1. Se dúvidas existissem de que Cavaco Silva permanece fiel à receita da austeridade «além da troika» e do ajustamento «custe-o-que-custar», elas teriam ficado dissipadas com as declarações que produziu na passada terça-feira, quando se referiu: ao «acesso fácil aos mercados financeiros»; aos «cofres cheios» de Maria Luís Albuquerque; à «economia [que] está a crescer» e ao «desemprego a cair». Sobre a sangria migratória, o alastramento da pobreza e o aumento das desigualdades, nem uma palavra. Como quem vende a retalho banha da cobra fora de prazo, o presidente colou-se uma vez mais à propaganda da coligação sobre o sucesso da austeridade e do programa de «ajustamento».
2. Ao sugerir que o país deve continuar no trilho de uma economia assente em baixos salários e no «empobrecimento competitivo» - em nome da obediência doentia e acrítica às regras europeias de disciplina orçamental - Cavaco parece não dar conta de alguns sinais interessantes que chegam do exterior, e que se somam à naturalidade com que «os mercados» acolhem a formação de um governo PS, com o apoio da maioria parlamentar que resultou das eleições de 4 de Outubro. Neste sentido, talvez o presidente devesse prestar mais atenção a declarações como as de Vítor Constâncio («a flexibilidade do PEC deve ser explorada totalmente»), ou ao recente reconhecimento, pelo BCE, de que «a política monetária está a falhar no essencial».
3. Mas não. Cavaco Silva prefere continuar a agitar fantasmas, rodeando-se em Belém de economistas - como Daniel Bessa - que se dispõem a rejeitar a vertente do «consumo interno», sem sequer reconhecer que a receita que defenderam, no início da crise, redundou num fracasso. Como bem lembra Pedro Lains, «repetir o repetido não faz uma verdade. A economia tem sempre pelo menos dois lados, oferta e procura, poupança e investimento, o interno e o externo e o que interessa são políticas equilibradas que tomem isso em consideração. É isso que o Programa económico do PS traz. O programa da troika adoptado com vigor pelo anterior Governo, esse, era seguramente para consumo externo. E falhou».
4. E «de onde vem o dinheiro?», perguntam muitos dos que querem que o eleitorado encare o acordo à esquerda como uma perigosa aventura de radicalismo e irresponsabilidade, congeminada na suposta capitulação do PS perante os devaneios do BE, PCP e PEV. O José Gusmão já respondeu, em artigo no Público que merece ser lido na íntegra. Detalhando as principais alterações introduzidas no programa eleitoral do PS, dele sobressaem, entre outras, três ideias essenciais: o acordo «foi negociado com base na premissa de que os compromissos financeiros de Estado português seriam observados»; as medidas acordadas «visam concentrar o estímulo económico nos rendimentos mais baixos, em detrimento de mais reduções contributivas para os empregadores»; «a folga orçamental obtida na TSU permitirá acomodar a mais do que provável derrapagem orçamental de 2015, protegendo por antecipação os rendimentos do trabalho e das pensões e o Estado social». Deixem pois de insistir em que não há alternativas consistentes e credíveis à agenda ideológica da austeridade. Elas existem, mesmo que o caminho seja estreito.
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6 comentários:
Já nem leio tudo!
Se não é com baixos salários que se resolve o desemprego que temos, quais as indústria ou actividades que podem pagar altos salários e que podem ser rapidamente criadas ou desenvolvidas?
E identificadas as indústrias e serviços (convém que predominantemente exportadoras -há uma balança a não desiquilibrar) qual a percentagem da população desempregada que terá aí uma oportunidade?
Estou farto de 'dever ser' sem considerar o 'poder ser'.
Porque que é que muita gente quer ser patrão e detesta ser empregado?...Se calhar é porque gostam de sofrer com os sacrifícios que a posição social de patrão lhes traz...Ganham menos, trabalham mais, alimentam-se e vestem pior, têm menos férias e se têm é na Praia do Aurélio, horários mais rigorosos, casas mais pobres, carros mais velhos e desgastados, animais cheios de carraças e pulgas, e ainda por cima quando velhos auferem reformas miseráveis...Vejam o Ricardinho Salgado a sair de casa -sua prisão domiciliária- para ir à missa, de carrinho novo em folha, pilotado pela filha -sua motorista particular- com uma mesada recente de 96 mil Euros de reforma. E tem Igreja em sua própria casa. Mas os Santos da casa não fazem milagres.
Meireles, o sarcasmo não disfarça a inveja!
José, meu!
Manda lá um ganda abraço ao Marco António, ao Miguel Macedo, ao Dias Loureiro.AH! e a essa verdadeira reserva moral do PSD, Duarte Lima.
Inveja de quem, do Ricardinho Salgado?...Só se fôr da reforma dele. Que jeito me dava.
-Até a dividia contigo, dava-te 5 mil por mês, com a condição de votares no Bloco de Esquerda ou no Partido dos Animais!
E mais 2.500 para abrires o portão e limpares os tapetes da entrada da Quinta das Gaivotas sempre que o PRECSilva&Esposa quiserem sair ou entrar em casa.É fácil e honroso, já que os admiras tanto. Até podias começar a acompanhá-lo e ajudá-lo a andar mais direitinho e sem aqueles tiques nervosos irritantes de esticar constantemente o pescoço, muito ao seu estilo pessoal e peculiar...E não o deixes mostrar a cremalheira. É assustadora...Parece o David Borges.
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