Este texto foi escrito no dia 2 de Julho para o blogue Democracia Solidária, agora com problemas no acesso:
Como sabemos, o BCE manteve o limite da liquidez fornecida aos bancos gregos. Todos os observadores independentes e bem informados já concluíram que o BCE está a seguir uma estratégia de estrangulamento dos bancos para provocar a queda do governo. O dinheiro disponível mal dá para aguentar até domingo. É estranho que Tsipras continue a querer negociar, mas também é verdade que não tem mandato para tirar o país do euro. Há uma terceira hipótese que poderá explicar muita coisa: expulsão da Grécia contra a vontade do governo.
Admitamos que não há colapso nos pagamentos das máquinas ATM até ao referendo. Com uma vitória do SIM, o governo grego será derrotado e voltará a Bruxelas com outro ministro das finanças (Varoufakis já disse que se demitiria). Por outro lado, na 2ª feira, o BCE sentir-se-á obrigado a dar mais alguma liquidez aos bancos gregos enquanto decorrem novas negociações.
Abre-se então um novo processo negocial para o 3º resgate e, mesmo que se recupere o último documento das negociações técnicas, vai ser preciso esperar pela ratificação dos parlamentos do Eurogrupo para dar base jurídica às novas negociações. Sabe-se também que Angela Merkel e vários outros líderes já não suportam ter Tsipras à sua frente. Querem correr com ele, também para servir de exemplo. Um importante sector do Eurogrupo vai querer empurrar as negociações para além de 20 de Julho, data em que se vence um importantíssimo pagamento ao BCE. Mais ainda, o governo grego condiciona qualquer acordo (com mais austeridade) a uma reestruturação da sua dívida, enquanto os credores só estão dispostos a falar disso após a execução das reformas neoliberais e dos cortes austeritários.
Portanto, há uma grande probabilidade de a Grécia falhar o pagamento no dia 20, por manutenção do impasse negocial. A lógica da linha dura é esta: estamos fartos de pôr dinheiro neste buraco sem fundo. Aguentaremos o abalo da saída da Grécia. Porém, um incumprimento da Grécia para com o BCE levá-lo-á a suspender toda a liquidez e a pedir o reembolso do que a Grécia deve. Para não ter de encerrar definitivamente os bancos, o governo grego demitirá o actual presidente do Banco da Grécia e passa a emitir uma moeda paralela (em larga medida apenas electrónica, mais alguns títulos de dívida em papel que passam a circular como meio de pagamento). Será de facto, mas não de jure, uma saída do euro (primeira etapa) e o governo grego protestará contra a UE por estar a ser expulso da zona euro pelo BCE. Este estaria a violar o seu mandato criando uma situação ilegal.
Admitamos que vence o NÃO, talvez com uma margem muito pequena. Nesse caso, na 2ª feira o BCE suspende o regime de emergência que ainda está a funcionar e, mesmo que o não faça, a liquidez esgota porque já quase não existe. Para não ter de encerrar os bancos por tempo indeterminado e criar o caos total, o governo emitirá uma moeda paralela e, como acima descrito, clamará contra a sua expulsão da zona euro, de facto mas não de jure. De facto, não há nada escrito nos tratados sobre saídas do euro, voluntárias ou não.
A saída da Grécia do euro é quase inevitável. Se a liderança do Syriza tiver percebido isto, talvez façam sentido as manobras de última hora que, pelo menos à primeira vista, parecem ser de desorientação e rendição. Se desde há algum tempo (talvez Abril) tiverem chegado à conclusão de que não faz sentido continuar a negociar, quando do outro lado só lhe oferecem políticas absurdas e destrutivas, então talvez possam estar a executar um plano secreto. Como diz Ambrose Evans-Pritchard no Daily Telegraph, podem estar a comportar-se como "Leon Blum, em França, que teve de dizer mentiras para libertar o seu país do Padrão Ouro em 1936."
