segunda-feira, 8 de fevereiro de 2016

Do not go gentle into that good night

Os artigos de opinião no Expresso estão cheios de animais. "Já não é carne nem é peixe, é um animal mitológico, tem tronco de anfíbio, cabeça de abóbora e próteses nos membros" (diz Pedro Santos Guerreiro). É "uma espécie de ornitorrinco, um mamífero keynesiano enxertado de ovíparo austeritário" (diz Ricardo Costa). "Um animal estranho" (diz Nicolau Santos). Para a maioria dos colunistas, a proposta de OE é um bicho sem coluna.

Mas estranhamente, ninguém se questiona sobre o que seria o bom OE. À excepção de Nicolau Santos, ninguém discute se este OE contribui para criar mais emprego, para absorver um milhão de desempregados (em sentido lato), se ajuda a atrair os quadros emigrados, se vai no sentido de se produzir mais e importar menos, de se resolver a camisa de onze varas em que Portugal se encontra. Nada. Apenas a pequena esgrima palaciana e, curiosamente, apenas ideias que entroncam na estratégia da direita - relatada pelo próprio Expresso - de mostrar que o "caminho de Costa não dá", o que obrigará o PS a adoptar mais austeridade para cumprir metas impostas e levar a "esquerda radical" a quebrar o acordo, forçando a queda do governo e a convocação de eleições antecipadas. Helena Garrido, no editorial de hoje do Jornal de Negócios, fala mesmo de "novas eleições que podem acontecer a qualquer momento".

A direita está tão convicta desta ideia que entrou em modo de campanha. O PSD sublinha que o OE é uma "manta de retalhos", Passos Coelho parte pelo país fora, protestando contra o "grande aumento de imposto" e o CDS fala de um "aumento significativo de impostos". Até parece um remake das eleições de 2011, quando Passos Coelho se enfurecia contra a austeridade de Sócrates, e que - verdade se diga - lhe deu a maioria absoluta.

Essa é igualmente a estratégia da Comissão Europeia que – obviamente – sabe o que deveria ser feito para criar emprego, mas prefere antes forçar medidas que puxam para baixo o crescimento económico e que, assim, ajudarão à mudança de poder em Portugal. É nisto que estamos envolvidos.

Mas tudo isto para fazer o quê depois? Baixar impostos? Aumentar a despesa pública? Criar mais desemprego ou manter o que temos? Promover a emigração?


Na entrevista a Mário Centeno, nem Bernardo Ferrão nem João Vieira Pereira – que agora se considera "democrata-liberal" e se sente a ser "empurrado de volta à direita", vítima do "bulling constante que existe sobre quem ousa pensar contra esta esquerda" – se lembraram de questionar o ministro sobre como resolver o problema do desemprego. Ou do défice comercial. Não. Estão mais interessados em mostrar que nada "parece sobrar muito neste OE daquilo que tinha idealizado", ou que "o modelo de crescimento foi descaracterizado", ou que o choque de rendimento é "um choquezinho".

Pedro Santos Guerreiro volta à sua tese de que este é o OE inverso do PSD/CDS e acomoda-se a que, "um país com a nossa dívida pública e privada tem anos de austeridade pela frente e estará muitos anos na navalha do resgate". Para Ricardo Costa, parece ser apenas um problema de gestão quotidiana: Se o governo "falhar, terá sérios problemas em conseguir aprovar o rectificativo". Sousa Tavares – que é contra a política de austeridade PSD/CDS - volta à velha teoria da "culpa" nacional (e não da troika, não europeia que, apesar da humilhação, nos estão a financiar). Na sua opinião, o OE serve para estarmos - de novo - "todos" a pagar para os funcionários públicos, quando seria preciso "despedir pelo menos, cem mil". Martim Avillez Figueiredo acha que os políticos são como ratinhos de laboratório que repetem rotinas erradas – "gastar mais do que a riqueza gerada". Ou seja, é necessário mais austeridade... Para Henrique Monteiro, tudo é simples. Há regras europeias - de austeridade - a cumprir. São os socialistas na Comissão que estão a pressionar os socialistas de Portugal e que Costa apenas foi populista ao criar um "inimigo externo", um passa-culpas. João Vieira Pereira acha que "a austeridade continua, como tinha de ser". Luís Marques acha que continuamos com a austeridade, mas com outro nome "aumento de impostos". Já nem falo de João Duque que usa uma coluna inteira sob a forma de diálogo "camarada, pá!", para dizer o mesmo que o Luís Marques.

