«Os níveis de produtividade dos trabalhadores no Luxemburgo estão 66 por cento acima da média europeia, o que lhe confere a quarta posição no ranking dos países mais produtivos da Europa. Portugal, que ocupa a 39ª posição, apresenta níveis 40 por cento abaixo. Se os imigrantes portugueses que trabalham no país regressassem, começariam o fim-de-semana às 17 horas de terça-feira e teriam direito a mais de sete meses de férias, porque produzem a um ritmo 2,7 vezes superior em território luxemburguês.» (no Público de ontem).
Pérolas destas repetem-se na comunicação social portuguesa. Vai-se incutindo na cabeça das pessoas a ideia de que «os portugueses lá fora trabalham tão bem ou melhor que os outros». Não deveria ser difícil a um jornalista que escreve num caderno de economia perceber que a «produtividade do trabalho» (e não «produtividade dos trabalhadores», como escreve a jornalista) é um indicador que consiste em não mais do que a simples divisão do valor da produção pelo número de trabalhadores. Logo, se o valor deste indicador é baixo, a única coisa que se pode concluir é que o valor (de mercado) do que se produz em Portugal é baixo tendo em conta a dimensão da economia nacional.
E porque é que o valor do produto nacional é tão baixo? Por diferentes motivos, nomeadamente: porque se produz muito em sectores de baixo valor acrescentado; porque a qualidade e sofisticação do que se produz não permite cobrar preços elevados pelos bens e serviços produzidos; porque mesmo quando se produzem bens e serviços de elevada qualidade não se consegue convencer os consumidores que esses produtos valem o preço que é pedido; ou porque, muitas vezes, quando os produtos são bons e até são reconhecidos no exterior há distribuidores que controlam o acesso aos mercados externos e que ficam com as margens de lucro realizadas.
As razões que conduziram a economia portuguesa a esta situação são várias e nem sempre simples de descortinar. Entre as principias candidatas estão: uma industrialização que se deu demasiado tarde para que a indústria portuguesa conseguisse afirmar-se naqueles sectores de elevado valor acrescentado onde só há lugar para um número reduzido de empresas a nível internacional; o facto de as poucas empresas nacionais com escala para competir a nível internacional sempre se terem interessado mais por explorar as rendas garantidas no mercado nacional (com o apoio generoso dos poderes públicos); o facto de o investimento em factores de inovação e qualidade (que permitiriam criar marcas próprias em bens e serviços sofisticados, mas que levam alguns anos até garantirem retorno) sempre terem sido preteridos em favor de investimentos com retorno imediato; um nível de qualificação dos portugueses (tanto trabalhadores como gestores) que dificultou o 'upgrading' das capacidades de produção; entre outras.
Será que a jornalista do Público não percebe coisas tão básicas? Será que está mesmo convencida que os portugueses que vivem no Luxemburgo trabalham mais do que em Portugal (talvez por causa do frio, ou por que se aborrecem de morte no Grão-Ducado) e que isso expica a diferença na «produtividade do trabalho»?
Um aviso aos desatentos: esta notícia do Público serviu para anunciar um novo programa da :2, «Economia do Mês», apresentado por uma das maiores fraudes das questões de Economia em Portugal, Vasconcelos e Sá. Para comentar os dados referidos no início, a jornalista não encontrou ninguém melhor do que essa outra fraude, tão ideologicamente empenhada como a primeira, que é Pedro Arroja. Não admira que quase ninguém tenha paciência para a imprensa económica em Portugal.
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8 comentários:
Sem discordar de um modo geral com a sua análise acho que se esqueceu de outros factores. Se as fracas insituições e empreendedorismo de (relativamente) baixa qualidade podem ser responsabilizadas também não se pode esquecer dos factores inerentes aos próprios trabalhadores. O emigrante é, em si, um empreendedor. Tem uma aversão ao risco, ponderada de condicionantes familiares, inferior à de outros compatriotas que não quiseram arriscar. Por outro lado, conseguiram detectar vantagens comparativas em trabalhar noutro país: para as suas qualificações e para a especificidade do seu trabalho, este é bem melhor pago nos países de acolhimento do que cá. A razão é a escassez desse tipo de trabalhadores. Concluindo, acho que os emigrantes são pessoas com mais potencial que os restantes portugueses, pertencentes à mesma "classe". O mesmo creio que se passa com os Imigrantes que vêm para o nosso país. Pena que não se dê melhor aproveitamento do seu potencial por cá.
Mas não acontece a mesma coisa quando os trabalhadores portugueses trabalham em Portugal para empresas estrangeiras ? Uma das principais razões da diferença de produtividade está na organização das empresas assim como na motivação dos colaboradores e do reconhecimento do seu trabalho, factores alheios à esmagadora maioria dos empresários (patrões) portugueses.
Fala-se sempre muito em qualificações e formação dos trabalhadores, mas nunca na formação dos empresários, os principais responsaveis, em meu entender, pelos niveis de produtividade do trabalho.
esta é uma questão muito complicada:
Passa pela legislação laboral,competências so empresários, condições de trabalho, visão estratégica das empresas,...
assunto também discutido em
http://vilaforte.blog.com/
É importante considerar que no Luxemburgo estão sediadas gigantes da Banca, Seguradoras, da Bolsa e correctoras de investimentos, actividades muito lucrativas captando dinheiro de todo o mundo, factos que influenciam de imediato e positivamente qualquer rácio económico principalmente de um pequeno país (se o fizeram no gigante da China fácil será perceber o impacto num pequeno país). Só isto faz uma enorme diferença.
Existem outras diferenças como a justiça no Luxemburgo funciona e rápido (sem justiça não há desenvolvimento). Os serviços públicos são eficientes inclusive na saúde. A educação é boa e finalmente é incentivado a Organização a todos os níveis, coisa que em Portugal continua no patamar do desenrascanço. No Luxemburgo é impensável desperdiçar-se energias em projectos de eficácia dúbia como o Aeroporto na Ota. No Luxemburgo não se refazem todas as pontes cada vez que se alarga uma auto-estrada. No Luxemburgo não se 'abate' a agricultura ou a pesca.
Não é uma questão de cidadão mais ou menos produtivo mas sim de uma estrutura social equlibrada e dinâmica.
Concordo com o seu postal, gostaria, no entanto, de referir que talvez a frase "sectores de elevado valor acrescentado onde só há lugar para um número reduzido de empresas a nível internacional" seja menos defensável.
Acredito que estamos numa trajectória de explosão das opções colocadas à disposição dos consumidores a nível mundial, o que vai dificultar o poder das grandes corporações. Se quiserem ir a todas terão de lidar com tanta complexidade que acabarão por tombar sob o efeito do seu próprio peso. O que as pequenas empresas têm de fazer é escolher onde querem e podem fazer a diferença com vantagem.
No caso do Luxemburgo, também não sei se essa elevada produtividade não será uma ficção (comparável ao elevado PIB "criado" em Lisboa pelas empresas cuja sede social está em Lisboa).
>No Luxemburgo não se 'abate' a agricultura ou a pesca.
-Franca
pesca: deve ser a eficiencia da marinha de guerra luxemburguesa...
agricultura: e uma pena o abate da milenarmente dinamica agricultura portuguesa...
pz
pz:
"agricultura: e uma pena o abate da milenarmente dinamica agricultura portuguesa..."
Importa-se de dar dois ou três exemplos do que foi feito para a tornar "dinâmica". Não vale referir a canalização de fundos europeus para a aquisição de carros de alta cilindrada...
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