Segundo o mesmo jornalista,
"Os gregos continuariam a dizer que o país se mantém como membro do euro, com todos os direitos legais - acusando os credores e os organismos da UE de actuarem ilegalmente. Só assim garantiriam que a totalidade das perdas pela saída da Grécia serão imputadas ao BCE e aos fundos de resgate da UEM, ao mesmo tempo que os activos dos cidadãos gregos permanecem legalmente protegidos em contas no estrangeiro, livres para regressar mais tarde e reconstruir o sistema bancário.
Se tiver uma mente desconfiada, talvez possa interrogar-se sobre se Tsipras não terá de facto atraído os líderes e funcionários europeus para uma armadilha legal, e eles terão mordido o isco. Afinal de contas, as suas tácticas negociais bizantinas podem fazer todo o sentido. É apenas uma ideia."
Oxalá seja assim.
21 comentários:
Também espero que seja!
E só assim se explica a "permissividade" do Governo Grego à enorme fuga de capitais que decorreu nas últimas semanas ;-)
Nem só assim se explica a "permissividade" à fuga de capitais. Desconfio que esta medida, que se impunha desde a primeira hora, aplicada por iniciativa grega e não como imposição de facto do BCE, se deveu ao governo grego - mais precisamente à mairia do governo grego - andar quase cinco meses a vender a ilusão de que estava a conseguir grandes vitórias nas negociações, de que um bom acordo estava prestes a ser alcançado e de que era possível eliminar a austeridade dentro do euro. Enfim, o mesmo tipo de ilusões cá em Portugal do Bloco de Esquerda.
«A saída da Grécia do euro é quase inevitável. Se a liderança do Syriza tiver percebido isto, talvez façam sentido as manobras de última hora que, pelo menos à primeira vista, parecem ser de desorientação e rendição. Se desde há algum tempo (talvez Abril) tiverem chegado à conclusão de que não faz sentido continuar a negociar, quando do outro lado só lhe oferecem políticas absurdas e destrutivas, então talvez possam estar a executar um plano secreto.»
Isso!
Perdão, no meu comentário das 16:51, "Desconfio que a ausência desta medida", em vez de "Desconfio que esta medida".
Corrigido:
Nem só assim se explica a "permissividade" à fuga de capitais. Desconfio que a ausência desta medida, que se impunha desde a primeira hora, aplicada por iniciativa grega e não como imposição de facto do BCE, se deveu ao governo grego - mais precisamente à maioria do governo grego - andar quase cinco meses a vender a ilusão de que estava a conseguir grandes vitórias nas negociações, de que um bom acordo estava prestes a ser alcançado e de que era possível eliminar a austeridade dentro do euro. Enfim, o mesmo tipo de ilusões cá em Portugal do Bloco de Esquerda.
A medida referida é obviamente o controlo de capitais, travar a fuga dos depósitos, travar pelo menos os grandes levantamentos e transferências, especialmente para o estrangeiro.
Artigo muito relevante do canal DW da Alemanha, aprender a historia não fica mal a ninguém.
http://www.dw.com/en/german-economic-miracle-thanks-to-debt-relief/a-16630511
Este e do the guardian
http://www.theguardian.com/business/2015/jul/06/germany-1953-greece-2015-economic-marshall-plan-debt-relief
A única saída menos desastrosa do euro(e eu sou a favor do fim do euro,senão acontecer a bem que seja a mal pelos países "condenados" à pobreza no euro)pelos gregos será um acordo(o tal em secreto)com os Brics com a China e Russia à cabeça.Realmente o Stripas e seus pares podem estar a jogar de forma a não ficarem com o ónus de sairem do euro visto que o povo continua "formatado" no euro.Vamos ver agora esta semana o que se segue,e sem o Varoufakis que tinha ameaçado demitir-se se o "sim" ganha-se o referendo...e afinal saiu na mesma.
