sexta-feira, 22 de fevereiro de 2008

SEDES ou a ilusão do meio

A SEDES tem o mérito de juntar gente com posições políticas e ideológicas diversas e com conhecida intervenção e influência no debate político (de Ribeiro Mendes e Vítor Bento a João Ferreira do Amaral e Henrique Neto). Essa é a sua grande força e a sua grande fraqueza. A sua grande força porque as suas tomadas de posição públicas têm o impacto das coisas que pretendem superar as divisões que supostamente impedem a visão do conjunto. A sua grande fraqueza porque estas não podem deixar de ser a expressão de um mínimo denominador comum que produz documentos com muito pouca substância. É o caso do texto sobre o actual «mal-estar» nacional. Serve para muito pouco um texto sobre este tema que não refere uma única vez o problema da pobreza e das desigualdades de rendimentos e de riqueza (e sua tradução na criação de um país fracturado onde o acesso ao poder, a oportunidades e a recursos é muito díspar). A não ser para mostrar a ilusão do meio. Estou convencido que o mesmo não se diria de um documento sobre o «mal-estar» escrito apenas por Henrique Neto e por João Ferreira do Amaral. Seria certamente um documento menos difuso. Para começarmos a resolver a crise temos de ser radicais, ou seja, temos de ir à raiz dos problemas. Para então percebermos, por exemplo, o que realmente causa a corrosão da moralidade na vida nacional a que o documento alude. A SEDES, pela sua natureza, nunca conseguirá fazer isso.

9 comentários:

Anónimo disse...
Este comentário foi removido por um gestor do blogue.
Anónimo disse...

Na próxima semana já ninguém se lembra do que a SEDES disse. E ainda bem, diga-se. Aliás, acho que já quase ninguém se lembrava que a SEDES existia.


4 hero

Anónimo disse...

"Para começarmos a resolver a crise temos de ser radicais, ou seja, temos de ir à raiz dos problemas."

Gostei desta frase, mesmo não sabendo qual é raíz dos problemas.Aliás, até aposto que o João Rodrigues também não sabe.

4 hero

Anónimo disse...

o problema da pobreza e das desigualdades de rendimentos e de riqueza não é a raíz dos problemas. A raíz é seguramente ainda mais funda. Mas mesmo que fosse, quais são as medidas que poderiam ajudar a reduzir o indice de gini sem comprometer o crescimento do PIB?

4 hero

Renato Carmo disse...

Caro João, desde há uns posts atrás tens vindo a sugerir a necessidade de se organizar algo (um think tank, um grupo de trabalho, um núcleo...) que, se bem entendi, consiga aliar o conhecimento e a investigação científica a uma maior capacidade de intervenção política. Num post que escrevi em jeito de provocação referi que esse espaço deveria ultrapassar a questão económica e contemplar outras áreas do saber (não só sociais). Também referi que este deveria deter uma dupla função: denunciar o nível das assimetrias e dos desequilíbrios que constituem a sociedade portuguesa; e propor propostas viáveis para políticas públicas. Este assunto tem aparecido recorrentemente não só entre alguns blogues mas também em conversas recorrentes.
Bem, acho que chegou a hora de pôr mãos à obra e deixarmo-nos de meras intenções, "do temos que...". Já estou um pouco saturado de ideias e de eventuais projectos que ficam no ar e nunca assentam realmente. Também penso que a blogosfera não é o espaço mais adequado para pôr um projecto destes em marcha. O que precisamos é de substância e de presença.

Um abraço, Renato.

João Rodrigues disse...

4hero, acho que tem razão no primeiro ponto. Em Portugal estas coisas são frágeis. Porque será? Quanto ao segundo ponto, a questão era de método: não é possível que a SEDES possa fazer uma análise profunda dos problemas. Seria até estranho que
o fizesse. Para mim, as desigualdades corroem a legitimidade das regras instituidas e são um factor a ter em consideração no «mal-estar».

O chamado "trade-off" entre promoção da igualdade (equidade) e crescimento (eficiência) não é lei. E boas políticas de promoção da igualdade (redistribuição de certos activos e promoção de certos tipos de relaçõe sociais mais cooperativas) ajudam a promover a "prosperidade económica partilhada" que é sempre mais sustentável a prazo. Tem que se ir a montante e a jusante da "produção" e também "intervir" nas regras que a definem. Coisas simples: reforço da progressividade do sistema fiscal ou o fim de grande parte dos benefícios e deduções fiscais ajudariam na área fiscal. Imposto sobre as grandes fortunas teria uma dimensão expressiva importante. Assim como a reintrodução do imposto sucessório. Reforço do escrutínio público na determinação dos salários dentro das empresas também. Aumento da capacidade de intervenção dos sindicatos e comissões de trabalhadores também. Maior aposta na concertação social e na coordenação da evolução sectorial dos salários não faria mal nenhum. E depois há que reabilitar a ideia dos serviços públicos universais e gratuitos. Sem eles não há laço social que aguente. Este é o maior desafio.

Renato, ainda não respondi ao teu post e conto fazê-lo em post porque lança uma questão muito importante. Concordo que a blogoesfera não é o espaço para aquilo que queremos: «denunciar o nível das assimetrias e dos desequilíbrios que constituem a sociedade portuguesa; e propor propostas viáveis para políticas públicas». Vamos continuar a ter que "falar". Eu pelo menos não posso fazer mais do que isso neste momento...

Anónimo disse...

Antes de mais obrigado pela resposta. Quanto à SEDES acho que estamos de acordo. Eu é que me expressei mal. O que eu queria dizer é que muito daqueles senhores já tiveram oportunidade de contribuir para combater aquilo que agora constatam e, no entanto, nada fizeram. Ou seja, o discurso da SEDES soa mal. Se ao menos fizessem um acto de contrição! Na verdade, nada de substancial distingue os dias de hoje dos tempos em que muitos deles tinham funções governativas. Ou melhor, eu arriscaria a dizer que a grande causa do mal-estar actual está fortemente relacionado com a novela do BCP, nomeadamente com as retribuições e indemnizações verdadeiramente obscenas.

4 hero

Anónimo disse...

Quanto ao combate das desigualdades:

1-“redistribuição de certos activos e promoção de certos tipos de relações sociais mais cooperativas.”

Como princípio é pacífico. Arrisco dizer que à excepção de alguns ultraliberais sem expressão, tipo João Miranda, até o CDS o subscreveria. O problema surge quando se começa a materializar.

2-Tem que se ir a montante e a jusante da "produção" e também "intervir" nas regras que a definem.

Não percebi o que se quer dizer com isto.

3. reforço da progressividade do sistema fiscal ou o fim de grande parte dos benefícios e deduções fiscais ajudariam na área fiscal.

Ainda mais? 42% não chega? Que benefícios/deduções?

4-Imposto sobre as grandes fortunas teria uma dimensão expressiva importante.

Parece-me bem. Mas há inconvenientes nada despiciendos que conviria explicitar, para ficarmos todos conscientes do que se esta a falar.


5-“Assim como a reintrodução do imposto sucessório. Reforço do escrutínio público na determinação dos salários dentro das empresas também.”

Excelente.

4 hero

Diogo disse...

«Serve para muito pouco um texto sobre este tema que não refere uma única vez o problema da pobreza e das desigualdades de rendimentos e de riqueza»

Estou absolutamente de acordo consigo. Este documento é mais um sintoma do que um diagnóstico.