A austeridade é a gravidade que força a submissão. Não é uma lógica económica: é uma lógica de poder. E face a esta nova conjuntura, apetece-me deixar um poema que ouvi num filme interessante ("Interstellar"). Do not go gentle into that good night (Dylan Thomas).

16 comentários:

Anónimo disse...

"A austeridade é a gravidade que força a submissão. Não é uma lógica económica: é uma lógica de poder"

lapidar.

Anónimo disse...

Um resumo - notável - do bas fond neoliberal que domina o panorama mediático. As hienas afiam os dentes e o Zeca tem uma canção a tal respeito.

Também aqui se desenrola a batalha

Jose disse...

Uma grande injustiça!
O orçamento diz tudo o que importa saber:
- quanto cresce a economia -
- quanto diminui o emprego -
- quanto crescem as exportações -
(o decoro inibe-me de assinalar tão extraordinários sucessos)
- melhora a vida de alguns, paga pelos novos impostos de todos.
- e...a Grande Obra! mantém a geringonça a trabalhar com o Grande Costa no poleiro!!!

Anónimo disse...

Vamos arranjar aos comentaristas profissionais sejam eles neoliberais, esquerda, direita, vermelhos ou azuis uma profissão verdadeira, um trabalho onde se produza algo que se possa dizer "ora aqui está uma coisa bem feita", melhor!! Uma profissão a sério e a ganhar o salário mínimo!

Sabem o que ia acontecer depois que os comentaristas fossem obrigados a sair da zona de conforto? Muitos desde comentaristas mudavam de opinião num piscar de olhos...

Anónimo disse...

Este OE não é de facto aquilo que devia ser. Mas com a imposição miserável da Comissão Europeia( entrar na UE foi, até hoje, o pior erro colectivo que este país já cometeu), parece que não podia ser de outro modo.
Estes gurus da direita estupida (que por aí e aqui abundam) que só se satisfazem com a miséria imposta pela UE e que clamam por mais e mais, deviam ter vergonha na cara.

Anónimo disse...

É simples: se o orçamento provoca tanto ranger de dentes aos Guerreiro, aos Costa Jr., aos Figueiredo, aos Ferrão, aos Tavares... é porque é um bom orçamento para mim e para os meus.

Anónimo disse...

Zé sabujo
não sejas mentiroso
beneficia a grande maioria da população através do rendimento e do baixar dos impostos directos e onera através de impostos indirectos
e mexeu no bolso dos teus amigos sim
a tal indecorosa isenção de IMI
~deve ser isto e outras coisas o que te doi
tadinho do sabujo zé
chora tanto o desgraçadinho do sabujo zé

Anónimo disse...

Habituados que estavam a nadar nas piscinas do Sr. PassosPortas nem se deram ao cuidado de verificar se estavam vazias…Agora com as tolas amachucadas no cimento, andam num triste desvario… Como se esvaziaram as piscinas?
Como me deixei levar?
Por isso e´ que o filósofo aconselhava a verificar se a piscina tinha água antes de mergulhar…
E´ vê-los, coitados, sem saberem, (ainda não acreditam) como a geringonça mudou de mãos e de rumo! Bem sabemos que o timoneiro e´ humano mas, quem segura o leme e o timão são os marinheiros – A Bitácula – lugar da bussola -- e´ um auxiliar de navegação. De Adelino Silva

Anónimo disse...

Quanto aos comentaristas profissionais. ... eu bem tento mas quase só vejo de direita, de extrema-direita ,com mais ou menos pozinhos dum neoliberalismo mais atroz. Contam-se pelos dedos duma mão os que têm acesso aos media mais importantes e que não sejam da área.
A demagogia é perigosa, mas quando os factos a desmentem assim duma penada...

Anónimo disse...

Uma grande injustiça?
O orçamento diz tudo o que importa saber?
Os "novos impostos de todos"?
Mas não foi este sujeito que foi apanhado em contra-mão nas suas referências tontas e desconexas aos impostos? Que anda por aí a desancar na redução do IVA à restauração e a gritar por "evidências " celestiais e por outras neoliberais?

"Dizer mal do Governo e dos políticos é o consolo geral…" dizia o mesmo indivíduo em vésperas das eleições legislativas. O poleiro a defender era o seu o o do outro e com outras intenções.

E fala em decoro,qual vestal virgem em processo de recuperação troikista em que se vislumbram ainda os seus berros a favor desta.

(E agora vem com estas cenas canalhas a tentar fazer o quê? É ler aí o artigo do João Rodrigues para se perceber o que o leva a tão deplorável espectáculo)

João disse...

