Este país em que os recursos são transferidos do público para o privado e em que os rendimentos são canalizados do trabalho para o capital, dos cada vez mais pobres para os cada vez mais ricos, «só» é de crise para a grande maioria. Para os outros, é um campo imenso de oportunidades de negócios, mais ou menos lícitos mas plenos de promessas de lucro. Quando os enquadramentos legais e institucionais são frágeis, ainda por cima num ambiente social em que a acção colectiva de contra-poderes cidadãos (sindicais, associativos, etc.) é insuficiente, os ambientes altamente competitivos e a promessa de lucros frágeis, no contexto atrás descrito, promovem todo o tipo de práticas lesivas do interesse público, corrosivas do bem comum. Mesmo sabendo que parte das dificuldades da acção colectiva também resulta da própria situação de crise – que leva os que mais precisam da mudança a dedicar todo o seu tempo à sua própria sobrevivência diária –, não podemos deixar de investir as forças que temos na organização do combate feroz a este sistema criado para gerar mais desigualdades, mais corrupção, mais vidas perdidas. O nome desse sistema é neoliberalismo e, por agora, os presos nas malhas da desigualdade somos nós.
Sandra Monteiro, Corrupção e desigualdades, Le Monde diplomatique - edição portuguesa, Dezembro de 2014.
Também sobre este país na edição portuguesa em papel: António Carlos Santos analisa “a revolução fiscal do governo”, ou seja, a revolução que aumenta a desigualdade, Bruno Monteiro faz a “autópsia social dos acidentes de trabalho em Portugal”, ou seja, a autópsia da geração e transferência de custos sociais para os trabalhadores e Filipa Vala discute a “excelência asfixiante” numa ciência cada vez mais condicionada. Os presos nas malhas de que fala Sandra Monteiro somos mesmo nós.
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