quinta-feira, 23 de fevereiro de 2017

Os infernos fiscais repetem-se


Perante o enésimo escândalo envolvendo infernos fiscais, podemos repetir duas ou três coisas, baseando-nos em parte numa boa análise desta pouca-vergonha institucionalizada.

Em primeiro lugar, os infernos fiscais são o produto deliberado da acção de muitos Estados desenvolvidos, os principais nós da rede dos paraísos fiscais, da Suíça à Grã-Bretanha, passando pelo Luxemburgo. Os infernos fiscais mais ou menos tropicais são muito falados, mas são apenas as periferias de uma rede.

Em segundo lugar, esta rede foi tecida sobretudo a partir dos anos setenta e é indissociável do fim progressivo, em particular nos países mais desenvolvidos, dos controlos de capitais, parte do processo mais vasto de privatização e liberalização dos sistemas financeiros; no continente europeu, este é o outro nome da integração europeia. Não há crise num banco que não passe por um inferno fiscal.

Em terceiro lugar, os supostos cosmopolitas progressistas, que nos dizem que a solução depende exclusivamente de acordos europeus ou globais, são aliados objectivos deste estado de coisas. Não é que a cooperação internacional não ajude. Ajuda e muito. Mas na sua base têm de estar acções nacionais unilaterais. Estas passam por reinstituir controlos de capitais, por regular o sistema financeiro de forma muito mais apertada, também através da socialização da sua propriedade, por deixar de depender de poupança externa. Por desglobalizar, a começar pela finança, em suma. Só assim os infernos fiscais podem vir a perder alguma da sua relevância.

É claro que há um detalhe que nos interessa por cá: a liberalização financeira está no ADN da integração europeia, do Euro. Em economia política isto está mesmo tudo ligado.

Texto publicado neste blogue a 4 de Abril de 2016. 

12 comentários:

Anónimo disse...

Comentários para quê, esta tudo dito... A não ser, se eu não for multado ao preso, possa dizer mais alguma coisa....
Por fim: Só na na presença da minha advogada..

Anónimo disse...

Um excelente post.
Obrigado

Anónimo disse...

A liberalização financeira está no DNA do euro.
Na mouche

Anónimo disse...

lol

Aleixo disse...

Algum dia, para acabar com os paraísos fiscais, ainda hão-de dizer que é necessário...unanimidade!

Jaime Santos disse...

E a nacionalização da propriedade está no ADN da Esquerda radical. Compreende-se, o pensamento é o mesmo da Direita, 'never let a crisis go to waste'. Eu gostava de perceber como é que o João Rodrigues pretende que uma Economia não dependa da poupança externa. Só vejo duas maneiras possíveis. Uma é a defendida pela Direita, deficit zero (ou mesmo superavit orçamental) e redução da dívida para uma fração negligenciável do PIB através de austeridade contínua. O Ricardo Paes Mamede discutiu essa possibilidade abaixo. A outra passa por um incumprimento do pagamento de dívida (uma reestruturação negociada nunca se faz sem condições) e limitação 'ad nauseam' das trocas comerciais com o estrangeiro (sem moeda forte não há importações nem se consegue defender a moeda local que vem por aí abaixo). O que se segue é inflação. Por outras palavras, e isto nunca é assumido no seu discurso, a solução dos nossos problemas económicos é pôr as poupanças dos Portugueses (menos dos ricos claro, que as conseguem pôr a salvo a tempo e horas) a pagar a crise...

Anónimo disse...

Os infernos fiscais são os países europeus, onde se acha ético taxar 80% dos rendimentos a alguém como em França. Achar ético, apenas porque tem força de lei, taxar 80% de rendimentos a alguém, isso sim é um inferno fiscal.

Anónimo disse...

Quem diria ver Jaime Santos a enxofrar-se assim tanto quando se denunciam os "infernos fiscais"?
E a falar na "nacionalização da propriedade" desta forma tão expedita, como quem quer arranjar um pretexto para não falar no que é denunciado?

Vejamos JS:
Os infernos fiscais "são o produto deliberado da acção de muitos Estados desenvolvidos, os principais nós da rede dos paraísos fiscais, da Suíça à Grã-Bretanha, passando pelo Luxemburgo".
JS não gosta que se aponte o dedo aos "estados desenvolvidos" mentores destes infernos?

Anónimo disse...

A "rede foi tecida sobretudo a partir dos anos setenta e é indissociável do fim progressivo, em particular nos países mais desenvolvidos, dos controlos de capitais, parte do processo mais vasto de privatização e liberalização dos sistemas financeiros; no continente europeu, este é o outro nome da integração europeia. Não há crise num banco que não passe por um inferno fiscal".

JS não gosta que se lembre tal. No fundo ele associa-se a uma social democracia que se tornou liberal-social. Que traiu os seus (poucos) compromissos com o mundo do trabalho. Por isso alguma acrimónia da sua parte quando perante factos que fazem tombar por terra os seus dogmas de economia política

Anónimo disse...

"os supostos cosmopolitas progressistas, que nos dizem que a solução depende exclusivamente de acordos europeus ou globais, são aliados objectivos deste estado de coisas".

Parece uma verdade irrefutável. E a prova é o labor do próprio JS

"Não é que a cooperação internacional não ajude. Ajuda e muito. Mas na sua base têm de estar acções nacionais unilaterais. Estas passam por reinstituir controlos de capitais, por regular o sistema financeiro de forma muito mais apertada, também através da socialização da sua propriedade, por deixar de depender de poupança externa. Por desglobalizar, a começar pela finança, em suma. Só assim os infernos fiscais podem vir a perder alguma da sua relevância."

Ouvir falar em desglobalização põe os nervos à flor da pele dos pretensos "cosmopolistas progressistas". Estranhamente o mesmo acontece quando se fala na desglobalização da finança.Porquê?
A pergunta incómoda persiste. Querem ou não estes cosmopolitas acabar com os proxenetas dos infernos fiscais?

Anónimo disse...

A frase-chave é esta:

"a liberalização financeira está no ADN da integração europeia, do Euro"

Os factos são mesmo uma coisa lixada.

Anónimo disse...

Ao anónimo das 13 e 01:

Por favor não diga disparates. Vá lá aprender o que é Ética. E depois saiba o que é ético.

Depois da casa arrumada poder-se-á passar aos "infernos fiscais" que o deixam tão incomodado