domingo, 10 de julho de 2022

Querido diário - Chumbo

Público, 6/7/2012

Na altura, foi mesmo uma pedrada no charco.

Andava o governo alegremente a querer fazer as suas revoluções neoliberais, passando por cima a Constituição (essa letra morta; os sindicatos a tentar resistir como podiam e a contrapor-se àquele discurso de inevitabilidade, que "tinha de ser assim" a bem das empresas e da competitividade nacional. Que apesar de termos 22% de pobres e de 40% de pessoas pobres antes de apoios sociais, todos "nós" tínhamos "vivido acima das nossas possibilidades" e agora tínhamos expiar as nossas culpas e pecados à luz do Santo Ofício dos princípios das instituições da troica. Que apesar de se ter saído de uma crise internacional, a melhor forma que Portugal tinha de sobreviver era - não promover os rendimentos, a procura e a produção nacional - mas asfixiar o rendimento, transferir rendimentos dos trabalhadores para as empresas (cortes de feriados e de dias de férias, corte na retribuição salarial do trabalho suplementar, cortes nas compensações por despedimento, cortes no subsídio de desemprego, etc., ) e aumentar o desemprego, para forçar os desempregados a aceitar mais baixos salários e, assim, tornar possível às empresas reduzir a sua massa salarial e aumentar as suas margens e lucros; tudo para reduzir o consumo, o investimento e, no final, as importações. E agradar aos mercados financeiros que nos "emprestaram"  dinheiro a elevadas taxas porque os cânones liberais impedem o Estado de emitir moeda própria, de forma gratuita.

Vivia-se um estado político de emergência provocada, semelhante a um golpe de Estado, a um Estado invadido, em que todas as medidas se tornam possíveis, sem que haja oposição.  

Mas aos poucos começou a haver. 

E o que veio depois a acontecer, provocou uma tal hecatombe à direita, da qual, passados dez anos, o CDS não recuperou e o PSD ainda mal se refez tendo, para sarar as suas feridas - espanto político! - reabilitado precisamente a equipa responsável pelo desastre nacional que foi a aplicação da receita neoliberal em Portugal, da austeridade redentora. E até com as mesmas caras, mas agora branqueadas e lavadas pela comunicação social, porque, afinal, tinham tido funções menores no desastre...! Grande alívio.

A direita entrou, pois, numa crise que, aos poucos, está a ceder a passagem à extrema-direita, seja ela a dos jovens neoliberais urbanos ou a da tropa de choque proto-fascista, criada e alimentada para, quando for necessário, ser capaz de bater a esquerda nas ruas. 

Mas a direcção do PS deveria estar atenta aos sinais que se vão formando pelo descontentamento das suas cedências a uma agenda europeia neoliberal, acelerada militarmente pela guerra em vários continentes. Que o PS não se torne - em mais um estado de emergência provocada - no mordomo europeu da preparação dos jovens nacionais para uma guerra que não é nossa. 


3 comentários:

Anónimo disse...

O PS está a um passo de ser irrelevante, os militantes do partido é que ainda não se aperceberam disso.

Anónimo disse...

O Povo de Esquerda não tem hoje uma Alternativa credível,um PS "amarrado" as politicas neo-liberais de Bruxelas e as Esquerdas irrelevantes,sem serem capazes de construir um Polo aglutinador,plural e abrangente capaz de mobilizar os cidadãos.

Anónimo disse...

Quais militantes?