segunda-feira, 9 de julho de 2007

Erros com demasiada margem

O artigo de Pedro Magalhães de hoje, no Público, deixou-me perplexo. Sobretudo, quando o seu trabalho prima normalmente pela seriedade.

Num arrazoado de dados e comparações entre a Europa e os EUA feitas à medida do argumento, Pedro Magalhães defende que os europeus trabalham pouco e mal. A culpa é da falta de incentivos ao trabalho, do estatismo, do sindicalismo e da falta de boas práticas de gestão. No entanto, enquanto toma os EUA como um todo, Pedro Magalhães escolhe selectivamente os países europeus a comparar: a Finlândia e a França são os exemplos dados para os longos períodos de férias europeus; a Itália para o número de horas de trabalho semanais; e Alemanha e França para a percepção de «felicidade pessoal». Finalmente, tira conclusões para o nosso Portugal. Pedro Magalhães argumenta então pela relação causal entre a estagnação da produtividade europeia e a pretensa excessiva regulação dos mercados de trabalho que impõem férias demasiado generosas e limites muito rígidos para a carga horária.

Como a Europa é feita de realidades económico-sociais muito variáveis, acho que vale a pena fazer a comparação com o, supostamente, país mais generoso: a França (cinco semanas de férias legais e uma na carga horária semanal de 35 horas). Segundo a Alternatives Economiques deste mês, a produtividade horária francesa é superior à americana em seis pontos percentuais!

Quanto às comparações internacionais da percepção de felicidade pessoal, os EUA aparecem, de facto, à frente de França. No entanto, se tivermos em conta que a Colômbia – esse paraíso marcado pela guerra civil e narcotráfico – aparece à frente dos EUA, penso que estes rankings devem ser lidos com um «grãozinho» de desconfiança.

Finalmente, a invocação do caso português é abusiva. Portugal é, dos países europeus, um dos que mais se aproxima dos EUA no número de horas de trabalho anuais per capita. Segundo a OCDE, trabalhamos em média 1694 horas contra as 1825 americanas e, já agora, as 1543 horas francesas.

3 comentários:

Ricardo disse...

Também me senti defraudado a ler uma crónica tão descaradamente manipulada...
É por estas e por outras que o conceito de produtividade marxista continua a ser o mais objectivo...

João Pinto e Castro disse...

Falta acrescentar que eu não conheço ninguém em Portugal que só trabalhe o horário estipulado no contrato.

Nuno Castro disse...

É engraçado como é que o PMagalhães descarta o teu post descrevendo-o como "observação interessante" quando simplesmente - seja feito o elogio - ele desmascara a aldrabice completa que é o artigo do PM, eivado de ideologia e de retórica patronal. Alguém lhe terá encomendado o serviço como é óbvio, porque isto tem ressonância com a lábia insuportável da CIP e companhia sobre a "preguiça" dos portugueses. Para quando uma análise séria da produtividade em Portugal?