quarta-feira, 18 de dezembro de 2013

Suicídio Deflacionário

A estratégia deflacionária seguida em toda a zona euro, com efeitos mais acentuados nos países que estão a ser alvo de programas de ajustamento, empurra as dívidas públicas para níveis ainda mais insustentáveis. A taxa de inflação anual em Novembro na zona euro foi 0,9% e a mensal foi mesmo negativa (-0,1%). A Grécia e o Chipre tiveram taxas anuais negativas de -2,9% e -0,8% respetivamente e Portugal (0,1%), Irlanda (0,3%) e Espanha (0,3%) tiveram taxas próximas de 0%. Não só alguns países da zona euro estão já em situação de deflação, como os restantes apresentam taxas de inflação muito reduzidas. Uma inflação muito reduzida, conjugada com um crescimento real do PIB medíocre, tem consequências muito negativas na sustentabilidade da dívida pública. É o que acontece com Portugal atualmente.

Perante este quadro, e para garantir a sustentabilidade da dívida pública, a troika exige a Portugal saldos primários cada vez mais elevados que permitam cobrir o diferencial positivo da taxa de juro implícita na dívida e a taxa de crescimento do PIB nominal. O problema é que a receita da troika para saldos primários crescentemente positivos é mais austeridade e, como consequência desta, menos crescimento e menos inflação.

Este ciclo vicioso só agrava a já evidente trajetória insustentável da nossa dívida pública. Outra forma de vermos esta questão é analisando o efeito que a queda da inflação tem nos juros da dívida pública: apesar da taxa de juro nominal a dez anos ter baixado de 8,6% em Setembro de 2012 para perto dos 6% em Novembro de 2013, a taxa de juro real a dez anos manteve-se sensivelmente igual - aumentou ligeiramente de 5,3% para 5,6%. Isto aconteceu desta forma porque em Setembro de 2012 a taxa de inflação (média dos doze meses, INE) era de 3,3% e em Novembro de 2013 já tinha caído para 0,4%. Por outras palavras, a redução da inflação anulou os ganhos obtidos com a redução da taxa de juro nominal.

A dívida pública portuguesa entrou numa trajetória claramente insustentável e quanto mais depressa percebermos isso, mais depressa se perceberá a necessidade de a reestruturarmos.

(crónica publicada às quartas-feiras no jornal i)

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