quarta-feira, 20 de setembro de 2017

Esperar, acabar


O comentador de assuntos económicos do Financial Times, Wolfgang Münchau, tem razão quando afirma que “as eleições alemãs são o Godot de 2017”. Mas como aqui assinalei em 2013, ainda que sem recorrer a uma metáfora literária, já as eleições desse ano o tinham sido.

As duas alas do partido exportador alemão manterão o essencial do arranjo económico e monetário europeu intocado, já que tem servido bem os seus interesses. E se mexerem nele será para reforçar a sua vertente disciplinar, acompanhada de um ou outro incentivo para manter as periferias no redil. Nem têm de fazer grande esforço, já que a “imaginação do centro” ainda tem muita força entre as suas elites.

Entretanto, a confirmarem-se as sondagens, o SPD pagará outra vez um preço eleitoral elevado por não ser mais do que uma das alas do tal partido e uma que já apostou na redução dos direitos sociolaborais. O ordoliberalismo está bem entranhado. Há mais de um século, um social-democrata alemão disse que o movimento seria tudo. Aparentemente, o movimento acabou também ali onde começou.

7 comentários:

Pedro disse...

Os partidos social-democratas traíram a social-democracia.

O caso alemão traduz a gradual infiltração de uma clique de extrema-direita neoliberal que se apoderou do SPD. Trata-se de um grupo organizado e o seu lema em relação á vida interna do partido, "nada sem nós" demonstra bem o grau de controle da extrema direita dentro do partido "social-democrata".

Anónimo disse...

Sintético e claro.

Com um bónus adicional. O de termos a oportunidade para voltar a ler o excelente texto de JR : "O fim do movimento"

A.R.A disse...

Martin Schulz e quejandos ainda não teve a sobriedade politica suficiente para perceber que,consigo ao leme do SPD, mesmo após a ressaca da crise provocada pela bebedeira neoliberal de um capitalismo selvagem viral, a crise nunca foi economica mas sim de matriz marcadamente ideologica onde a maioria dos grandes partidos da Internacional Socialista se descaracterizaram perante o seu eleitorado diluindo-se numa especie de direita moderada ao centro com uma ambição bacoca de ficar com o "melhor" dos 2 mundos: aglutinar os centro esquerda e os centro direita num só.

Resultado: A direita radicalizou-se e a esquerda socialista dispersou em debandada

Pois ... até Socrates assim seguiu durante mandato e meio, mas, a prática demonstrou o quão inocua se revelou tal empresa e a crise socialista europeia reflecte-se naquela cena da orquestra a tocar enquanto o barco se afunda.

Por cá, temos uma ilha ao estilo tubo de ensaio, e só ainda não se tornou a Meca das Esquerdas Unidas em torno do socialismo (o do punho erguido e não da rosa, leia-se) porque ainda nos achamos demasiado perifericos para tal.

Antonio Costa tem uma oportunidade única ao convergir ideais e ou criar consensos com os 2 partidos a sua esquerda mas para isso terá de ter a coragem suficiente de limpar a sua casa dos espinhos das rosas ressequidas e ressabiadas (não esqueço o boicote preconizado pelos seus camaradas á sua campanha) e afirmar-se como baluarte do socialismo europeísta democratico e descomplexado quando o caminho a seguir é o de uma esquerda "descentralizada" em conjunto com os outros partidos da sua familia politica em pról do bem comum.
* embora não venha qualquer mal ao mundo pensar num hipotectico fim do Euro ou até de Portugal ser convidado a sair

Enquanto Schulz não tiver 100% sobrio e olhar com olhos de ver para o que se passa em Portugal a CDU será sempre um vencedor antecipado ora com maioria absoluta ora coligado e é por aí que Schulz se tem perdido pois dá a entender que procura votos suficientes para negociar uma possivel coligação sem nunca sequer aspirar a uma vitoria.

Eu, se tivesse que fazer alguma menção literária para caracterizar a acção de Martin Schulz, ao invés de «a espera Godot» eu chamava a liça "A Metamorfose" ou parafraseando Kafka: (...)Crer-se no progresso não significa que já tenha tido lugar qualquer progresso(...)

A.R.A

Jaime Santos disse...

Pois, João Rodrigues, verta lá as suas costumeiras lágrimas de crocodilo pelo ocaso da social-democracia. Quem sempre a combateu não tem agora moral para a vir defender. Mas, de facto e até mais ver, a maioria dos eleitores alemães parece satisfeita pela manutenção do status quo, pelo que da Alemanha devemos esperar o que dela obtivemos até agora. Entretanto, aconselho-lhe a leitura da última posta do Ricardo Paes Mamede. Se há uma coisa que a economia portuguesa não precisa é de turbulência. Por isso, livre-se, a si e aos seus companheiros de viagem anti-Euro, de fazerem alguma coisa que a faça descarrilar dos eixos. Pagarão isso caro nas urnas...

Geringonço disse...

Parece-me que o João Rodrigues não dá grande crédito a esse bem estar generalizado na Alemanha.

O que é a leitura mais correcta. Não faz sentido dizerem que a Alemanha é o “El Dourado” para o comum dos mortais quando na realidade a força do mercantilismo alemão construiu-se reprimindo os trabalhadores alemães.

Que bom para Merkel e Schauble terem os “piegas” e “preguiçosos” do sul que possam apontar o dedo.
“Vejam meu povo melhor que os outros, vejam aqueles lá do sul!”;
“Vejam como sofrem pelos excessos do passado!”;
“Nós os alemães não somos como esses do sul, nós somos trabalhadores e sérios!”.

É uma narrativa que tem sido utilizada há anos para que a podridão neoliberal continue...

Anónimo disse...

Não Jaime Santos.Não há quaisquer lágrimas de crocodilo pelo ocaso da social-democracia.

O que há sim é a denúncia daquilo em que a dita social-democracia se converteu:

“Outrora, nos anos fundadores da Segunda Internacional, tinha por objectivo o derrube do capitalismo. Depois tentou realizar reformas parciais concebidas como passos graduais para o socialismo. Finalmente, passou a ser favorável ao Estado-Providência e ao pleno emprego no quadro do capitalismo. Se agora aceita a destruição do primeiro e o abandono do segundo, em que tipo de movimento se irá tornar?”

Anónimo disse...

"Quem sempre a combateu não tem agora moral para a vir defender"

Não JS. Isto não tem nada a ver com "moral". A moral é outra coisa. A ética outra ainda.

E não JS. Se reparar bem o que está a tentar é desviar o assunto para um lugar que lhe devia estar auto-interdito, se respondesse eticamente perante si próprio. Do que se trata é dum balanço histórico do que tem sido a social-democracia. Infelizmente para todos nós.

Não há qualquer defesa deste caminho trilhado pela social-democracia. Não percebeu o que leu ou também lhe está entranhado este discurso em forma de cassete?