"ao mesmo tempo que os activos dos cidadãos gregos permanecem legalmente protegidos em contas no estrangeiro, livres para regressar mais tarde e reconstruir o sistema bancário"
É necessário precisar o que se entende por 'cidadãos gregos', os tais cujos capitais estarão "livres para regressar mais tarde": estamos a falar das elites capitalistas ou da classe média, reformados, ...?
Rejubilemos portanto pelas elites capitalistas gregas!
OXI=RUA
Tudo o que Tsipras sempre quis...mas quer levar algum no bolso.
Vamos a ver se a Europa vai nesse filme - pagar para se livrar da Grécia.
Que nojo de comentário aí pelas 23 e 05.
"quer levar algum no bolso"...como se todos fossem feitos à imagem e semelhança dos passos e portas e banqueiros e cavacos nacionais.Como se o estrume guiasse a terra e o espelho que reflecte a auto-imagem de quem fala em"algum no bolso" fosse extensivo aos demais, que têm uma outra dignidade e verticalidade.
Quem diz que o colaboracionista e traidor Pétain, chefe do governo-fantoche pro-nazi de Vichy "estava certo", como o fez o dito das 23 e 05, é capaz de odiar a este ponto quem recusa o colaboracionismo puro e duro com a troika. Independentemente de ninguém saber bem onde esta situação vai parar a dignidade do povo grego deve deixar completamente fora de si quem é troikista até à ultima moeda de cêntimo que tem no bolso. Porque os exemplos podem frutificar, porque o discurso austeritário começa a tremer pela vontade popular, porque o caminho de via única se assume como uma treta para enriquecer ainda mais quem mais tem. E os sacrifícios inevitáveis começam a revelar-se uma treta do tamanho das tretas impingidas pela canalha que nos governa, governando-se.
( a europa não vai em filme nenhum.Só alguém profundamente ignorante ou bestial sectário pode confundir a zona euro com a europa ou mesmo a UE com a Europa. Manipulações ou enviesamentos que de tão óbvios levam a questionar se tais processos têm alguma receptividade.
E a "europa" nao paga nada. Quem paga é o desgraçado governado pela UE e pelo BCE e pelo FMI. Para os bolsos da banca e do Capital. Os agiotas podem agitar-se inquietos, mas ...)
De
De
O que me parece inevitável é que só há dois caminhos, ou a Europa cede à Grécia terrenos para suportar este fardo e desenvolver-se sem recurso à miséria, ou a Grécia deve aceitar "pacificamente" a saída do Euro e regressar a uma moeda Nacional e ter finalmente o seu destino nas suas mãos.
Por incrível que pareça "essa vontade" surge de ambos os lados das barricadas, embora o objectivo seja completamente distinto.
Quem força a Grécia a uma saída desordenada acredita no suicídio e no seu ganho político imediato, enquanto a Grécia deseja-a de forma sustentada, conseguindo assim a sua Liberdade e Capacidade de Crescimento.
O Referendo de Domingo destruiu a Oposição Interna na Grécia.
O revolucionário de sofá volta a atacar e com a mentira na ponta da língua.
Pode-se dizer que é o BCE quem está a estrangular os bancos gregos. Mas quem está de facto a estrangulá-los é o povo grego, ao exigir de forma desmedida transformar os seus depósitos em notas.
A culpa é do bank run, não tano do BCE.
O Syriza quer ser empurrado para fora do euro para se vitimizar e levar algum no bolso.
A Europa já fala em em medidas assistencialistas.
Espero que se limitem a um banco alimentar e não a premiar um governo de treteiros esquerdalhos.
Há aqui algum grande equívoco.
A preocupação que o Não grego ocasionou nas hostes da governança traduz-se no desnorte de alguns dos seus queridos comentadores.
O Syriza tem um caminho à frente, que é respeitar a vontade do povo grego.E não seguir as ordens de merkel, do BCE, do FMI e da UE.Nem dos apaniguados cujo vocabulário mudou dramaticamente desde há dias, dpeois da espantosa e esmagadora vitoria do Não.