A Comissão Europeia (que aqui invoco apenas como símbolo do poder sem rosto nem legitimidade das "instituições europeias") veste gravata e fatinhos de bom corte. Usa perfumes caros e frequenta os melhores salões. Mas a fisiologia é imparável e mesmo a quem assim traja e pisa, também prega as suas partidas. Uma delas é a comichão, por vezes torturante e apelando à coçadela misericordiosa nos momentos mais inoportunos. Se os ventos de Espanha se confirmarem, ainda que brandos,a Comissão Europeia (aquela em sentido próprio, como as que têm germinado por cá, sob as formas mais diversas e inauditas) vai ter muito onde coçar. Ainda que o momento seja o mais inoportuno.

Anónimo disse...

Sei que o ser humano visto a´ luz da moral e valores sociais actuais tem muito que se lhe diga… Defeitos, quem os não tem…Mas dai a estar contra aquilo que lhe da´ vida… A questoes básicas como o atendimento à saúde, a qualidade do ensino, a segurança social e a moradia, o emprego, criar um filho em sistema público eficiente, o amparo à velhice dos pais mas também o anseio por dignidade, reconhecimento e convivência pública, seria a sua autodestruiçao como ser politico, economico, social e ecologico.
E´ chegado o tempo do dialogo fraterno, mas esclarecedor, aberto mas firme no envolvimento… Cabe aos democratas e progressistas levar a palavra amiga ao seu semelhante…De Adelino Silva

Jose disse...

Dois comentários (22:14 e 22:58) que dão a verdadeira expressão do 'ser de esquerda'.
Tudo começa na Luta, toda ela estimulada por exaltantes pensamentos de domínio e humilhação do adversário; quando acreditam ter atingido o objectivo, explicam aos vencidos quanto bem lhes desejam e que todas as geringonçadas tiveranm por fim maior levá-los ao paraíso.
Em nós e nosso modo de ser é que está a salvação...onde é que já ouvi isto?

Anónimo disse...

"Mário Centeno promete benefícios fiscais às empresas para amortecer aumento do ISP

O ministro das Finanças, Mário Centeno, garante que o aumento do Imposto Sobre Produtos Petrolíferos (ISP) não terá impacto sobre a economia."
http://rr.sapo.pt/noticia/46509/

Esta nova declaração mostra bem a quadratura do círculo que é este Orçamento:
- Aumenta-se o ISP (o que é bom, porque consumir gasolina e andar de carro é mau para o ambiente e para as importações de petróleo);
- O aumento do ISP também é bom para o Orçamento;
- No entanto, o Governo reconhece que é mau para a Economia, porque aumenta os custos das empresas, ... Para remediar/contrariar o efeito do aumento do ISP decide benefícios fiscais às empresas. Segundo o próprio Ministro, com esta medida, "o aumento do Imposto Sobre Produtos Petrolíferos (ISP) não terá impacto sobre a economia." (leia-se empresas)
- Para "não ter impacto na economia", qual o efeito deste benefício fiscal no Orçamento?
- Se as empresas (será isto que quer dizer "economia") não vai sentir o efeito do aumento, serão então as famílias a pagá-lo? Os professores que todos os dias fazem centenas de quilómetros para dar aulas?

O Governo podia e devia fazer escolhas claras. Como muito bem afirma Daniel Oliveira no Expresso "O Orçamento é sempre uma mão que tira e outra que dá. A questão é sempre quanto tira e quanto dá a quem". O que não faz qualquer sentido é a multiplicação de medidas e contra-medidas, de novas regras e excepções (IVA da restauração só para a alimentação?) que são tudo menos claras. Decidam-se!!!!

Anónimo disse...

Tudo começa na Luta?
Mais uma vez o convite ao arrumar os trapos e a prestar obediência venerada?
Mais uma vez o pregão e a missa rezada para nos deixarmos levar pelas pantominices dos media fidelizados?
Mais uma vez a assumpção do direito do mais forte ao saque?

Lutar por uma causa, pela justiça social, pela dignidade humana deve fazer uma azia do caraças a alguns.
Entretanto não deixa de ser irónico ( ou profundamente hipócrita ) a história da "humilhação do adversário". Ainda não há muito eram repetidos à exaustão, com os sorrisos alarves de concordância, as atitudes de Passos sobre a pieguice de quem ficava desempregado ou sobre a saída da zona de conforto ou outras tretas acintosas do género.

Anónimo disse...

sabujo zé continua a chorar desalmadamente
até fala em humilhação e de domínio
ele que sempre falou de imposição da verdade às bestas à conta de pancadas nos cornos
sabujo zé agora quer ser o crocodilinho da anedota