem uma máquina que faz cair dinheiro do céu. Chama-se Banco Central Europeu. Essa máquina de fazer dinheiro está a comprar lixo tóxico aos bancos e outras instituições financeiras em grande quantidade. Esse dinheiro não é transformado em investimento produtivo (que cria emprego), mas canalizado de novo para ativos financeiros.
Desta forma o valor dos ativos mantém-se ou aumenta apesar da economia continuar estagnada. Os donos dos ativos agradecem. Juncker espera agora atrair parte desse dinheiro que circula na esfera financeira para o seu fundo, limpo de risco pelas garantias públicas e bem remunerado. Os donos do dinheiro agradecem.
E que tal se essa máquina de fazer dinheiro financiasse diretamente o investimento necessário? “Ah isso não pode ser porque senão os bancos e as instituições financeiras privadas ficavam sem as margens que alimentam o seu negócio parasitário”. “Ah isso não pode ser porque nós proibimos isso nos tratados da União”. “Ah isso não pode ser senão os orçamentos ficavam menos comprimidos e os trabalhadores e pensionistas ainda se iam lembrar de exigir a reposição dos salários e das pensões e se os salários e pensões são repostos lá aumentam os custos de trabalho e diminuem os nossos lucros que nós não utilizamos em investimento produtivo porque como os salários e pensões são baixos não há mercado para produtos e serviços e nós somos obrigados a “investir” em ativos financeiros e a alimentar bolhas especulativas que um dia vão rebentar de novo fazendo ir tudo pelo ar”. “Ufff. Desculpem lá, se calhar o que fazemos não faz nenhum sentido, mas não sabemos fazer outra coisa e entretanto ficamos ainda mais ricos”.
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4 comentários:
Óptimo! Linguagem que toda a gente entende!
“Ah isso não pode ser porque…”
É feitio, é uma espécie de Movimento Perpétuo Associativo…Muito bom artigo!
Subscrevo integralmente o referido por José M.Sousa e por D.H.
De
Não me lembro de ver este indivíduo nas listas de candidatura às eleições europeias.
Ah pois é verdade... foi "cooptado" posteriormente, e parece que a UE deixou de respeitar a democracia.
Gostei do artigo, mas custa a aceitar que o investimento que a UE precisa não seja feito de forma directa entre UE e estados
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