domingo, 24 de fevereiro de 2008
Dispositivos comuns para ganhar a luta das ideias
Renato Carmo afirma que «para um verdadeiro debate à esquerda (com consequências) é necessário, por um lado, denunciar as causas e os mecanismos que reproduzem o perene dualismo, e, por outro lado, encetar um caminho programático que avance com propostas concretas e viáveis». Nuno Ramos de Almeida também fala da «criação de uma agenda comum para a mudança que batalhasse para alterar a hegemonia no terreno das propostas». Acho que é por aqui. Vai assim ganhando força a ideia de criar um qualquer dispositivo que acumule e distribua com eficácia conhecimento «para uso comum de toda a esquerda que queira uma política de transformação» (NRA).
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2 comentários:
O trabalho de casa da esquerda:
Alguns comentadores de esquerda vêm na presente conjuntura de crise financeira global uma excelente oportunidade política face ao descrédito em que caíram as receitas neoliberais. Talvez tenham razão, mas para que os desejos se tornem realidade a esquerda ainda tem de fazer o seu trabalho de casa. Neste ponto, é importante não esquecer que os domínios ‘social’ e o ‘cultural’ têm autonomia relativa: a luta pelo poder, e por uma partilha dos recursos mais igualitária, é forçosamente orientada por conceitos, ideias, valores, ideologias. Ao mesmo tempo, a produção cultural inspira-se e emerge a partir das dinâmicas sociais. São domínios interdependentes mas são distintos. Foi a conjugação da Grande Depressão, seguida de uma Grande Guerra, com a luta intelectual pelas ideias keynesianas que conduziu, no século passado, a grandes mudanças na institucionalização da economia no seio das sociedades capitalistas mais avançadas.
Por si só, a crise não leva às “reformas estruturais” de que precisamos. Não leva, por exemplo, à consagração de uma política económica promotora do pleno emprego na Europa. Para que os movimentos sociais e políticos de esquerda sejam credíveis, não podem limitar-se a apresentar propostas vagas ou, como diz Thomas Palley,1 “uma lista de compras” de medidas de política económica. A tarefa da esquerda é bem mais exigente porque lhe é pedida a integração das suas propostas numa visão global convincente do funcionamento da economia. Segundo Palley, o discurso terá de ser feito pela positiva afirmando três vectores centrais: política de concertação social ligando os salários à evolução da produtividade, pleno emprego como objectivo explícito, sustentabilidade como critério de discussão dos défices.
Pela minha parte tudo farei para que a nova corrente de opinião socialista convocada por Manuel Alegre crie nos próximos meses algumas condições logísticas e intelectuais para que o trabalho de casa da esquerda se faça rapidamente.
Jorge Bateira
Caro Jorge,
A ideia de «encrustração» do Polanyi pode ajudar-nos a pensar essas relações. Desde que deixemos de ver a «economia» como uma coisa separada e a passemos a ver com uma teia de relações sociais, estruturada por regras, instituições e valores, por mim está tudo bem. Precisamos de quebrar barreiras.
A luta das ideias é crucial. De facto, o economicismo que espera a catástrofe nunca nos levou a lado nenhum. E todos somos poucos para este combate comum. Bom trabalho.
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