Um desclassificado qualquer dizia ontem que na Grécia ainda há 30 % de gregos que sabiam o que a europa era.A tentativa de menorização dos resultados eleitorais sempre foi uma pecha dos regimes dos anos 30 do ´seculo passado e que continuam a fazer o seu caminho neste século em que tentam levantar de novo a cabeça. Agora fala-se que já se fala em "medidas assistencialistas" ocultando que tal sai dos mesmos esgotos que faziam ultimatos à Grécia e à sua soberania.
A separação das águas é necessária.Esta sociedade está podre e já não dá garantias de nada a não ser mais fome, desemprego e miséria. A constatação que a Grécia pode bater com a porta dá origem a cenas canalhas.É todo o edificio de submissão abjecta e de cobardia institucional que cai como um castelo de cartas.
Eis um motivo que explica o nervosismo e a pesporrÊncia das hostes da governança
De
Que malta tão inteligente e tão humana! Será bom que os gregos se não empanturrem com o magnífico banco alimentar proposto por um insigne analista que acima escreveu, pois nós, os próximos a desgraçarem-se com a "solidariedade europeia", precisaremos que sobrem umas migalhitas de pão para enganarmos a fome.Enquanto tudo à volta arde, há gente que acicata, enquanto toca as trombetas do ódio acéfalo e grita a plenos pulmões "contra o mais fraco marchar, marchar!", os verdugos pensando que com eles come à mesma mesa. Engana-se essa gente: não só não come à mesma mesa dos verdugos elitistas, como será a sua a próxima cabeça a rolar.
O José sugere que a senhora Gourmet em vez de andar a pedir constantemente aos Portugueses contribuições para o Banco Alimentar, siga directamente para Atenas!?!?...É isto que estes Josés pensam relativamente ao que fazer aos Pobres, sejam eles Portugueses ou Gregos. -Banco Alimentar contra a Fome!
Mas é dar-lhes só umas côdeas, e com muita moderação... Há que ter cuidado, pois essa gentalha ociosa, na Grécia ou aqui, é uma corja aproveitadora do pior: quando se dá por ela, está a exigir caviar e lagosta regados a champanhe.
Talvez fosse melhor ser o José a fazer a distribuição desses alimentos, acabava com os excedentários num ápice!...A experiência aqui é muito importante.
-O Delgado -o general sem Medo- saiu dos eixos? -Tirou-se-lhe a tosse, a fome e acabaram todos os movimentos perversos! -Foi rápido e eficiente, durante uns tempos ninguém se atreveu a arrebitar a cabeleira, depois o José -e os outros, que eles são muitos parecem formigas- adormeceu à sombra da bananeira e zás(!), apareceram uns quantos tipos que o vieram atormentar e não param de o fazer há mais de 40 anos.
-Mas o Zé "anda a tratar das coisas por outro lado"...Ele e a senhora Gourmet, o Pedro Passos Coelho e o Paulo Portas, e muitos, muitos mais, pelo que todos vemos, ouvimos e lemos.
Nisto de dar confiança a gentalha, há que ter muito cuidado. Quando muito, nada mais sábio, para quem tem alma de filantropo, do que adoptar UM pobrezinho e dar-lhe somente -e com conta e medida muito chã- umas fatias de pão (com pouca margarina, por causa do "castrol"). Num Mundo devidamente nos seus eixos, o óptimo seria adoptar um pretinho (fica sempre bem, em fundo, o contraste entre os dentes imaculadamente brancos e a tez escura do indígena), mas, ó sorte madrasta!, o Mundo descarrilou e Angola lá se foi...(suspiro). Talvez os "Josés" deste país e desta Europa, caso sejam admiradores da Cultura Clássica, se não importem de fazer suceder ao "pretinho das missões" o indigente petiz grego da Acrópole.Vê-los-emos, então, estou certo, recobrarem o velho sorriso de quem todos os dias se deita sabendo que praticou o Bem tal e qual como sabiamente o entendia e preconizava o Santo de Santa Comba.
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