Face aos resultados das eleições de 2006, era claro para todos que o novo governo Prodi duraria pouco. A escassa maioria obtida nas duas câmaras do parlamento (em particular no Senado, onde o governo dependia dos votos dos senadores vitalícios para fazer passar as suas propostas), associada à diversidade de formações políticas coligadas na L'Unione - onde se incluíam os ex-comunistas convertidos em ‘reformadores’ (DS), ex-democratas-cristãos convertidos em centristas (Margherita), verdes pacifistas, dois partidos comunistas (PRC e PdCI), radicais e outras pequenas formações - não permitiam prever outra coisa.
Aquilo que conduziu à coligação de forças políticas tão diversas (para além do habitual oportunismo daqueles que viam a vitória desta coligação em 2006 como certa) foi, acima de tudo, a urgência de expulsar do Governo a direita de Berlusconi e dos seus aliados pós-fascistas e autonomistas (urgência essa que era patente no eleitorado de esquerda e centro-esquerda).
Por seu lado, a revisão da lei eleitoral orquestrada pelo segundo Governo Berlusconi nas vésperas das eleições colocava a esquerda numa posição difícil. O novo arranjo não só representava um regresso ao sistema proporcional (dificultando a existência de maiorias estáveis), como obrigava as várias forças políticas a anunciar antecipadamente o seu candidato a chefe do governo, isto num contexto em que a união à direita era muito mais fácil de conseguir do que à esquerda. Sobre esta reforma eleitoral, o dirigente da Lega Nord que a conduziu resumiu recentemente, de forma bastante elucidativa, a sua acção: «ho fatto una porcata!», disse.
Perante isto, e face à necessidade de reunir na mesma plataforma partidos com posições tão díspares relativamente a questões concretas da política italiana - das leis laborais à política externa, da relação com a Igreja Católica aos direitos civis, dos serviços públicos às questões ambientais - a coligação liderada por Prodi não conseguiu estabelecer um programa mínimo que vinculasse a acção das várias forças que a compunham.
Depois de 30 moções de confiança em 20 meses e de muita tensão entre as forças políticas da maioria, Prodi acabaria por cair graças à deslealdade de um pequeno partido liderado por um personagem pouco recomendável do Sul do país (o líder da Udeur está indirectamente implicado num conjunto de processos judiciais por tráfico de influências). Era o início de Berlusconi III.
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3 comentários:
"isto num contexto em que a união à direita era muito mais fácil de conseguir do que à esquerda"
Porquê? Esta talvez seja mesmo a questão central. Será que alguns dos partidos que entraram na coligação de Esquerda em 2006 eram mesmo de Esquerda (ou pelo menos centro-esquerda)? Não teria sido melhor arriscar uma derrota mas apostando numa coligação mais homegénea? Não é claro que a derrota acontecesse com a exclusão de alguns micro-partidos da coligação. Acho que a "certeza" da derrota da Direita terá levado bastantes eleitores a não sentirem necessidade de votar contra Bersluconi. Em resumo, acho que a Esquerda apostou numa vitória táctica que se revelou um erro estratégico. Por vezes é melhor (arriscar) os adversários ganharem de modo a sofrerem um ainda maior desgaste que resultará numa vitória mais confortável nas eleições seguintes. Por exemplo, se Bush não tem ganho em 2004 muito provavelmente os Democratas não estariam hoje perante a possibilidade de se tornarem o partido dominante dos próximos 10 anos, e no seio na nova geração de votantes, com maiorias sólidas no Senado e Câmara de Representantes, e o lugar de Presidente.
Sobre as dificuldades de união à esquerda escreverei num próximo 'post'. Quanto à opção de formar uma coligação de centro-esquerda vencedora em 2006, creio que foi algo a que os principais partidos da coligação se sentiram obrigados, perante a pressão de um eleitorado de esquerda fortemente mobilizado no combate ao governode direita. Os riscos eram claros, tanto para os 'reformistas' (cada vez mais centristas) dos DS e da Margherita como para a esquerda de 'protesto' (PRC, PdCI, Verdes), mas a penalização que sofreriam por parte do eleitorado de esquerda caso não houvesse entendimento seria seguramente maior.
Desta vez, e face ao fracasso da experiência de Prodi II (sobre isto também escreverei), a opção foi mesmo a de voltar à oposição. Vamos ver com que custos, para os protagonistas destas movimentações e para os italianos em geral.
Quando falei em construir uma coligação mais homogénea à Esquerda não estava a pensar na exclusão da Esquerda Radical :) Estava sim a pensar se teria sido mesmo necessário incluir em tal coligação sectores democratas-cristãos (UDEUR), que todos sabiam iriam criar conflitos com a Esquerda Radical. Aliás o governo Prodi II acabou por causa da UDEUR.
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